terça-feira, 1 de junho de 2010

Exile on Main Street

Anita Pallenberg, em seu biquini de estampa de leopardo, era sempre vista à toa no terraço. Uma mulher agitada, descrita por sua amiga MARIANNE FAITHFULL como “a enfeitiçada rainha da escuridão”, tornara-se lenta por conta do calor e da heroína. Havia, com certeza, um clima estranho, tropical e amaldiçoado na Villa Nellcote – a casa no sul da França, onde, em 1971, MICK JAGGER, KEITH RICHARDS, BILL WYMAN, CHARLIE WATTS e MICK TAYLOR gravaram o álbum “EXILE ON MAIN STREET”, durante a noite, no porão.

Esse castelo gótico é hoje cercado por uma selva de palmeiras, com o mar resplandecente no horizonte. Mas o lugar é um paraíso corrompido. Existem rumores que tenha servido de quartel para a Gestapo durante a Segunda Guerra Mundial, onde moradores locais teriam sido torturados no mesmo porão onde os ROLLING STONES gravaram o seu álbum. Aparentemente, havia suásticas esculpidas nas saídas de ar no chão.

OS STONES gostavam de contar as histórias nazistas, e KEITH adorava a grandeza da casa de 16 quartos. “Quem foi que decorou esse lugar?” – ele disse ao chegar. “A Maria Antonieta?” O filho pequeno de Anita e KEITH, Marlon, parecia alegremente alheio à atmosfera decadente. Durante os vários meses daquele verão, os amiguinhos de Marlon foram Jake e Charlie, filhos de Tommy Weber - socialite, piloto de carros e traficante de drogas. Weber foi um dos convidados do o que acabou se tornando a festa mais desregrada de todos os tempos. Todo mundo passou por lá. Até JOHN LENNON, com a YOKO junto , veio para uma visita rápida de 45 minutos durante o verão – e foi embora rapidamente depois de vomitar no chão de mármore. Com muito jeito, Anita tentou encobrir o mal estar de LENNON, dizendo que ele havia tomado muito sol e exagerado no vinho. Mas a verdade é que ele tenha provavelmente tido uma reação a metadona que lhe havia sido prescrita.

Havia drogas de todos os tipos por toda a parte. Na verdade, Weber chegou com os filhos bem a tempo para o casamento de MICK e BIANCA em St. Tropez, realizado um pouco antes do início oficial das gravações. Os filhos de Weber foram os pajens no casamento. Quando chegaram na casa, foram descobrir que cada criança tinha cerca de meio quilo de cocaína, dentro de duas pochetes, amarradas no corpo. Uma armação que garantiu a Weber calorosas boas vindas de seus amigos famosos.

O relato de como o álbum foi feito durante aquele verão enfervecente, é um dos mais extraordinários da história do rock. E até mesmo os STONES agora estão relembrando os seus dias de glória, com o relançamento de EXILE ON MAIN STREET e um novo documentário, produzido com a permissão da banda, o qual conta um pouco desse conto libertino. No filme, KEITH RICHARDS, com sua arrogância costumeira, diz às cameras: “O MICK precisa saber o que vai fazer amanhã. Já eu fico contente em acordar e ver quem está por perto. O MICK é rock, eu sou roll.”

CHARLIE WATTS acrescenta: “Grande parte do EXILE foi feito de acordo com o ritmo de trabalho do KEITH: toca 20 vezes, pára, daí toca mais 20 vezes. Ele sabe o que quer mas é bem sossegado. O KEITH é realmente uma pessoa boêmia e muito excêntrica.
O documentário também não mencionará a tremenda briga que MICK e KEITH tiveram por causa de Anita, seguida pela gravidez misteriosa. E você pode apostar que também nao contará as histórias sobre as drogas e quem as usou. Elas foram generosamente fornecidas pelo traficante de drogas preferido do rock’n’roll, o legendário Spanish Tony, e por Jean de Breteuil, outro traficante que mais tarde forneceria a JIM MORRISON sua dose fatal.
Foi De Breteuil que trouxe aos STONES a heroína tailandesa pura, tingida de cor-de-rosa, conhecida como algodão doce. Todos tomavam parte e consumiam alguma coisa – pelo menos algum tipo de droga e bebidas. Até mesmo CHARLIE WATTS, relativamente certinho, vivia sorvendo goles de tequila. Spanish Tony, cujo nome verdadeiro é Tony Sanchez, relembra como MICK pediu três gramas de cocaína só prá conseguir encarar o dia do casamento, resmungando: “Eu não vou conseguir entrar nessa sóbrio.”

Aparentemente, MICK e BIANCA brigaram feio por causa do acordo pré-nupcial que ele a fez assinar no dia, e ele teria desabafado que “essa coisa toda é mais amolação do que diversão.” Como sempre, se tratando de MICK, tudo aconteceu por causa de dinheiro. A temporada dos STONES no exterior viera como cortesia do cobrador de impostos. Eles estavam escapando da taxa punitiva de 93% sobre indivíduos de renda elevada, imposta pelo governo do Partido Trabalhista, e tentando reverter a sorte.
O empresário da banda, o príncipe Rupert Lowestein, contratado por MICK para endireitá-los, aconselhou os STONES a saírem do Reino Unido. Ele também orquestrou vários esquemas financeiros fora do país, os quais estão em vigor até hoje.

De acordo com MICK, “depois de trabalhar por oito anos, eu fui descobrir que ninguém nunca havia pago impostos, e eu devia uma fortuna. Daí você tem que sair do país.”
Com todos instalados em suas próprias casas perto de Nellcote, foi decidido que eles deveriam gravar o disco lá mesmo, no porão. O motivo foi que o se o KEITH tivesse apenas que descer, ele pelo menos daria as caras.

Apesar de terem colocado carpete, o lugar era tão quente e abafado que as guitarras saíam do tom no meio das músicas. A qualidade do som era estranha, até mesmo embaralhada. MICK disse que não gosta muito do álbum, o qual é frequentemente apontado como um dos melhores já feitos. Em um dia normal de “trabalho” as coisas começavam devagar, com um almoço longo, muito vinho branco gelado e haxixe. KEITH às vezes saia de barco, ou ia de carro para Villefranche. MICK gostava de compor durante à tarde mas tinha que esperar por KEITH para criar algumas melodias, para ele então compor as letras.

As noites eram reservadas à música. BILL WYMAN relembra que durante o primeiro mês eles trabalharam todas as noites das 20:00 as 3:00, mas nem todo mundo aparecia. “Prá mim – ele disse – essa foi uma das maiores frustrações daquele período.”
De acordo com as revelações de Robert Greenfield em seu livro EXILE ON MAIN STREET, KEITH geralmente colocava o filho Marlon para dormir, daí subia para usar heroína e cochilar, às vezes ainda com a agulha no braço. O resto da banda ficava lá embaixo esperando, e MICK fulminando de raiva.

KEITH chegou em Nellcote declarando que estava “limpo” – dando a entender que estava usando cocaína e maconha, mas não heroína. No entanto, após um acidente de kart e com as gravações prestes a começar, ele voltou a usar heroína. Mas as drogas representavam apenas parte do problema: a energia explosiva entre MICK e KEITH também fazia parte do conflito. Em uma entrevista, Anita disse que os dois eram como gato e rato: “Se o MICK estivesse no porão, o KEITH não descia. O KEITH sempre gostou de irritar o MICK.”

Mick também tinha seus próprios problemas com BIANCA. Já grávida de Jade, ela sequer conseguia esconder o pouco caso que sentia pelo resto dos STONES e logo se negou a visitar Nellcote. Ela acabou se mudando para Paris, forçando MICK a cruzar os país, indo e voltando para as sessões de gravação. Em mais de uma ocasião, ela ameaçou que o deixaria pra sempre.

Pelas costas, a banda vivia xingando a BIANCA. KEITH, especialmente, não aguentava as suas frescuras e não entendia porque MICK havia decidido se casar com ela. Justo ele que havia sido o padrinho de casamento de MICK. De uma forma ou outra, todos sofriam com o isolamento. BILL WYMAN sentia falta de suas guloseimas inglesas, as quais ele eventualmente mandou trazer, e também estranhou o leite francês. Ele e CHARLIE WATTS ambos sentiam falta de casa.

MICK TAYLOR, novo integrante da banda, havia sido escolhido por ambos KEITH e MICK. Ele foi até visto aos prantos. KEITH vivia dizendo que ele tocava alto demais, embora seja reconhecido (sem contar o ERIC CLAPTON) como possivelmente o guitarrista mais talentoso de sua geração. O ritmo extremamente lento das gravações teria tirado todo mundo do sério. De acordo com Rose, a mulher de TAYLOR, “dava a impressão que MICK TAYLOR, CHARLIE e BILL estavam lá o tempo todo, sempre esperando pelo KEITH ou pelo MICK.”

Havia também uma divisão entre os que usavam drogas e os que, como MICK JAGGER, BILL WYMAN e CHARLIE WATTS, resistiam. Quando MICK TAYLOR disse a CHARLIE WATTS que já não aguentava mais, CHARLIE respondeu na maior cara de pau: “Eu já tentei me atirar no rio, mas tem só 20 centímetros de profundidade.”

Nessa mistura entrou também GRAM PARSONS, gênio do country rock e viciado, que morreria de overdose dois anos mais tarde. Ele era um grande amigo de KEITH, e durante as tardes os dois tocavam por horas no terraço – algo que causava ataques de ciúme em MICK. KEITH queria fazer turnês com GRAM, algo que MICK não permitiria. MICK também ficava furioso com o fato de que KEITH aparentemente conseguia criar muita música para GRAM, mas pouca para ele. Irritado, MICK deu em cima de sua namorada, Gretchen, só para dar um chega prá lá em GRAM. Como ela mesma disse depois: “A coisa não era comigo, disso eu tenho certeza.” No final, GRAM e Gretchen foram convidados a se retirar.

BILL WYMAN veio a dizer que “obviamente, as drogas eram o centro do problema. Esqueça do que é falado sobre a relação criativa entre drogas e a criação de álbuns de rock. Elas atrapalham mais do que ajudam, pode acreditar.”

No final do verão, Anita estava seriamente viciada em heroína, injetando até três vezes ao dia. Em uma ocasião, ela e KEITH quase morreram quando a cama em que haviam desmaiado pegou fogo (eles foram salvos pelos seguranças). A história das mulheres dos STONES talvez seja ainda mais fascinante, mas também não será contada nesse documentário “limpo”. ANITA detestava tanto a BIANCA que chegou a espalhar um boato falso de que ela havia nascido homem.

Quando Anita engravidou no final daquele verão, ela pediu a ajuda da secretária de KEITH para fazer um aborto. KEITH ficou feliz com a gravidez mas Anita não tinha assim tanta certeza. Por várias vezes ela reservara vôos para que pudesse voltar para casa e fazer um aborto, mas nunca embarcou.

O incrível é que KEITH aparentemente acreditava que o bebê que Anita estava esperando era de MICK JAGGER. Ele pensou que o bebê havia sido concebido quando JAGGER e ANITA reataram o caso que haviam tido antes – tudo isso enquanto KEITH estava alto demais sob a influência da heroína para se dar conta.

De acordo com Marshall Chess, um executivo da Atlantic Records que estava em Nellcote naquele verão, “comentavam sobre quem seria o pai da criança, mas nunca discutiam isso na minha frente. Anita pensou que a criança era de JAGGER. Isso causou muitos problemas entre MICK e KEITH, e acabou criando uma barreira entre eles.” Então o bebê poderia ser do MICK? Anita teria reclamado que KEITH não estava mais interessado nela sexualmente (embora seja provável que a heroína estivesse atrapalhando o seu desempenho sexual).

E é claro, os STONES são famosos por suas trocas de mulheres. Anita havia sido a namorada de BRIAN JONES antes de se envolver com KEITH; MARIANNE FAITHFULL foi namorada de KEITH antes dele sugerir que ela saísse com o MICK. No entanto, em uma entrevista recente, Anita afirmou que o bebê não era de MICK. “Eu não gostava tanto assim do JAGGER – ela disse. “ Nunca me deixei levar pelo charme dele como as outras mulheres, como a MARIANNE. Eu sempre achei o KEITH mais interessante. E eu nunca, jamais teria prejudicado o meu relacionamento com o KEITH.”

No final, todos aceitaram que a criança era de KEITH. A criança, chamada Dandelion Richards, nasceu na Suiça, e foi criada pela mãe de KEITH porque o vício de Anita a impossibilitou de criá-la. Hoje, usando o nome de Angela, ela leva uma vida pacata em Kent, e é dona de um estábulo.

Alguns sugerem que o relacionamento sempre conturbado e competitivo de MICK e KEITH nunca se recuperou totalmente – embora o assunto nunca tenha sido discutido abertamente pelos dois. Outros dizem que a questão de quem dormiu com quem é totalmente irrelevante para os STONES. Há quem diga que a causa do desentendimento é o fato de que KEITH considera o MICK um mercenário babaca, e que MICK disaprova o estilo de vida rock’n’roll de KEITH.

Apesar das tensões, a relação entre dois com certeza não é assim tão ruim. KEITH diz que agora estao trabalhando juntos, e que podem até mesmo lançar um novo disco dos STONES no final desse ano. Logo após a crise de paternidade veio outra: a prisão por drogas. Anita e KEITH foram acusados de porte de heroína com intenção de tráfico. Eventualmente, depois de possíveis subornos e graças à destreza dos advogados dos STONES, eles se livraram das acusações. Em novembro de 1971 eles deixaram Nellcote às pressas, deixando para trás o cachorro, o papagaio e os brinquedos do filho.

O álbum foi eventualmente finalizado nos estúdios Sunset Sound, em Los Angeles. No documentário, JAGGER revela que algumas das letras foram escritas em cima da hora, incluindo o primeiro single do álbum, “Tumbling Dice”. Ele teve que lançar um ultimato para conseguir terminar os mixes. “Eu mesmo tive que terminar o disco todo porque senão só restariam esses bêbados e drogados.” – ele declarou em uma entrevista.

Mas o produtor Don Was, o qual revisou todas as fitas antigas para organizar o relançamento, discorda: “A lenda pode ou não ser verdade, mas quando eles estavam naquele porão gravando o disco, se tornavam uma grande banda de rock e muito profissionais”. Ele continua: “De acordo com o mito, esse álbum é considerado superficial – mas de superficial não tem nada. Artisticamente é muito sólido.” A palavra final deveria ficar com Jake Weber, o qual, vale lembrar, tinha apenas oito anos quando passou o verão com os STONES. “Havia cocaína e muitos baseados. Quando você leva uma vida desregrada sempre existe escuridão,” ele diz. “Mas, naquele instance, esse foi o momento da absolvição. Algo além da escuridão: o amanhecer antes do pôr do sol.

Traduzido por Alessandra R.
Fonte: Daily Mail

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