terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Enfim, aconteceu. Lemmy se foi.

Relatos de amigos muito próximos dizem que um dia depois do Natal ele recebeu a notícia de que tinha um câncer muito agressivo. Tenho certeza absoluta que ele disse a si mesmo: “ah, foda-se! Agora chega! Não vou aguentar mais esta merda. Para mim, deu…” e, durante três dias, ele deu a ordem ao seu corpo: pare de funcionar! E Lemmy era tão poderoso que seu próprio corpo não teve coragem de contrariá-lo.

Lemmy se foi e ficamos privados de ouvir novamente a voz de Deus caso Ele fosse chegado em um litro de uísque e dois maços de cigarro todo santo dia. Quero acreditar que ele agora está aqui ao meu lado, com um copo de Jack Daniels e Coca-Cola em uma mão, um cigarro na outra, com as indefectíveis botas brancas e jaqueta de couro surrada, dizendo em meu ouvido “Viu como vale a pena ser genuíno, cagar e andar para o que as pessoas pensam ou esperam de você e viver do jeito que se deve?”

Sempre foi divertido pensar que Lemmy, Keith Richards, Ozzy Osbourne e Iggy Pop seriam os únicos a pisar nas baratas sobreviventes a uma hecatombe nuclear que mataria a todos nós, menos a eles. Hoje isto não é mais engraçado. Nenhum deles é imortal. Um dia, estaremos aqui lamentando a partida de cada um. Que pena…

Um dos últimos baluartes da trindade de artistas que pareciam indestrutíveis mesmo depois de décadas e décadas de todos os excessos que você possa imaginar em termos de drogas e bebidas, ao lado de Keith Richards e Iggy Pop, Lemmy vinha mostrando acelerado estado de deterioração física nos últimos meses mesmo para um cara de 70 anos de idade. O que começou com o surgimento de uma alergia a uma determinada fruta semelhante à framboesa – sim, é isto mesmo o que você acabou de ler! – se transformou em reações alérgicas cada vez mais graves e que acabaram afetando seu coração. Depois de uma cirurgia cardíaca e da imposição de uma mudança total no seu hábito etílico – ele tinha que parar de beber, cheirar e fumar de maneira radical e rápida -, Lemmy ameaçou deixar seus vícios de lado, mas não resistiu. Relatos dão conta que ele substituiu as doses cavalares de Jack Daniels com Coca-Cola que tomava diariamente por vodka com suco de laranja e que, digamos assim, ele não parou totalmente com tudo o que devia. Foi por isto que ele acabou desidratado e com distúrbios gástricos sérios no dia da apresentação do Motorhead na última edição do Festival Monsters of rock brasileiro, o que o levou a uma internação em um hospital de São Paulo.

É inexplicável. Bem, pensando com um pouco mais de racionalidade, talvez não seja tão inexplicável assim o verdadeiro fascínio que a figura de Ian “Lemmy” Kilmister exerce em qualquer pessoa que ame o rock and roll. E quando escrevo “qualquer pessoa”, não estou sendo bondosamente genérico, mas afirmando categoricamente que não há um ser humano roqueiro sequer que: a) não tenha o devido respeito e paixão pelo Motörhead; b) que não considere “Lemmy” como uma espécie de divindade.

No fundo, é fácil e difícil – e desconcertante – ao mesmo tempo entender porque a figura de Lemmy suscita reverência. Para isto, é preciso deixar de lado os pudores politicamente corretos e encarar a verdade: no fundo, bem lá no fundo, todos nós queremos ser como Lemmy.

Buscamos obter o mesmo grau de respeito que a sua figura e suas palavras causam nas pessoas. Buscamos causar a mesma sensação que Lemmy propicia quando entrava em qualquer ambiente: um silêncio que chegava a ser ensurdecedor. Buscamos envelhecer como Lemmy, dono de seu próprio nariz e sem a menor intenção de agradar a quem quer que seja.

Com seu inseparável chapéu preto, roupas de coloração idem e as inacreditáveis botas brancas, Lemmy era uma versão roqueira e real do cowboy sem nome eternizado por Clint Eastwood no cinema. Para os adolescentes, ele é um personagem de histórias em quadrinhos – ou videogame, se preferir – que ganhou vida. E se o Motörhead existiu até hoje é porque Lemmy comandou as coisas da maneira que levava a sua vida: integridade em relação a tudo aquilo em que acredita. Quer uma prova disto? Assista ao espetacular documentário “Lemmy (49% Motherfucker, 51% Son of a Bitch)”.

Nos shows, noventa minutos transcorriam com uma rapidez supersônica. A famosa saudação de abertura de cada uma das apresentações que a banda fazia – “Nós somos o Motörhead e  tocamos rock ‘n’ roll” – já faz parte do panteão das grandes frases da história da música, recebida com o mesmo entusiasmo dedicado a qualquer um dos 438 clássicos do repertório do trio. E quando você é testemunha de uma apresentação que começa com uma dobradinha do naipe de “Iron Fist” e “Stay Clean”, é inevitável sentir certa vergonha ao ver a palavra “rock” associada a grupelhos formados por gente sem talento e sem um pingo de carisma.

Ao lado de Lemmy estavam, nos últimos anos, o comedimento e exuberância sônica do guitarrista Phil Campbell – nos shows, havia um “momento solo” em que ele desfilava uma sucessão de notas surpreendentemente sublimes para o conceito ensurdecedor do trio. E atrás de ambos havia a energia aparentemente inesgotável do baterista Mikkey Dee, cuja fúria ao tocar seu instrumento fazia uma locomotiva desgovernada parecer um carrinho de supermercado com as rodinhas enferrujadas. Os dois formavam os adereços perfeitos para a mitológica presença de palco de Lemmy, tocando seu baixo como se fosse um violão de acampamento e extraindo timbres que qualquer baixista daria o braço esquerdo para conseguir. É impossível ouvir canções como “Going to Brazil”, “Ace of Spades” e “Overkill” e não chacoalhar o esqueleto como se estivéssemos tomando um banho gelado sentado em uma cadeira elétrica.

Certa vez, quando era editor das revistas Cover Guitarra e Cover Baixo, fiz minha única entrevista com Lemmy, uma das melhores em toda a minha carreira como profissional da música. Quando terminamos as questões a respeito de equipamentos e de todos os assuntos a respeito do Motörhead, ficamos ainda um bom tempo conversando sobre outros assuntos, incluindo os motivos que nos levaram a gostar de Beatles, psicodelia dos anos 60 e 70, livros e… ABBA! Foi inacreditável: passamos uns bons minutos discutindo a respeito de qual foi o melhor disco do quarteto sueco. Suas observações eram tão impagáveis quanto difíceis de entender – Lemmy tem um dos sotaques mais indecifráveis do planeta.

Em outra ocasião, ao entrevistar Dave Grohl na época em que estava lançando o disco de seu projeto Probot, ouvi a frase que resume perfeitamente o que Lemmy realmente representa no imaginário de cada um de nós. Quando perguntei a ele sobre a participação do baixista no projeto, Grohl explicou como aquilo havia acontecido e encerrou com a seguinte exclamação: “Pau no c… do Elvis Presley! O rei do rock é o Lemmy!!!”

por Regis Tadeu

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sábado, 26 de dezembro de 2015

Júpiter Maçã

O rock não é feito somente de ídolos, de grandes músicas e de discos maravilhosos. O rock é feito de heróis, de exageros, de falta de limites. É feito de alma, subconsciente, vísceras, transcendência. O rock é o virtuosismo da própria atitude, é sobre ultrapassar as convenções e demarcar sua trajetória atravessando o que se determina como regra.

Flávio Basso se chamava assim quando introduziu cabeça, corpo, alma e sacanagem dos Cascavelletes no cenário musical brasileiro na segunda metade dos anos 1980. Entre Jéssicas Roses, menstruadas, mortes por tesão e punhetinhas de verão, o escracho, o politicamente incorreto - duvido que a banda faria sucesso no mundo de vigilantes do comportamento alheio de hoje em dia -, um misto entre pornochanchada da Boca do Lixo, cachaça no Bar João, cara de pau e atitude punk tomou conta das rádios mais antenadas, chegando à trilha de novela da Globo e a programa infantil da Angélica. Sem pudores, Flávio tinha a mais pretensiosa banda sem pretensão do Brasil, que falava sobre o que realmente importava para seu público: sacanagem.

Fã de Syd Barrett, dos Beatles, do rock inglês e do rock psicodélico, o homem Flávio virou o mito Júpiter. Em 1996, lançou o maior álbum do rock gaúcho moderno. Sintonizado com Londres, letras absolutamente incríveis e uma inspiração única fizeram de "A Sétima Efervescência" um marco de inspiração na indústria do rock dos anos 1990. Diferente de tudo, lisérgico, arrebatador, o disco fez de Júpiter aquilo que Flávio sempre quis ser. A partir dali, o garoto adolescente que cantava sob um céu de blues passou a cantar na 7ª Efervescência Intergalática. O céu não era o limite, não havia mais limites criativos para o talento de Júpiter, que depois virou Apple, voltou a ser Maçã, cantou em inglês, português, chegou a ser Flávio por um dia, Júpiter para sempre.

O homem Flávio não suportou os excessos do mito Júpiter. Não suportou os excessos do rock, a angústia de querer viver rompendo a zona de conforto da caretice, vivendo como um incompreendido, um outsider, fora de seu tempo, dentro de seu mundo. Júpiter já era refém dos próprios excessos. Cambaleante, corpo frágil, visivelmente alterado em suas aparições públicas, o corpo por trás da alma nos deixou. Não é fácil viver nesse mundo chato. Mitos têm seu próprio mundo. O de Júpiter começava quando batia a sétima efervescência, num barato permanente que só parou quando Flávio caiu.

A alma Júpiter deve estar por aí, com gente legal, que curta Syd Barrett e os Beatles, onde as pessoas sejam mesmo afudê. Um lugar onde as pessoas sejam loucas e super chapadas, como ele, Júpiter. Que ele esteja num lugar do caralho! - por Carlos Guimarães_

Minha timeline no facebook se enche de posts de pesar sobre a morte de Júpiter Maçã, do quão genial ele era etc. Sem entrar na discussão do abuso do termo “gênio”, digamos que o gaúcho Flavio Basso, o Júpiter Maçã era um músico muito talentoso e inspirado sim. - por Alex Antunes

De minha parte, sou fã do álbum Hisscivilization, de 2002, que tem uns achados neopsicodélicos, como a longa e belíssima faixa eletrônica de abertura, “The Homeless and the Jet Boots Boy”. Também gosto de Uma Tarde na Fruteira (2007), este cantado em português, e que traz a canção definitiva da pós-tropicália, “A Marchinha Psicótica De Dr. Soup”, além de outra de suas melhores músicas, a delicada “Mademoiselle Marchand”, cujo clipe foi dirigido por meu amigo Cisco Vasques. (Na foto, Júpiter e Sonia Braga em outro filme de Cisco e Beto Brant, Kreuko – Mundo Invisível).

Posto isso, estranhei o flood jupiteriano nas redes por algumas razões. Primeiro, porque uma boa parte do tempo ele era uma figura mais chapada e folclórica do que propriamente genial.  Essa entrevista no programa de Rogério Skylab é um exemplo do quão sexualmente bobo e constrangedor ele podia ser (evidentemente Skylab, que é um falso maluco com uma perfeita noção de timing desconfortável e nonsense, faz a coisa funcionar – e chega a fazer uma pergunta jornalística, se uma queda de Júpiter do segundo andar de um prédio em 2012 foi acidente ou tentativa de suicídio. Júpiter finge que está dormindo).

Segundo, porque não se sabe bem onde estavam esses fãs exaltados todos antes dele morrer. Tudo bem, há um elemento que é o “fator gainsbourg”, ou “fator bukowski”: há artistas com quem fica bem mais fácil de se lidar depois de mortos. Vivos, não se sabe como usarão seus trunfos (provavelmente sendo inconvenientes ao extremo). Nos círculos feministas, e não só, a personalidade abusiva de Júpiter foi posta em questão. Recentemente ele teve que ser retirado de uma ocupação artística em São Paulo, a Ouvidor 63, para não conviver com mulheres com quem tinha um histórico de agressão. Essa discussão foi feita abertamente no coletivo. Mas não quero me focar no aspecto feminista (ou seja, criminalmente imputável) da questão, mas no “comportamento abusivo do gênio incompreendido” como um todo.

Creio que essa fantasia brianjonesiana/ sydbarretiana, que Júpiter abraçou, e que conduzia forçosamente à incapacitação e à morte precoce, tem uma conivência perversa dos fãs. Por um lado, ele foi realmente importante para uma geração que descobriu a psicodelia com seu primeiro disco solo, A Sétima Efervescência (1997). Acho o frisson em torno desse disco meio exagerado, mas certamente é um salto considerável em relação às bobagens repulsivas da sua banda anterior, os Cascavelettes.

A importância dessa transição para o público de Porto Alegre, no entanto, demonstra apenas como o Rio Grande do Sul é apegado aos mitos datadões do rock. Eu acho que fazia todo o sentido, na época, a vida no fio da navalha de Brian Jones, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison, ou de Brian Wilson (que não morreu, só lesou – assim como nosso representante nacional, Arnaldo Baptista). Porque eles estavam realmente captando uma enorme energia social de transformação, no momento em que ia colapsar. Eles simplesmente colapsaram junto.

Também fazia sentido a descoberta pela indústria fonográfica de como “empacotar” e vender melhor a rebeldia, na época em que o Led Zeppelin, por assim dizer, era pago para quebrar quartos de hotel. Mas esse embate não faz sentido hoje – a não ser como reprodução romântica (ou mesmo trágica) de clichês. Júpiter Maçã não estava se embatendo com nada real. Poderia estar juntando e trocando seus trunfos na produção independente em novos discos e shows como fazem, digamos, bandas tão inquietantes quanto o Cidadão Instigado. Eu não disse que é fácil – mas que essa é a real aventura, não o recurso mais óbvio ao autocolapso, à autocondescendência. Claro, ele pode ser considerado vítima de uma doença, a da adicção a substâncias.

Mas a celebração um pouco descabida da sua “genialidade” me leva a crer que um contrato mórbido com seu público foi cumprido. Se a escolha desse destino de “bode sacrificial” já era meio besta para Kurt Cobain (que ao mesmo tempo repudiava e acreditava em seu estrelato), o que dizer dessa mesma encenação em escala ínfima e tropical? Reproduzo um relato de um amigo meu, então distribuidor de discos, que me parece colocar a questão na perspectiva correta, com todas as tags no lugar (automitificação, relação ambivalente com mulher, mico no gerenciamento de carreira).

Aí vai: “Eu o conheci uma única vez… e posso dizer que foi a reunião mais constrangedora que ja fiz. Ele estava muito doido e acompanhado de sua mulher na época tentando me ‘vender’ seu novo álbum. Os dois ficaram a reunião inteira discutindo na minha frente, e o Júpiter quase foi as vias de fato no momento em que a sua mulher discordou de uma de suas afirmações (a de que ele era melhor que o Caetano Veloso)… Ele ficou muito nervoso com ela, levantou da mesa agressivo e foi em sua direção… eu tive que intervir… Depois de meia hora de desculpas e já sem a mulher (que foi embora) continuamos… Gostava muito de sua música, mas confesso que não tinha muito saco para esse tipo de personalidade. RIP.”

Ao contrário dos nossos  hábitos santificadores cristãos, não vejo grandes problemas nas críticas pós-morte. Se esses são momentos de balanço, não vejo porque não meter alguns elementos mais sórdidos/ realistas – não para cotejar moralisticamente a obra com a vida, mas para entender como uma alimenta a outra, no que é o processo criativo. Idealizar alguém é mais desleal do que lembrar os erros, que são a única fonte real de aprendizado na vida.

Expandindo o que disse o meu amigo distribuidor, eu não só não tenho muito saco para esse tipo de personalidade, como acho que esse grau de autocondescendência “maldita” deixou de fazer qualquer sentido neste século. Simplesmente não interessa o quanto a figura em questão seja talentosa – ela tem mais é que segurar a barra, porque não existe mais um mainstream cultural sufocante, apenas o caos (que deveria ser seu elemento). E ninguém tem direito a designar a si mesmo como lixeira vibracional da sociedade.

Quem surfa nessa vaibe é porque está pendurado nos mitos culturais do século passado – ou na sua reprodução (cada vez mais) patética. Abaixo o salvo-conduto para o abuso dos “gênios” supostos e incompreendidos. É o crepúsculo do Zé Louquinho.

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segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Dias difíceis no Suriname ...

Plástico Lunar é uma banda sergipana, de Aracaju. E é uma das melhores bandas de rock em atividade no Brasil. Ponto.

Digo isso de forma absolutamente lúcida, pensada e repensada, e sem nenhum resquício de “bairrismo”. Pois bem: estabelecida esta verdade irrefutável, de fácil comprovação por qualquer um que se disponha a conhecer a música deles, devo dizer que acabaram de lançar o melhor disco já produzido por aqui. Ponto, de novo.

“Dias difícil no Suriname” teve uma longa gestação: começou a ser gravado em maio de 2012 e só foi finalizado dois anos depois. No processo, a banda perdeu um de seus principais componentes, o guitarrista Julio Andrade, que saiu para se dedicar a seu projeto principal, o duo The Baggios. Como fã, fiquei preocupado, pois era notória, nas apresentações que se seguiram, a dificuldade dos caras em se adaptar à uma nova formação, mais enxuta – normal, não deve ser fácil substituir um guitarrista como Julico. Mas sempre botei fé que iriam se ajustar. Só não sabia se a tempo de não prejudicar o novo álbum em gestação ...

Pois bem: o disco foi lançado há alguns meses, de forma virtual, e foi uma agradável surpresa. É magnífico! Já começa escancarando uma de suas principais influências, na “stoneana” “Todo pecado do mundo”, que abre com um excelente riff de guitarra. Julico toca nela e em mais quatro faixas. Em outras três, o auxílio vem de Rafael Costello, membro fundador, hoje morando em São Paulo. Little Mel, da Máquina Blues, aparece em “Labirinto”, e Fabrício Rossini em “A esperança”.

Foi assim, com uma ajuda providencial de amigos e ex-integrantes pra lá de talentosos, que a Plástico lapidou esta verdadeira obra-prima da música independente local. Que prossegue com uma velha conhecida, já lançada como single, a belíssima “Mar de leite azedo”. “Sentado no Arco-iris”, a terceira faixa, comprova, de certa forma, o talento dos caras, pois é uma composição de dois ícones do rock brazuca, Raul Seixas e Gileno Azevedo (da dupla “jovemguardista” Leno e Lillian), mas parece deles – e não sou só eu que tenho essa impressão: até hoje vejo gente se surpreender ao saber que se trata de um cover.  É, também, uma faixa bônus para quem comprar o disco físico, em CD, já que não havia feito parte do lançamento virtual por conta de imbróglios com a liberação dos direitos autorais.

O disco prossegue com “Cancioneiro”, uma robusta composição de Julico cantada por Marcos Odara, o baterista, que bate um bolão também como vocalista. É uma banda, aliás, que tem bons vocalistas de sobra – além de Daniel e Odara, Plástico Jr. também costuma entoar suas próprias composições.

“Quem diria”, que vem na sequencia, é uma emocionante ode ao aconchego do lar, com uma letra singela que Daniel compôs pensando em sua mãe. Emocionante. Daniel é um  compositor de mão cheia e excelente vocalista. Em parceria com Nara Loupe e Verlane Aragão, é o responsável por sete dos doze petardos que compõem o disco. O lado A – o disco foi pensado como um vinil – se encerra com outra dele – e dela, Nara – “Labirinto”, com uma letra psicodélica e surreal embalada por um ritmo cadenciado. Plástico Jr., baixo e voz, abre o que seria o lado B com a também psicodélica “Amanheceremos”, que tem uma perfomance marcante de Leo Airplane nos teclados. Leo Airplane que é, também, o produtor do disco, é bom que se diga...

“Algo forte” dá prosseguimento à viagem sonora de volta ao rock mais “hard”, com sensacionais riffs e solos de guitarra – quem? Ele, de novo. Julico. Mas a disputa é boa e Rafael Costello dá mais uma vez o ar de sua graça com mais uma levada tipicamente “stoneana” em “Persona non grata”. O solo é absolutamente sensacional, totalmente na tradição do melhor do rock “setentista”.

E então temos a mais pesada, “Quase desisto”, outra excelente composição de Julico, e “Nem aí”, mais uma de Junior – com uma letra totalmente “foda-se”, rock and roll! Encerrando tudo, a belíssima “A esperança”, levada no violão. Sintomático que o disco acabe com uma música com este nome. Temos esperança de que os dias passem a ser mais tranqüilos no Suriname e a banda siga em frente, apesar das dificuldades ...

Por fim, é preciso que se fale com um carinho especial sobre a concepção visual do projeto gráfico, com belíssimas artes conceituais produzidas por Thiago Neumann que valorizam muito o produto final. Salta aos olhos, também, a qualidade do material em que o digipack foi impresso. Impecável! Com direito, inclusive, a impressão na parte interna do envelope onde fica guardado o encarte. Um luxo! Bola dentro total da Rock Company, a gravadora paulistana que bancou o projeto.

“Dias Difíceis no Suriname”, o disco – físico, em CD - foi lançado em grande estilo no dia primeiro de novembro com uma apresentação concorrida no Teatro Atheneu. A gravadora promete para o início do ano que vem uma edição em vinil. Merece muito, tanta pela música, que soa sempre melhor quando ouvida através de uma agulha, quanto pela espetacular arte de “Cachorrão”.

Já tenho o CD, mas vou querer o LP! E se sair em k7, quero também ...

http://plasticolunar.com.br/

A.

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