quarta-feira, 29 de outubro de 2014

DK ÜBBER ALLES

Fazer uma banda de punk rock é muito fácil. Mas ser lembrado, décadas depois, como uma das representações punks mais influentes, corrosivas, avant garde, ameaçadoras e engraçadas de todos os tempos é outra história: é a história do quarteto norte-americano Dead Kennedys, que agora tem parte de sua trajetória narrada em livro.

Dead Kennedys - Fresh Fruit for Rotting Vegetables [Os Primeiros Anos], de Alex Ogg, traça o início da banda formada em 1978 em San Francisco, uma das cidades mais prafrentex dos Estados Unidos e na qual, já nessa época, havia um pequeno movimento embrionário de bandas e ativistas punks. A narrativa cobre apenas o período inicial do grupo, entre meados dos anos 1970 e 1981, quando eles lançaram seu primeiro LP, o superlativo Fresh Fruit for Rotting Vegetables.

No Brasil saiu em vinil branco. Edição pirata ...
Músico de certa experiência em bandas de bar, o guitarrista Raymond John Pepperell, mais conhecido como East Bay Ray, colocou um anúncio em um jornal alternativo, buscando músicos para formar “uma banda punk ou new wave”. Logo um tal de Eric Boucher, que foi do Colorado para a Califórnia em busca de oportunidades, respondeu. Apesar de estar há pouco tempo em San Francisco, ele já era conhecido nos inferninhos da cidade, como um dos malucos locais. “Parte do que levou as pessoas a nos assistir pela primeira vez foi ‘Ah, esse cara tem uma banda agora. Vamos ver o que é’”, conta Eric, ou melhor, Jello Biafra, vocalista do DK.

Plataforma eleitoral

Assim como um acidente de avião ocorre por conta de vários fatores em conjunto, uma banda também só se torna fundamental quando há uma espécie de encontro entre pessoas que, sozinhas, jamais alcançariam os mesmos resultados de que capazes em conjunto. O Dead Kennedys é um desses casos. Quando East Bay Ray, um guitarrista criativo, fã de surf music e Frank Zappa, se encontrou com Jello Biafra, frontman frenético e destemido terrorista cultural, o resultado foi uma das bandas mais explosivas e subversivas da história do rock.

Biafra era tão ousado que, em 1979, concorreu à prefeitura de San Francisco. Sua plataforma previa decretos como obrigar os executivos a se vestirem de palhaços no horário comercial e erigir uma estátua de Dan White (assassino do ativista gay Harvey Milk), somente para servir de alvo para ovos e carne podre, além da legalização de squats (ocupações) e a proibição da circulação de carros no centro. Terminou a eleição em quarto lugar (entre dez candidatos), com 6.591 votos.

O primeiro álbum do DK elevou o então nascente subgênero do hardcore ao status de arte. “Fresh Fruit oferecia uma combinação perfeita de humor e polêmica amarrada a um suporte musical que era tão raivoso e criativo quanto os devastadores ataques verbais de Biafra”, observa Alex Ogg, no prefácio.

Foi de Fresh Fruit que saíram verdadeiros clássicos não apenas do punk, mas do rock universal, como California Übber Alles, Holiday in Cambodia,  Kill the Poor e Drug Me, entre outras  No livro, Ogg relata tim tim por tim tim cada detalhe da criação, arranjo e gravação desses petardos, com direito a confrontação dos depoimentos entre os membros, já que, desde 1986, Biafra e os membros remanescentes do DK travam uma verdadeira batalha jurídica e verbal, disputando, bem, basicamente tudo, da autoria do logotipo à ordem das canções.

Em texto leve e bem humorado, Ogg também traça perfis acurados dos membros do DK, além de seus primeiros passos como músicos e ativistas. A edição ainda conta com vasto material gráfico, como as inestimáveis fotos de Ruby Ray, flyers, cartazes, as colagens de Jello no poster que vinha encartado no Fresh Fruit e trechos de uma HQ biográfica da banda.

Um livro recomendadíssimo não apenas aos fãs do DK, mas a qualquer um que valorize o pensamento livre, a anarquia como filosofia de vida e a independência artística.

Dead Kennedys - Fresh Fruit for Rotting Vegetables [Os Primeiros Anos] /  Alex Ogg / Ideal/ 240 p./ R$ 39,90 / Capa dura: R$ 59,90

NOTA DO BLOG: Segundo o contador do Blogspot, esta é a milésima postagem que faço por aqui. Parabéns para mim pela resistência e muito obrigado a quem visita regularmente este cantinho da grande rede. Agradecimento especial para o grande Cícero "Mago" pelo apoio e incentivo.

KEEP ON ROCKING IN THE FREE WORLD.

Texto da matéria por Franchico

Rock Loco

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terça-feira, 21 de outubro de 2014

THE MAN WHO SOLD THE WORLD

Há dois anos, implorei que alguma editora lançasse no Brasil “The Man Who Sold the World – David Bowie and the 70s”, de Peter Doggett, um estudo, música a música, de toda a obra de Bowie nos anos 70. Felizmente, a Editora Nossa Cultura ouviu o apelo e lançou a versão nacional: “O Homem Que Vendeu o Mundo”. O livro é inspirado em “Revolution in the Head” (1994), volume fundamental de Ian MacDonald sobre os discos dos Beatles (MacDonald, um dos grandes críticos musicais ingleses, foi convidado a escrever um livro semelhante sobre Bowie, mas cometeu suicídio em 2003). Doggett, autor do ótimo “A Batalha pela Alma dos Beatles”, assumiu o projeto e fez um livro brilhante, em que contextualiza a obra de Bowie nos anos 70 e ajuda o leitor a entender aquela época tão conturbada.

O autor chega a uma conclusão: ninguém, naquela década, foi tão ousado e genial quanto Bowie. Que outro artista pop lançou uma sucessão de obras-primas como “Space Oddity” (1969), “The Man Who Sold the World” (1970), “Hunky Dory” (1971), “The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars” (1972), “Aladdin Sane” (1973), “Pin Ups” (1973), “Diamond Dogs” (1974), “Young Americans” (1975), “Station to Station” (1976), “Low” (1977), “Heroes” (1977), “Lodger” (1979) e “Scary Monsters (and Super Creeps)” (1980)? Ninguém.

Entrevistei Peter Doggett sobre o livro. Aqui vai a integra do papo:

Bowie sempre foi visto como um artista à frente de seu tempo. Você era adolescente nos anos 70, quando ele estava lançando seus maiores discos. Naquela época, você reconheceu a importância daqueles álbuns?

Você está certo, eu era um adolescente e, por isso, não tinha muito dinheiro e não pude comprar certos álbuns quando lançados. Por isso, ouvi muito do catálogo de Bowie fora da ordem. Eu conhecia os singles, claro, mas, por exemplo, não ouvi “Hunky Dory” até depois de comprar “Young Americans”, por exemplo. O que me impressionou não foi como os discos eram importantes, mas como eram variados e diferentes. Era difícil acreditar que todos haviam sido gravados pelo mesmo sujeito. Eu já era fã de Dylan e Beatles, então estava ciente de que grandes artistas podiam criar diferentes estilos e sons em cada disco (no caso de Dylan, ele chegava a mudar de voz de disco para disco). Bowie parecia estar trabalhando na mesma tradição – e talvez ele tenha sido o último artista capaz de fazer isso. Acho que o trabalho de Bowie nos anos 70 foi tão brilhante que sua relevância cultural só foi percebida depois que a década terminou. Foi uma década confusa e cheia de grandes acontecimentos, e seus temas mais relevantes não foram percebidos facilmente na época (especialmente para um teenager!). Foi só depois que eu pude apreciar o gênio de Bowie para capturar todos os temas e obsessões da era.

Você acha que existe outro artista pop que tenha refletido, em seu trabalho, o caos e confusão dos anos 70 tão bem quanto Bowie? Stevie Wonder, talvez?

A comparação com Stevie Wonder é interessante, porque seu trabalho nos anos 70 foi eclético, abrangente, e um comentário sobre a sociedade e sobre ele mesmo. Mas a música de Stevie era, claramente, o trabalho de um mesmo homem. A mudança de um álbum para outro não foi tão dramática. Bowie, por sua vez, parecia mudar completamente entre discos. Ele estava desesperado para explorar tudo, descobrir tudo, experimentar tudo. Seu trabalho também era muito fragmentário, incluindo a forma como usou a técnica “corte e cole” de William Burroughs para escrever letras [Burroughs costumava recortar seus textos e rearranjá-los aleatoriamente, dando-lhes novos significados]. Quanto mais eu analisava os anos 70, mais fragmentada a época parecia. Ela não tinha o senso de progressão que você via na cultura dos anos 60. Era uma época de caos e confusão, e acho que Bowie refletiu essas qualidades melhor e com mais imaginação do que qualquer artista de qualquer meio, seja música, literatura, pintura ou filme.

Como você acha que o trabalho de Bowie nos anos 70 é visto hoje, analisado fora do contexto da época em que foi feito?

Virou um clichê dizer que Bowie, nos 70, era um “camaleão”, mudando de disfarce o tempo todo. Acho que havia muito mais do que só isso, mas esse aspecto de sua carreira tem sido uma grandes inspiração para muitos artistas que amam trabalhar na superfície, como Madonna e Lady Gaga. Em particular, Gaga parece um tributo a Bowie, embora não soe em nada como ele. O trabalho de Bowie nos 70 é tão rico e diversificado, que há algo para todo mundo se inspirar. Você pode encontrar a influência de Bowie no punk, na discoteca, no movimento New Romantic e no grunge. É quase impossível para um artista, hoje, NÃO ser influenciado por Bowie.

Eu estava revendo “Laranja Mecânica” outro dia, e mesmo sendo indubitavelmente uma obra-prima, pareceu um pouco datado, talvez por ter sido tão copiado.  Por outro lado, os discos de Bowie, lançados no mesmo período em que o filme, envelheceram muito bem e não parecem datados. Você concorda? Por que a obra de Bowie sobreviveu ao tempo?

É uma questão muito interessante. Talvez “Laranja Mecânica” pareça mais datado porque seu aspecto mais visionário é seu estilo visual,que é muito fácil imitar. O livro de Anthony Burgess foi provavelmente mais revolucionário no uso da linguagem do que o filme de Kubrick. Acho que o segredo da longevidade de Bowie é que ele usou a arma secreta de todo grande artista: instinto. E essa é uma qualidade perene. Ele não estava, conscientemente, tentando capturar um momento (ou uma série de momentos) na história cultural. Ele simplesmente o fez, naturalmente, instintivamente, e você ainda pode perceber esse instinto ao ouvir os discos hoje. Talvez você só possa trabalhar assim quando é jovem, empolgado e, no caso de Bowie, sob forte stress químico e psicológico. Quando se é mais velho, você sabe demais e tende a correr menos riscos.

Qual sua opinião sobre o caráter de “mimetismo” da obra de Bowie? Ele sempre “tomou emprestado” de outros artistas, não?

Você conhece a frase que diz “Todos os grandes artistas roubam”, e Bowie não é exceção. Ele foi quase um pioneiro do pós-modernismo nos anos 70, trabalhando com empréstimo de fragmentos de ideias, melodias, letras e conceitos de outros artistas em uma grande variedade de estilos e criando algo inteiramente novo com isso. Ele nunca escondeu o uso do “mimetismo”, mas foi brilhante a ponto de transformar os fragmentos de outras pessoas em algo inteiramente seu. Quando escrevi o livro, tentei fazer uma imersão em tudo que inspirava Bowie em cada fase de sua carreira. Ele sempre foi muito aberto sobre o que estava ouvindo e lendo e que filmes estava assistindo. Então fiz o mesmo e tentei me colocar na cabeça de Bowie quando ele estava criando cada projeto, para tentar entender como ele foi inspirado por Andy Warhol, ou Marc Bolan, ou pelo autor oculto Colin Wilson ou o pintor Egon Schiele.

Por que você usou, no livro, o formato “canção a canção” que Ian MacDonald utilizou em “Revolution in the Head”?

A resposta simples é que fui contratado para escrever o livro que Ian não conseguiu, devido a seus problemas mentais. Mas eu não teria seguido o formato se não achasse que ele funcionava. Como disse, acho a cultura dos anos 70 muito fragmentada, e a obra de Bowie também foi feita de fragmentos. Eu expandi um pouco o formato criado por Ian, adicionando ensaios que me permitiram mergulhar mais profundamente em temas importantes do trabalho de Bowie, do glam rock à homossexualidade.

O que você achou do mais recente álbum de Bowie, “The Next Day”? Você ficou surpreso pela reaparição de Bowie, depois de anos de sumiço e especulações sobre sua saúde?

Fiquei surpreso como qualquer um quando ouvi que ele tinha reaparecido. Um dia, liguei o rádio às seis da manhã e fiquei maravilhado ao ouvir o locutor da BBC dizer que Bowie tinha lançado um novo single. Liguei a Internet, vi o vídeo, e continuei achando que estava sonhando! Gostei muito de “The Next Day”, mas não acho que some nada à obra de Bowie. Parece uma sequência previsível de “Scary Monsters” (1980), e não me surpreenderia se tivesse sido lançado em 1981. Gosto de ouvir o disco, mas não PRECISO ouvir, como os discos dos anos 70. Acho que o mais relevante dessa volta de Bowie foi o vídeo de “Where Are They Now?”, uma comovente exploração da nostalgia e do processo de envelhecimento. Talvez ele só devesse ter lançado essa música e ficado por isso mesmo.

Você sabe se Bowie leu seu livro? Você já o entrevistou?

As respostas a essas perguntas são “Não sei” e “Não”. Ele não dá entrevistas há mais de uma década, e não tentei contatá-lo. Ele sempre deu ótimas entrevistas, mas as histórias que contava variavam muito de uma entrevista a outra, então achei que não fazia sentido perguntar a ele sobre o que tinha feito 40 anos antes. Preferi ouvir muito atentamente os discos e deixar que eles “falassem”. Não tenho a menor ideia se Bowie lê o que é escrito sobre ele, embora algumas pessoas tenham me dito que ele tem várias cópias de meu livro em seu escritório em Nova York. Se ele ler o livro, espero que aprecie o cuidado que tive em explorar o seu mundo nos anos 70 e o respeito que tenho pela música extraordinária que fez no período.

por André Barcinski

AQUI, no r7

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A Leonard Cohen afterworld ...

Sylvie Simmons, colaboradora da revista inglesa “Mojo”, é obcecada pelos “malditos” da música, tendo escrito livros sobre Johnny Cash, Neil Young, Tom Waits e Serge Gainsbourg (este último, “Um Punhado de Gitanes”, lançado no Brasil). Escreveu também uma biografia de Leonard Cohen, “I’m Your Man – The Life of Leonard Cohen”.

Leonard acaba de lançar um novo disco, "popular problems", quase tão bom quanto o anterior, o sensacional "old ideas". Abaixo, uma entrevista reveladora feita por André Barcinski com a biógrafa em 2012 ...


- Me parece que Leonard Cohen tem, hoje, um público maior do que teve em toda sua carreira. É verdade?
- Sem dúvida. Especialmente na América do Norte, onde ele era muito pouco conhecido até pouco tempo atrás. Sendo inglesa, me acostumei a ver Leonard fazer sucesso na Europa, e até seus discos mais sombrios venderam muito por lá. Quando me mudei para os EUA (Simmons vive em São Francisco) e falava de meu amor pela música de Leonard Cohen, as pessoas me olhavam de forma estranha, poucos o conheciam. Foi só há três ou quatro anos, depois que ele voltou aos palcos depois de uma ausência de 15 anos, que os norte-americanos perceberam que ele era tão cool, sexy e bacana.

- O episódio do roubo de suas economias também rendeu muita publicidade (Em 2005, Cohen, então com 71 anos e aposentado da música, vivia num monastério budista na Califórnia, quando descobriu que sua agente lhe havia passado a perna e roubado todas as suas economias. Foi isso que causou sua volta aos palcos)…
- Sem dúvida. Acho que esse episódio fez as pessoas se interessarem mais ainda pela volta dele. Todo mundo gosta de torcer pelo azarão, não é mesmo? Mas a rapidez com que a fama dele se espalhou foi impressionante. O primeiro concerto depois de sua volta aos palcos foi num teatro pequeno no Canadá, para 700 pessoas, e meses depois Leonard estava tocando para 100 mil pessoas em Glastonbury (famoso festival inglês).

- Quando você descobriu a música de Cohen?
- Em 1972, ainda adolescente, vi meu primeiro show de Leonard Cohen. Eu era muito jovem e não consegui entender completamente o que estava ouvindo, mas já sentia que ali havia algo de especial. Vi todas as turnês que ele fez desde então.

- Cohen colaborou com o livro?
- Ele me concedeu duas entrevistas longas, bem no final de minha pesquisa. Não é uma biografia autorizada, o que significa que ele não teve controle sobre o que eu escrevi. Leonard não sugeriu nada e não pediu que nada fosse omitido. Usei também material de uma entrevista de três dias que eu havia feito com ele para a “Mojo”.

- Ele é um bom entrevistado?
- É uma pergunta difícil. Leonard é um homem privado e um tanto misterioso, um mestre em dizer só aquilo que quer. É preciso lembrar também que ele tem 78 anos e não tem uma memória infalível. Por várias vezes, ele me contou um acontecimento e eu o corrigi. Ele só dizia: “Sylvie, você sabe mais sobre eu do que eu mesmo!”. Eu queria que o livro tivesse a voz dele. Mas muita gente costuma ser hagiográfico ao descrever Leonard Cohen, mas a verdade é que ele não é Moisés. Acredite, passei uma semana entrevistando Johnny Cash para um livro e Johnny Cash, sim, é Moisés! Leonard tem uma personalidade mais leve, mais bem humorada, com um sarcasmo judaico.

- Quantas pessoas você entrevistou para o livro?
- Falei com 110 pessoas, muitas das quais nunca tinham sido entrevistadas antes, como rabinos, monges budistas, e várias mulheres que passaram pela vida de Leonard.

- Você sabe se Leonard já leu o livro?
- Sinceramente, não. Sei que alguns membros da banda dele leram. Para falar a verdade, não sei se ele tem muito interesse em reviver o passado. Ele sempre me dizia: “Sylvie, eu não sou mais aquela pessoa. Não vivo mais naquela realidade.”

- No livro, você revela um aspecto até então desconhecido da vida de Leonard, que é o interesse pela Cientologia. A espiritualidade é parte fundamental da vida dele, não?
- Sem dúvida. Leonard sempre foi um explorador. Ele sempre buscou conhecer coisas novas, novos caminhos, e sua música reflete essa busca incessante. Acho que isso explica, pelo menos em parte, o fervor que as pessoas sentem por sua obra. Ele também sempre foi um “outsider”, um rebelde: nasceu numa comunidade judaica dentro de outra comunidade protestante. Depois, tornou-se obcecado pelo imaginário católico, pesquisou hinduísmo e virou monge budista.

- O livro também relata a batalha dele contra a depressão.
- Sim, isso é uma parte muito importante da vida dele. Leonard sofreu de uma depressão crônica e muito intensa. Isso certamente moldou seu estilo de compor e tornou suas canções ainda mais sombrias e profundas. Ele é também um artista muito inseguro e perfeccionista, capaz de trabalhar numa letra por oito ou nove anos. Ele me disse: “Às vezes, acho que uma letra está terminada, mas aí vou cantá-la e percebo que não estou dizendo a verdade.”

- E as mulheres da vida dele? Todas ficaram contentes em colaborar?
- Sim, até porque todas são suas amigas até hoje. Ou melhor, quase todas. Joni Mitchell, que foi muito influenciada por Leonard quando eles foram amantes, nos anos 60, agora tenta esconder isso, o que é uma pena. Mas a grande maioria delas gostou de colaborar. Era engraçado, porque sempre que eu ia a algum show e dizia que estava fazendo um livro sobre Leonard, tinha alguma senhorinha que me dizia: “Ah, então você precisa falar comigo! Eu conheci Leonard muito bem!”

- Vi um show recente dele na Espanha, e o tom era de despedida. Leonard tocou por quatro horas e disse coisas do tipo: “Não sei se voltaremos a nos encontrar”. Você acha que essa é será a última turnê dele?
- Olha, Leonard é grande adepto de despedidas! Desde que tinha 50 anos, ele fala em se aposentar, então eu não me preocuparia com isso. Ele me disse que tem cinco músicas novas prontas, quer gravar outro disco, e que planeja excursionar até depois dos 80. Também prometeu que, se chegar aos 80 na estrada, vai voltar a fumar!

ORIGINAL aqui

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segunda-feira, 13 de outubro de 2014

ABALANDO BANGU

Fui ao Rio para ver o Napalm Death no Circo voador e, de bônus, assisti um show da Gangrena Gasosa, lendário “combo” de “sarava” metal, no subúrbio, em Bangu. Para tanto pegamos, eu e meu camarada Chorão 3, ex-letrista e vocalista da banda, um trem – lotado, pra variar – na Estação de Engenho de Dentro. Com direito a vendedores ambulantes e pedintes de todo tipo, inclusive uma garota que solicitava contribuições para comprar um leite especial para seu filho que, segundo ela, tem leucemia. A Supervia deseja a todos uma boa viagem ...

Saltamos em Bangu do lado de um shopping Center que, Chorão me informou, funciona numa fábrica desativada que, antes, havia servido de cenário para o Campo de Concentração do filme “Olga”. Há sempre uma curiosidade ou um marco histórico em cada canto que você andar, no Rio de Janeiro ...

Outra coisa que eu acho curiosa é que boa parte dos bairros do Rio parece funcionar como uma pequena cidade à parte – com um às vezes fervilhante comércio local, por exemplo. Alguns, inclusive, têm clima de cidade do interior, com a tradicional pracinha da igreja onde a população se reúne para colocar as fofocas em dia. Foi a impressão que tive de Bangu. O show aconteceu num Clube social que ficava próxima a uma dessas pracinhas. O Clube é bem bacana, tem aquele clima que remete aos tradicionais bailes da década de 1950, com um amplo salão ladeado por um mezanino. No som rolava uma discotecagem meio deslocada das atrações da noite, porém bacana ...

As atrações da noite atendiam pelo que é chamado popularmente de “rock pauleira” – na verdade nem sei se ainda se usa este termo, de repente já está ultrapassado. O tempo passa e a gente nem se dá conta. Enfim: a primeira banda, Deus Castiga, era muito boa e era de grindcore. Boa pegada, especialmente do baterista, que é muito bom. Já a segunda, Evil Inside, surpreendeu: subiu ao palco uma galera com pose de headbanger virtuoso e uma garotinha magrinha, franzina até, mas que assustou a todos quando soltou o primeiro urro gutural. Fazem um som, no entanto, meio clichê, uma espécie de death metal melódico. Passado o susto inicial, tornou-se meio enfadonho, com aqueles solos de guitarra intermináveis e estrutura melódica “manjada”. A presença de palco da “front girl” também deixa a desejar, talvez por inexperiência – mal do qual não sofre a Deus Castiga que, soube depois, é uma banda nova, mas formada por figurinhas carimbadas do underground carioca.

A grande atração da noite era, no entanto, a Gangrena Gasosa. Era apenas o segundo show que eu via deles na vida, desta vez num esquema mais real, “pé no chão” – UNDERGROUND, mesmo. O outro foi abrindo para o Cannibal Corpse no Circo Voador.  A Gangrena é uma daquelas bandas que você curte e fica se perguntado porque, afinal, não são mais conhecidos do grande público, porque é sensacional! A resposta só pode ser uma: porque o mundo é injusto. São, no entanto, uma banda “Cult” – no sentido de cultuada, mesmo que por um número reduzido de seguidores. E eu pude comprovar isso naquela noite: entraram no palco sob uma ovação impressionante do público presente e já começaram passando por cima das adversidades, notadamente o som “capenga” da frente do palco, cujas caixas haviam “estourado” durante a apresentação da segunda banda de abertura – soube depois que eles não sabiam disso e o retorno estava ok. Menos mal, porque o público não se fez de rogado e já começou cantando junto o primeiro “hit”, “surf Yemanjá”.  A catarse tomou conta e as Invasões de palco foram se sucedendo, inclusive de um cidadão com uma curiosa máscara de cavalo e de uma aranha que parece ter resolvido sair de sua reclusão no teto e tecer sua teia até o meio do palco para conferir que porra era aquela que estava acontecendo. Angelo, um dos vocalistas – o Zé Pelintra - percebeu e interagiu com o inseto, com um resultado visual interessante que eu espero que tenha sido captado por algum fotógrafo mais atento ...

Pérolas do cancioneiro “underground” foram entoadas em uníssono por todos: “Eu não entendi Matrix”, “Quem gosta de Iron Maiden também gosta de KLB”, “Fist Fuck agredi”, “Terreiro do desmanche” e “Centro do Pica Pau Amarelo” – a galera adora gritar que “Emilia pomba gira é uma boneca de Vodu”, bem como invocar o “coisa ruim” em “A Super via deseja a todos uma boa viagem”. Bem legal ver tudo isso do lado do cara que criou a maioria daquelas letras. Muito bom também ver que ele, mesmo há tanto tempo fora da banda, ainda é reconhecido e celebrado por isso: várias pessoas o reconheceram e fizeram questão de pedir autógrafos e tirar fotos juntos – alguns, inclusive, de forma histérica! Coisa de fã mesmo. Assédio que se repetiu, de forma ampliada, no fim do show, quando a banda teve que ficar um bom tempo atendendo ao público do lado do palco, em meio à farofa de despacho e aos doces que se espalhavam por todo o recinto – era dia de Cosme e Damião.

F iquei feliz em constatar, também, que a faixa etária dos presentes no recinto era bem baixa, o que indica que a banda está conseguindo renovar seu público. Bateu, inclusive, uma curiosidade em saber como aquelas pessoas haviam conhecido a Gangrena Gasosa. Fizemos a pergunta a um garotão – não aparentava ter mais de 20 anos – e a resposta foi interessante: ele disse que era Testemunha de Jeová e conheceu a gangrena pesquisando sobre macumba na internet. Acabou virando fã e saindo da igreja.

Parabenizei-o por isso ...

OUÇA AQUI

por Adelvan

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terça-feira, 7 de outubro de 2014

Morrissey revela ter câncer ...

O cantor inglês Morrissey, 55, luta contra um câncer. O ex-líder dos Smiths (1982-1987) revelou a doença ao jornal espanhol El Mundo, em entrevista em que também contou seus planos e, com a acidez que lhe é de costume, aproveitou para alfinetar o casal David e Victoria Beckham, que considera "insuportável". Morrissey vinha sendo hospitalizado com frequência no último ano e meio, período em que falou, mais de uma vez, em se afastar dos palcos. Agora, no momento em que assume publicamente estar doente, o cantor diz que não pretende parar de trabalhar. Ao menos, não por completo: se deixar de se apresentar, vai ser para viver como escritor. Na próxima semana, ele, que depois de lançar uma autobiografia escreve o seu primeiro romance, inicia uma turnê de shows pela Europa para divulgar seu décimo disco solo, World Peace Is None of Your Business.

"Os médicos já rasparam tecidos cancerosos em quatro ocasiões", contou Morrissey a El Mundo, sem dizer onde está localizado o tumor. "Se for para morrer, morrerei. Agora mesmo, me sinto bem. Sei que não tenho saído bem nas fotos, mas isso é efeito de ter uma doença, faz parte. Não vou me preocupar com isso e só vou descansar quando morrer." As internações do cantor, porém, não se devem apenas ao câncer. Morrissey já teve noticiadas uma úlcera hemorrágica no início de 2013, uma pneumonia em março e uma intoxicação alimentar em julho do mesmo ano, além de uma infecção respiratória em junho de 2014. Segundo ele, foram os médicos que recomendaram o aventado afastamento dos palcos, que ele chegou mesmo a considerar, mas desistiu de levar adiante porque fazer shows era algo muito "enraizado" nele.

"Estou em uma idade em que não deveria fazer música. Muitos compositores da música clássica morreram aos 34 anos. E eu ainda estou aqui, ninguém sabe o que fazer comigo. O público que eu tenho é muito jovem, o que me leva a crer que as canções dos Smiths, como acontece com as dos Ramones, são mais importantes hoje do que antes", continuou.

Virulência e solidão -- Consciente da virulência que Morrissey costuma demonstrar, o repórter do jornal espanhol perguntou ao cantor, sem rodeios, que nome lhe vinha à cabeça quando pensava em alguém especialmente odioso e inútil. O cantor, que é famoso por defender ardorosamente os direitos dos animais, exalar narcisismo e empreender violentos ataques verbais a outras personalidades, disse, para provável espanto da reportagem, que não odeia ninguém. "Sou um homem amável e sensível", afirmou.

Mas o momento de trégua com o mundo não durou muito. Na sequência, mostrando ainda estar em forma para atacar, ele metralhou de críticas o casal Beckham. "A trágica importância dada pela imprensa britânica a este casal prova que nos tornamos uma nação de zumbis. Eles não são nada, mas seus egos são anormalmente grandes. Victoria não faz nada da vida, mas está sempre ocupada em cultuar a si mesma. E seu marido, que nem sabe falar inglês direito... tem um negócio nojento. Ele é dono de uma linha de perfumes que foram testados em animais, como se os animais consumissem colônia. Lembre-se, se você comprar a loção pós-barba de David Beckham, estará apoiando a tortura animal."

Morrissey também bateu no dono da gravadora que o demitiu recentemente. Segundo ele, Steve Barnett, o empresário, não gosta que artistas opinem. "Seu ego parece ser mais importante que o bom funcionamento da empresa."

Na entrevista, o ex-vocalista da banda The Smiths também disse não ter vida social e viver "tranquilo" sozinho. "Não tenho necessidade de vida social. E, se você não tem vida sexual, como é o meu caso, é impossível lidar com as pessoas, porque todos só falam de sexo." Ao falar do ofício de escritor, que é bastante solitário, ele ponderou: "Fazer amigos reais pode levar uma vida inteira e, quanto mais você conhece uma pessoa, mais decepcionado fica."

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sexta-feira, 3 de outubro de 2014

O Silêncio é ensurdecedor ...

NÃO É O HATEBREED !!!
Não é qualquer banda que pode ostentar em seu currículo o feito de ter inaugurado um novo estilo musical. O Napalm Death é uma delas: Com “Scum” e “From Slavement to Obliteration” eles criaram o que ficou conhecido como “grindcore” – Punk/Hard Core e metal levados ao extremo, às últimas conseqüências. Não é figura de retórica: com estes dois álbuns, a banda de Birminghan venceu a corrida de velocidade que estava a pleno vapor na segunda metade da década de oitenta, superando, neste quesito – não na técnica, evidentemente – o Slayer e seu “reing in blood”.

Não há mais praticamente ninguém daquela época na banda hoje em dia – apenas Shane, o baixista, que, mesmo assim, não é membro-fundador e não estava no lado A de “Scum”. Mas a banda mantém uma linha evolutiva tão coerente que ninguém liga muito pra isso, na verdade. Até porque a atual formação já está junta há BASTANTE tempo – desde o quarto álbum, “Utopia Banished”, de 1992. Foi muito bom vê-los ao vivo, finalmente, e ainda em tão boa forma ...

Boa forma e humildade: acabada a apresentação da banda de abertura, Fórceps (chatinha, death metal “genérico”), Mitch, o guitarrista – supreendentemente jovem para sua idade – e Shane, o lendário contrabaixista que toca também no Brujeria e numa série de outros projetos paralelos, subiram ao palco do Circo voador sem nenhuma cerimônia para fazer o que, em qualquer outra banda com o tempo de estrada e a estatura deles, seria feito por roadies e técnicos contratados: afinar os instrumentos e ajustar e testar o som. Ficamos lá, extasiados, vendo nossos ídolos (nenhuma conotação hierárquica na palavra, aqui) trabalhar, esperando pela avalanche que estava por se formar ...

Ela vem, a avalanche, quando Barney Greenway, o vocalista, sobe finalmente ao palco para entoar o hino “Multinational Corporations”, logo emendada com “Silence is deafening”, de “The Code is red... Long live the code”(2005). Catarse total no recinto, clube da luta instaurado, salve-se quem puder! Recuei um pouco, para fugir do ringue em que se transformou a pista – em outros tempos estaria lá, no meio, mas com 43 anos nas costas e um cotovelo esmigalhado e reconstruído por duas cirurgias por conta dessa “brincadeirinha”, a gente fica naturalmente mais contido.

O tom da noite estava dado: o set list passearia por toda a carreira da banda, mesclando sons de todas as fases de uma extensa – e impecável! – discografia. Com efeito, a terceira, “Everyday pox”, já foi sacada do último disco, “Utilitariam”(2012). Entre uma musica e outra, muito diálogo com a platéia – iniciado com um singelo “caso não saibam, somos o Napalm Death, de Birminghan, Inglaterra”. Discursos politizados contra a homofobia, o racismo e a exploração capitalista dão o tom da apresentação de clássicos como “unchallenged Hate” – total grindcore na veia – e “Suffer the Childrem” – da época em que eles começaram a flertar com o Death metal. Não por acaso, a época de “Harmony Corruption”, que marca o surgimento desta nova formação, com uma reformulação quase que completa do line up – o baterista, Mitch, seria substituído no disco seguinte.

Formação que é frequentemente lembrada pelo vocal potente e característico de Barney – que “mastiga arame farpado temperado com chumbinho mata rato”, segundo o precioso relato de Marcos Bragatto no seu rock em geral – mas que tem um outro imprescindível pilar na impressionante máquina de esporro produzida pelo guitarrista Mitch Harris. E olha que, ao contrário do que acontecia antes, quando contava com o auxilio do já falecido Jessé Pintado, hoje ele comanda a “bagaçada” sozinho – ok, nem tanto, tem Shane, que preenche muito bem as lacunas com seu contrabaixo de som pra lá de saturado. Mitch faz, também, os backing vocals, sempre “rasgados”, numa dobradinha perfeita e típica do estilo que criaram.

Destaque para a seqüência final, com vários clássicos do primeiro álbum, “Scum” – iclusive “You suffer”, que já figurou no livro dos recordes como “a musica mais curta já gravada” – são precisamente 1,316 segundos. Seqüência quebrada, apenas, pelo já tradicional cover de “Nazi Punks Fuck Off”, do Dead Kennedys. Fiquei pensando com meus botões que eles bem que poderiam ter feito uma gracinha e tocado “Troops of Doom”, do Sepultura, que já gravaram num célebre disco de covers ...

Uma noite que tinha tudo para ser perfeita, caso o Napalm não fosse – notem bem o absurdo! – A BANDA DE ABERTURA! Nem sequer o pano de fundo deles estava lá: tocaram sob o nome do Hatebreed, como se fossem uma bandinha iniciante para a qual se estava “dando uma chance”. Simplesmente patética a atitude, por parte da produção – da parte deles, da banda, uma impressionante demonstração de humildade e um grande FODA-SE para os esqueminhas viciados da industria cultural. Por conta disso, o show foi curto – o que eu mais temia quando estava no sacrossanto recesso do meu lar, em Aracaju, tentando decidir se valeria ou não a pena ir ver meus ídolos nestas condições adversas.

Valeu! Muito! Foi curto, porém intenso.

Foi GRINDCORE, sem sobra de dúvidas.

por Adelvan

Hatebreed (QUEM?), Napalm Death e Forceps
Rio de Janeiro
Circo Voador
26/09/2014
22H

Set List do Napalm Death

1- Multinational Corporations
2- Silence Is Deafening
3- Everyday Pox
4- The Wolf I Feed
5- Unchallenged Hate
6- Suffer The Children
7- When All Is Said and Done
8- Errors in the Signals
9- Human Garbage
10- Success?
11- On the Brink of Extinction
12- Social Sterility
13- Protection Racket
14- Mass Appeal Madness
15- Scum
16- Life?
17- Deceiver
18- The Kill
19- You Suffer
20- Nazi Punks Fuck Off
21- Siege of Power


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quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Los Mismos

Mosckabilly, Rex Crotus, Morotó Slim e Joe Tromundo, quarteto que fez história com o Dead Bilies, resolveram se reunir novamente, 13 anos anos depois, e gravar um disco novo. Pela primeira vez, desde as gravações de ‘Heartfelt Sessions’ em 1999, os quatro entraram em um estúdio para tocar juntos e registrar músicas inéditas, inclusive faixas do período em que ainda tinham a banda. Desde o início decidiram que o projeto, batizado como Los Mismos, não seria uma banda nova, não faria shows e não assinaria como Dead Billies, seria uma reunião de amigos que tocaram juntos durante muito tempo e queriam se reunir novamente.

As tentativas de fazer com que o Dead Billies voltassem pelo menos para shows foram muitas, inclusive de produtores de festivais de fora da Bahia. Nunca aconteceu, mas finalmente os quatro integrantes da banda resolveram se divertir juntos novamente e aproveitar a amizade que possuem há muitos anos para colocar um projeto em prática. “A ideia era reunir os amigos de novo e fazer algo que satisfizesse a gente. Cada um estava passando por problemas pessoais delicados e a gente sempre teve essa preocupação de um com o outro. Pensamos em reunir a turma, que não fosse o Dead Bilies, mas que juntasse os quatro. Meio que um bálsamo para todos ao mesmo tempo. Algo que fosse de proveito para todos nós juntos. Dai surgiu a ideia do projeto. Nada megalomaníaco, é uma reunião de amigos”, explica Rex, um dos responsáveis pelo reencontro.

Inicialmente pensado como um EP, o trabalho acabou virando um álbum cheio, que já teve as gravações finalizadas e deve chegar aos ouvidos do público em breve pelo selo Garimpo. São 14 faixas, incluindo quatro ou cinco da época do Dead Bilies, criadas logo após o lançamento de ‘Heartfelt Sessions’. Outras são composições antigas guardadas por Glauber Guimarães, Mosckabilly, ou pelos outros integrantes do grupo, além de músicas novas surgidas durante o processo de gravação.

Além das tradicionais composições em inglês na pegada da antiga banda, com psychobillies com referências de filmes B, o disco traz canções em português e uma em espanhol. A sonoridade segue o caminho que a banda ganharia se prosseguisse em 2001, com sons mais garageiros, que já apareciam na última gravação da banda. Mas tem também as misturas de influências que sempre marcaram o Billies, que já fez a antológica valsa Vampire e agora ataca com um bolero, que deve soar daquele jeito próprio deles.

Os quatro amigos, que fizeram parte de uma das melhores e mais importantes bandas do rock baiano e do Brasil (por que não?), e se cercaram de amigos para esse novo trabalho. A produção é de andré t, que já assinava as produções dos discos da Retrofoguetes e foi um dos maiores entusiastas e estimuladores do projeto, segundo o próprio Rex. “Quando a banda terminou já tínhamos iniciado uma pré-produção com andré, existia uma frustração que em 2001 a gente começou e não terminou. Iniciamos de onde a gente parou. Aproveitamos cerca de 4 ou 5 músicas dessa época, Glauber tinha outras composições e outras surgiram durante o processo. No estúdio fluiu bem, rolou como a gente esperava. Tinha uma química, uma energia, por mais que isso seja clichê”, conta o baterista Rex.

Para o produtor andré t, essa química entre os quatro músicos realmente existe e é algo especial que eles conseguiram manter até hoje e eixaram presente no novo projeto. “Achei fantástico uma das minhas bandas favoritas de todos os tempos se reencontrar. Parecia que nunca tinham deixado de tocar juntos. Acho que realmente eles têm algo especial, que se vê muito raramente. Só acho uma pena que eles não deverão se reunir para tocar esse material no palco, porque sei que pegaria fogo…”, lamenta andré.

Além da produção do disco, os amigos ajudaram também a registrar o encontro e as gravações em vídeo. Alexandre Xanxa, Mauricio Caires e Mauro Pithon filmaram todas as sessões, captando todos os momentos, numa espécie de making off disco. A ideia é lançar esse material junto com o álbum.

Se para os amigos, os fãs e os curiosos este novo projeto é aguardado com ansiedade e como forma de abrandar a ausência do Dead Billies, para seus integrantes o disco serviu para exorcizar os problemas e uma pendência de anos, ou pelo menos deveria ser assim. “É um trabalho bonito, musicalmente ficou muito bom, mas talvez as intenções não tenham sido alcançadas, já que foi feito pra gente ficar feliz, sem intenção de grana ou qualquer outra coisa. Era pra trazer um bem estar, uma alegria, mas isso não foi alcançado da forma que a gente queira, ou não alcançou todos. Ele é muito de verdade, e a vida de verdade tem conflitos, não é um sonho, uma coisa perfeita que é 100% perfeita e bacana, têm tensões atrás desse projeto”, diz Rex.

Sem entrar em detalhes dos bastidores, o baterista fala que apesar da amizade houve dificuldades que permanecem. Para o público fica a expectativa de mais uma contribuição para o rock feito na Bahia. “A gente sabia q estava mexendo com uma bomba relógio e rezando para não explodir. Explodiu, fazer o que?”, diz Rex.

Se o Los Mismos se encerra com o disco, os outros projetos de Glauber, Rex, Morotó e Joe continuam. Glauber com suas diversas facetas artísticas e projetos como Teclas Pretas, glauberovsky orchestra, entre outros. Rex, Morotó e Joe, que começaram o Retrofoguetes logo após o fim do Dead Billies, seguem com a banda. O grupo, que está se adaptando às últimas mudanças, segue na ativa, com músicas inéditas e avaliando quando gravam um novo trabalho. Os shows continuam. Outro projeto que une Rex e Morotó, o Retrofolia, ganha mais autonomia e se desvincula do Retrofoguetes, sendo agora um projeto próprio. Com isso além dos dois e Julio Moreno, foram efetivados definitivamente Kaverna nos vocais, Fábio Rocha no baixo e Paulo Chamusca completando o trio de guitarras baianas.

por Luciano Matos

el Cabong

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