quinta-feira, 28 de maio de 2015

Nucleador, uma entrevista ...

Foto: Janaina Amarante
Como surgiu o Nucleador?

Primeiramente eu gostaria de agradecer ao German e ao Rarozine pelo apoio. A Nucleador surgiu no menor estado do Brasil, Sergipe, na capital Aracaju, no começo de 2008. A proposta da banda, idealizada por mim, Murillo, guitarrista, sempre foi fazer um som que soasse como o hardcore e o thrash metal feito nos anos 80. A junção desses dois estilos fez a banda soar como o crossover.

Vocês já tinham experiência anteriores de outras bandas?

Sim. Antes de fundar a Nucleador eu tinha uma banda de grindcore chamada INRIsório, que teve um grande destaque na cena local da época. Os outros integrantes também tocavam em bandas de hardcore.

O que influencia na composição das canções?

Contos de terror, trash e horror. Críticas sociais ácidas. Diversão e cerveja. Temas diversificados que representam o nosso cotidiano, sem pender para o batido tema de protesto social. Ficções imaginativas de uma mente em devaneio seria a melhor representação. KKKKK. A proposta da banda sempre foi a diversão. Uma boa desculpa pra sairmos do cotidiano desse sistema que a gente vive e termos uma boa desculpa para beber umas cervejas e suar um pouco tocando nossos instrumentos (musicais).

Como foi produzir o ep "zombeers infest"

Um tiro no escuro. A banda tinha menos de seis meses de fundada e já queríamos gravar as músicas que tínhamos ensaiado até o momento. Ninguém da banda outrora tinha tocado numa banda de thrash metal e não tínhamos feito nenhum show com a Nucleador. Não sabíamos como nossas músicas iriam soar num registro de estúdio.

Bom, o resultado final foi bem satisfatório. Disponibilizamos o ep para download na internet. Divulgamos em grupos do Orkut, rede social mais popular da época, e rapidamente tivemos um feedback surpreendente por parte da galera que curte o estilo. Dias depois de lançado o Zoombeers Infest, o Chris, vocalista da banda paulista de crossover, Bandanos, nos chamou para tocar num festival em São Paulo, o Night Of Living Thrashers, na qual a banda sueca Dr. Living Dead iria tocar também. A partir desse convite, bolamos uma turnê pelo sudeste. Tocamos em São Paulo e Rio de Janeiro. Capitais e interiores. Foi do caralho!

Entre um ep e outro houve um intervalo de tempo, qual o motivo?

Nós não somos músicos profissionais e não ambicionamos viver de músicas. Todos, nesse hiato, estavam terminando suas faculdades, trabalhando, e a banda ficou em segundo plano, apesar de nunca ficar parada. Também, logo depois da turnê pelo sudeste em meados de 2009, nosso primeiro vocalista saiu da banda e foi morar em outro estado. Demoramos um pouco pra achar outro vocalista. Quando achamos, nosso baixista foi fazer mestrado em Floripa. Demoramos pra achar outro baixista. Quando percebemos, tinham passado quatro anos sem lançarmos nada.

Quem elabora as capas dos discos?

A arte do primeiro ep foi feita pelo nosso primeiro vocalista, Caio Murder. Não sei de onde ele tirou a arte, mas com certeza não foi original. A arte do segundo ep foi feita por Jansen Baracho, artista gráfico residente em Natal.

"United by the Toxic", como foi essa fase?

Foi uma fase longa. Logo depois de lançarmos em 2009 o nosso primeiro ep e fazermos a turnê pelo sudeste, começamos a compor as músicas do que seria o segundo ep. Devido às mudanças de integrantes, só conseguimos finalizar a pré-produção do ep no final de 2011, quando começamos a gravá-lo. Gravamos bateria, baixo e guitarras, só faltavam os vocais. Foi exatamente nesse período que nosso segundo vocalista saiu da banda, por razões pessoais, e nos deixou com um material semi-pronto, mas drasticamente incompleto.

Demoramos um pouco para descolar outro vocalista, o que está conosco até hoje em dia, o Levi. Tivemos que passar por todo o processo de adaptação novamente. Nessa brincadeira, só no final de 2013 que recomeçamos a gravar os vocais do segundo ep, no qual só foi finalizado no começo de 2014. O resultado foi muito bom, apesar da demora. Com o segundo ep lançado, fomos fazer uma mini turnê com a banda Uzomi, no Rio de Janeiro

Como é a cena que vocês transitam?

Em Aracaju? Inconstante. Os shows undergrounds em nossa cidade ora "bombam", ora não dá quase ninguém. É uma incógnita digna de estudo. Porém, atualmente, com a abertura de bares menores com uma temática rock, a cena deu um leve salto. Antes não tinha lugar pra tocar ou, se tinha, era um lugar grande e caro com certeza de prejuízo. Nesses bares atuais, num perfil minimalista, a logística de se organizar um show ficou bem mais simples e segura, tornando nossos shows em Aracaju bem mais constantes.

Como foi a turnê com o Uzomi?

Foi do caralho, como sempre. Conhecemos os caras do Uzomi desde 2007, quando outra banda que o Bruno Bin Laden veio tocar em Aracaju, a Horrificia. Em 2008 o Uzomi em si tocou por aqui, sendo eu o novamente organizando o show. De lá pra cá firmamos uma bela parceria.

Essa turnê de 2014 foi bastante especial. Fizemos quatro shows no estado do Rio de Janeiro, sendo dois shows na capital e dois no interior. Todas as noites a Nucleador tocou ao lado da Uzomi. Todas as noites eu toquei guitarra em ambas as bandas. Sim, foi uma experiência magnífica tocar guitarra no Uzomi em quatro shows seguidos. Bebemos e comemoramos todas as noites, pura diversão.

O que se espera do futuro da banda?

A Nucleador vai continuar despretensiosa como sempre foi, porém, constante. Sempre produzindo, ensaiando e tocando em shows pelo nosso estado. De quando em quando, viajaremos, quando for confortável. Agora, em 2015, pretendemos produzir e lançar full length, junto com uma turnê pelo nordeste e sudeste. Esse é o plano, torcemos pra que dê certo. Agradeço novamente ao Rarozine pelo interesse na Nucleador e vida longa ao rock.

http://nucleador.bandcamp.com/


Fonte: Raro Zine

#


quarta-feira, 20 de maio de 2015

Coma-Doof Warrior

O quarto filme da franquia Mad Max, a reinvenção poderosa concebida por George Miller, está dando o que falar – isso é fato. As redes sociais estão borbulhando de gente se derretendo de amores pela produção, desde já eleita oficialmente por quem importa como um dos melhores filmes de ação dos últimos anos. - NOTA DO BLOG: Ou de todos os tempos ... - Um dos grandes destaques do filme, no entanto, é um coadjuvante que aparece poucos minutos e não diz uma única palavra. Tom Hardy e Charlize Theron podem chutar bundas, mas eles que se cuidem: Coma-Doof Warrior está na área. Ou no palco, no caso.

Sim, este é o nome oficial do guitarrista cego vindo do inferno (ou quase isso), aquele sujeito de rosto bizarro que aparece em meio às tropas de Immortan Joe, no topo de um carro em alta velocidade em pleno deserto, tocando uma guitarra que cospe fogo enquanto fica pendurado em cabos elásticos diante de um paredão de amplificadores.

Nota do Editor original: Eu vou repetir, caso não tenha ficado claro: UM GUITARRISTA CEGO FR0M H3LL NO TOPO DE UM CAMINHÃO EM ALTA VELOCIDADE NO MEIO DO DESERTO, TOCANDO UMA GUITARRA QUE COSPE FOGO ENQUANTO FICA PENDURADO NA FRENTE DE UMA PAREDE DE AMPLIFICADORES.

Se apenas a descrição desta cena já não é incrível o suficiente para que isso se torne a sua parte favorita do filme, imagine ao ver a dita cuja em tela imensa, com AQUELE som ecoando um riff maníaco de heavy metal. Vai explodir a sua cabeça — e te fazer pedir por um filme solo inteirinho do Coma-Doof Warrior. É, sim, tem gente clamando por isso sabia? Confesso: e eu sou um deles.

Pra muita gente, essa sequência de Mad Max parece uma insanidade. Mas faz todo o sentido quando iOTA (nome artístico de Sean Hape), o músico/ator australiano de 46 anos que a protagoniza, explica em entrevista ao Yahoo Movies! que ele é o equivalente pós-apocalíptico do garoto que incentiva os soldados tocando um tambor. “Ou o sujeito que incita os soldados à batalha tocando sua corneta”, diz. “Ele é o cara responsável por deixar as tropas furiosas”.

A expressão “doof” é típica da Austrália, onde acontecem as chamadas “festas doof”, eventos de música eletrônica nos quais as batidas ensurdecedoras do house ou do techno ficam bombando - “doof doof doof”. E quer saber do mais legal? Aquele veículo todo funcionava DE VERDADE. Nada de trucagem de efeitos especiais. “Sabe, infelizmente, o George Miller não gosta de coisas que não funcionam pra valer”, conta Colin Gibson, designer de produção, num papo com a MTV. “No passado, eu já tinha produzido coisas para ele e tive que ouvir ‘legal, agora liga isso pra eu ver’. Então, tinha que funcionar”, diz.

O que aconteceu foi que Gibson usou um veículo de 8 rodas, um antigo aparato militar para disparar foguetes, a única forma de dar a escala necessária àquela maluquice. Meteu uma dezena de Marshalls e aquele espaço traseiro no qual os rapazes tocavam tambores alucinadamente para acompanhar o trabalho do guitarrista. “E devo dizer, bater aqueles tambores era muito desconfortável andando a 70km/h, comendo a areia da Namíbia”, confessa Gibson. Mas ainda tinha a questão da guitarra. Que tinha que tocar de verdade. “A primeira versão, bom, acho que investi demais no disparador de chamas e pouco no reverb (...) Não me ocorreu que ela tinha que funcionar. Achei que era suficiente soltar fogo e parecer uma guitarra feita de panelas ou algo assim. Até que George disse ‘E onde eu ligo agora?'”. E de volta pra prancheta. “O fogo, sabe, não estava na versão original dos storyboards. Mas era um pouco como um show do Kiss. Precisava soltar fogo. Tinha que ser divertido”. E foi. Pra caralho.

No entanto, para dar o efeito adequado, já que a captação no deserto pode não ser das melhores, a música acabou sendo inserida mais tarde, na pós-produção. Então, o que diabos o iOTA estava tocando, afinal? “Eu basicamente ficava lá improvisando”, conta. “É uma guitarra double neck, então é ao mesmo tempo um baixo e uma guitarra elétrica de seis cordas – e eu estava em cima de um amplificador também, então ficava tremendo, era tudo barulhento o tempo todo. Eu tocava Zeppelin, Soundgarden, AC/DC ou qualquer coisa que me inspirasse” – incluindo aí até os brasileiros do Sepultura. Aliás, por falar no AC/DC, as calças curtas e os tênis do Coma-Doof Warrior foram totalmente inspirados no estilo icônico de Angus Young. “Sabe, a guitarra não era muito boa. E eu passava muito tempo no sol, na areia e no frio. Então era complicado tirar uma boa nota daquilo”. 

O personagem - Juntos, Miller e iOTA criaram uma história para o cativante e enérgico sujeitinho de vermelho. Enquanto o mundo ruía, anos antes, havia este garoto, um prodígio musical que presenciou a mãe, uma mulher que também tinha talentos musicais, ser decapitada em sua frente. “Pra mim, é tudo sobre como alguém cego sobrevive num lugar como este”, explicou o próprio cineasta, em entrevista ao Fandango. “Como alguém mais fraco sobrevive ao apocalipse? Ele sobreviveu porque era cego. Porque viveu no fundo de uma mina, tirando vantagem de ser cego”.

Lá no fundo, se alimentando de pequenos roedores e bebendo o pouco de água do lençol freático que passava por ali, o garoto tocava o que restou de sua guitarra. E o som acabou atraindo Immortan Joe, que encontrou o moleque ainda ao lado da cabeça cortada de sua mãe. “Joe precisava de alguém pra tocar a gaita de fole, alguém que ajudasse a chamar todo mundo pra guerra”. Achou. Adotado pelo líder da cidadela, cresceu e continuou praticando. Mas sempre carregando consigo a lembrança da mãe: seu rosto não é o de uma pessoa desfigurada. É a pele do rosto da própria mãe, arrancada e transformada numa máscara. Estilo Coringa.

" Na hierarquia social que se formou neste futuro, ou você estava pronto para a batalha, como um garoto da guerra; ou tinha um status maior do que qualquer um, como o Joe; ou tinha uma habilidade particular”, complementa Gibson. “Claro que ser um mecânico seria a mais importante destas habilidades, mas essa coisa de tocar guitarra também é. E como ele nasceu cego, isso significaria que ele é nada neste lugar, e eles quebrariam suas pernas e o deixariam no alto da montanha para morrer, estilo Esparta. Mas ele sabia tocar guitarra – então certamente isso garantiu o seu lugar no panteão”.

Um fanático por quadrinhos, Miller vai contar alguns prólogos de Mad Max em uma série especial da Vertigo (DC Comics), escritos por ele e pelo roteirista do filme, Nico Lathouris, com arte do artista de storyboards Mark Sexton. Mas, infelizmente, a trama do Coma-Doof Warrior não consta desta primeira leva – que vai abordar histórias pregressas de Max, da Imperatriz Furiosa, do garoto da guerra Nux e do próprio Joe. Só que o diretor deixa a semente plantada: “eu quero contar a história sobre ele num gibi se tiver a oportunidade”. 

O homem por trás da máscara - iOTA, ou melhor, Sean, é uma espécie de rock star na Austrália. Além de já ter lançado cinco discos de composições próprias, foi a estrela das montagens locais de musicais como Hedwig and the Angry Inch, The Rocky Horror Show e Smoke and Mirrors (do qual é co-criador). Já foi indicado ao ARIA Music Award, uma espécie de Grammy australiano, e chegou até a derrotar o compatriota Hugh Jackman na categoria de melhor ator nos Helpmann Awards, uma espécie de Tony australiano. Atualmente, está ensaiando para encenar a peça B-Girl, escrita e estrelada por ele – e a ser apresentada na Sydney Opera House a partir de junho. O seu nome, claro, acabou se tornando um dos principais argumentos de venda do espetáculo.

Nome que, aliás, não significa lá muita coisa. “Quando eu era criança, sempre quis mudar meu nome, na mesma linha do que fizeram ícones dos anos 1970, como David Bowie e Iggy Pop”, explica ele, em entrevista para o Buzzfeed. “Sempre gostei dessa palavra, iota (a nona letra do alfabeto grego), e eu achei que seria um bom nome pra uma banda. Aconteceu. Quando acabei ganhando a chance de fazer um show solo, pensei, é agora que mudo meu nome para iOTA”. E assim mesmo, com o I em caixa baixa. “Ia acabar saindo no jornal como LOTA, o que é horrível. E assim até que ficou legal”.

Antes de Mad Max, a única experiência de Sean nos cinemas tinha sido em 2013, na adaptação de O Grande Gatsby dirigida pelo também australiano Baz Luhrmann. O músico interpretou, ironicamente, outro músico: Trimalchio, o líder da orquestra. Mas como todo moleque da terra dos cangurus, claro, iOTA cresceu fascinado pela trilogia original de Miller, estrelada por Mel Gibson – em especial pelo segundo filme, seu favorito. Assim que descobriu que o diretor estava querendo rodar um novo capítulo da saga, o sujeito pirou. Ligou imediatamente para os seus agentes e exigiu entrar na parada. “Eu faria qualquer coisa para estar naquele filme”.

Um ano depois, praticamente esquecido daquela história, eis que vem um telefonema. O chamado para um teste. “Eles me pediram basicamente pra levar uma guitarra. E disseram que o papel era uma mistura de Keith Richards e espantalho”. Mas iOTA fez mais do que carregar o instrumento consigo. Colocou um figurino que lembrava o dos motoqueiros de Mad Max 2, com couro, penas e pedaços de coisas penduradas. Sujou os dentes. Ficou nojento. Se meteu num táxi e arrancou olhares espantados do motorista. “E aí, chegando lá, eu toquei a minha guitarra e foi isso. Peguei o papel”.

Mas esqueça este ar blasè porque, conforme o próprio admite, foi como estar em um sonho o tempo inteiro. “A coisa toda foi de explodir os miolos, sabe? Eu ficava andando pelo set de queixo caído o tempo todo. Foi incrível. E atravessar o deserto naquela caminhão foi realmente demais. Você deveria tentar”.

Eu adoraria ...

por Thiago Cardim


#


 
 

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Clandestino & Maximum Rock´n´Roll

Amanhã, 16, às 17h, acontece mais uma vez o Clandestino. O evento, que acontece sempre com local divulgado horas antes do seu início, já ocupou pontos de Aracaju como o calçadão da 13, a Praça Camerino, a Ponte do Imperador e até a parte inferior da ponte Aracaju-Barra. Sempre com o estilo punk do “faça você mesmo”, o Do It Yourself, diversas bandas já se apresentaram sem edital num evento consolidado no cenário alternativo que não conta com portão ou ingresso.
.
A edição deste mês é a décima primeira e está alinhada com uma mobilização mundial para angariar verba para o zine americano Maximum Rock’n’Roll. A publicação desde 1982 pauta punk, hardcore e garege rock em sua publicações, além da rádio MRR que está no ar desde 1977.
.
Na página do evento, a pergunta sobre um possível local recebe ótimas sugestões dos adeptos como a praça da Epifânio Dória, uma pista de skate na Barra dos Coqueiros e ainda na parte de traz do Shopping Riomar. O negócio é ficar ligado na fanpage para saber onde será este Clandestino. Desta vez, The Renegades of Punk,  Orca, Seu Montanha e Zeitgeist são as bandas que tocarão no espaço que conta com a contribuição espontânea para ajudar na estrutura, além dos fundos para o fanzine.
.
Bagaceira Talhada – Como surgiu a ideia e como se deu o processo de estruturação do Clandestino?
Clandestino – A ideia do Clandestino não é nada nova, nem original. Este evento já existia e era executado pelos punk locais em décadas passadas. Ele faziam eventos na rua chamados “Clandestino” do jeito que eles sabiam e podiam; com todos os percalços que vinham junto com a iniciativa. Ouvindo esses relatos e unindo essa história a um ímpeto que já tínhamos de fazer shows punks na rua, o Clandestino ressurgiu, ganhou características novas e de 2012 pra cá já foram feitas dez edições – estamos indo para a décima primeira.
.
BT – As manifestações de rua de 2013 foram favoráveis às ocupações artísticas da cidade? As pessoas passaram a pensar mais a questão de ocupar os espaços desde então?
Clandestino – Não vemos uma relação direta de uma coisa com a outra. As “grandes manifestações de 2013” tiveram uma peculiaridade bem do nosso tempo, uma volatilidade incrível. A gente busca algo diferente. Uma experiência mais real, mais viva de um evento com música e uma re-significação dos espaços públicos da cidade.
.
BT – Como o Clandestino vê o Manifesto Político-Cultural, lido no aniversário de Aracaju, e o grupo que tem se formado em torno dele?
Clandestino – O Clandestino é marginal por opção. Fazemos questão de que nossa proposta seja executada por nós mesmos e pelas pessoas que interagem e constroem aquelas experiências. Acreditamos que precisamos fortalecer uma comunidade baseada em autonomia, no “faça-você-mesmo”. O grupo organizado para o manifesto tem tomado iniciativa em nome da cultura local e reclamado uma valorização oficial/institucional dessa cultura. Entendemos o valor que esse reconhecimento tem para a comunidade artística local, em termos de viabilização financeira de projetos culturais. Porém, a proposta do Clandestino é claramente outra. As atividades que realizamos já são o fim e não o meio, e independem de apoio institucional.
Para nós, atividades como o Sarau Debaixo, assim como o Clandestino por exemplo, já são experiências bem sucedidas de organização autônoma e de reconhecimento pela própria comunidade que legitima esse tipo de manifestação. Há um empoderamento em construir cultura (contracultura) de forma independente, do qual não podemos fazer pouco caso. E é isso que tentamos mostrar para as pessoas: elas podem, não precisam de permissão e não precisam esperar ou pedir que ninguém faça por elas. Tendo dito isso, não queremos de forma alguma desmerecer o trabalho que esse grupo tem realizado. Só estamos deixando claro que há diferenças de abordagem sobre esses temas, ainda que no fim tenhamos intenções semelhantes.
.
BT – O Clandestino sempre conta com várias bandas até de fora do estado. A Ideal quando fez quatro “Zuadas” para a gravação do seu próximo trabalho contou com várias bandas. Há uma irmandade na cena punk maior do que em outros estilos?
Clandestino – O punk é construído, desde que existe, em cima de uma rede de amizade/solidariedade gigante que desconhece fronteiras e idiomas diferentes. Isso é uma das coisas que o torna tão fascinante. E a pegada do Clandestino é essa. Fazer as coisas acontecerem independente de dinheiro, de distância… fazer as coisas de uma forma colaborativa e onde todo mundo possa fazer um pouco. Sempre enfatizamos isso. A responsabilidade de participar ativamente do evento, mesmo que você não tenha um amplificador de guitarra para emprestar ou não tenha uma banda para tocar. Qualquer pessoa pode chegar junto e fazer algo. É um evento construído coletivamente. Não estamos oferecendo um serviço em troca de dinheiro. Estamos tentando realizar tudo no chão, no mesmo nível. Sem palco, sem estrelas, sem balada. E isso vem de tudo que vivemos e aprendemos nessa grande rede do punk. Nesse sentido, pode-se até dizer que existe uma irmandade nesse rolê. Mas não sabemos se essa palavra é a melhor para descrever a relação que é constantemente construída entre as bandas que fazem parte desse circuito. Ao mesmo tempo nunca fizemos parte de outro circuito para poder comparar. Acho que na verdade é tudo uma questão de formas de funcionamento diferentes. Cada rolê tem o seu jeito de fazer as coisas acontecerem.
.
BT – Como surgiu a mobilização mundial pelo zine americano Maximum Rock’n’Roll? Por que o Clandestino aderiu a esta corrente?
Clandestino - A MRR existe há muito tempo de forma independente, total faça você mesma, cobrindo o punk mundial, seja através do seu zine, site, rádio… Como participantes e consumidores desse rolê, conhecemos a revista tem tempo e sabíamos que eles eventualmente fazem eventos para levantar grana para continuarem ativos. Dessa vez eles resolveram fazer algo maior, um dia mundial onde vão estar rolando centenas de shows em praticamente todos os continentes do planeta de forma conjunta. Tudo isso para levantar alguma grana e ajudar a MRR a persistir. Um amigo nosso, que tem bastante envolvimento lá com a MRR, jogou essa ideia pro pessoal da Renegades of Punk (que faz parte do Clandestino) que topou fazer no esquema de sempre. O que mais teria a ver com esse evento? Clandestino, claro.
.
BT – Há uma carência de publicações que pautem o punk, assim como faz o Maximum Rocknroll?
Clandestino – Sim. Tradicionalmente esse é um campo dos zines. Existem muitos zines ainda, mas depois de um período meio fraco e disperso, eles voltam a estar em distros, em selos, e em trocas de zineros pelo mundo. A MRR é um zine mais estruturado, num formato meio revista já e de circulação mundial. Zines pequenos existem em todo canto. Também foram ofuscados de leve por blogs e sites especializados. Aqui em Aracaju temos zineiros e zineiras ativas e algumas pessoas que se dedicam a cobrir o que borbulha na cena mais rock and roll e o que fervilha no submundo, um exemplo disso é um zineiro antigo sergipano, Adelvan Kenobi, que mantem alguns blogs que tratam de submundo, rock, cinema, literatura e coisas gerais de inconformados com o mundo como ele é. É sempre importante que se conte uma história. Precisamos que mais pessoas queiram participar e essa participação pode ser feita de várias formas, inclusive documentando o rolê.

Do Site Bagaceira Talhada

por Kaippe Reis

#


terça-feira, 12 de maio de 2015

The Baggios, 10 Anos depois ...

Com seus dois álbuns - “Sina” (2013) e “The Baggios” (2011) - presentes em dezenas de listas de “Melhores Lançamentos do Ano” por sites especializados, jornais como O Globo e em revistas respeitadas, como a Rolling Stone que elegeu sua música ‘Sem Condição’ como uma das melhores do ano, a banda sergipana The Baggios comemorou 10 anos de carreira, no ano passado, com uma turnê de 65 shows que passou por 38 cidades de várias regiões do Brasil.

Júlio Andrade (voz e guitarra) e Gabriel Carvalho (bateria) tocaram em lugares consagrados como o Sesc Pompeia (SP) e o Centro Cultural de São Paulo, e em festivais grandes como o Festival Dosol (em Natal), Porto Musical (em Recife)  e o caso do Porão do Rock em Brasília, onde  mostraram suas músicas  para mais de 30.000 pessoas.

A turnê comemorativa foi iniciada no Teatro Atheneu, onde a banda se apresentou para mais de 700 pessoas e registrou um dos melhores shows de sua carreira em DVD e CD, nomeado de “10 Anos Depois”. Esse mais novo material será lançado no próximo dia 13 de maio, às 21h, no Teatro Tobias Barreto, e assim como no DVD, o show contará com participações de  músicos que fizeram parte de sua história, como Vinicius Bigjohn (sanfona), André Lima (trompete), Mário Augusto (saxofone) e a participação inédita do gaitista Julio Rêgo.

O Bangalô Cult entrevistou com exclusividade o vocalista e guitarrista Júlio Andrade que, juntamente com o baterista Gabriel “Perninha” Carvalho, formam o duo nascido em São Cristóvão há uma década. Fique por dentro do que vem por aí...

BC- Gostaria que você falasse um pouco sobre o show da banda The Baggios no Teatro Atheneu e que deu origem a esse DVD/CD. Foi a primeira vez que a dupla se apresentou num teatro sergipano ? Quais as vantagens e desvantagens de tocar num local desse formato ?

JA-  Na verdade, já tínhamos nos apresentado no Teatro Atheneu, em 2007, no Prêmio Prata da Casa, onde fomos agraciados em três categorias. Na época, foi muito mais esquisito, não curti. Nada melhor que o tempo, para nos mostrar o quanto é mágico um show no teatro. Essa apresentação que fizemos há um ano, nunca será esquecida. Aconteceu no mês que completamos 10 anos de existência e nossa intenção foi festejar esse marco, afinal nunca imaginei que duraria tanto tempo fazendo rock em Sergipe. Tiveram momentos emocionantes no show, a exemplo de quando juntamos os dois antigos bateristas -Lucas Araújo e Elvis Boamorte- e tocamos "Morro da Saudade", sem contar com as participações de vários músicos sergipanos que admiramos.

BC- Fale um pouco sobre a produção desse primeiro DVD da banda e o repertório .

JA- Inicialmente, queríamos fazer uma festinha para comemorar o aniversário da banda, e a ideia seria fazer uma cobertura do evento, algo com duas músicas e uns depoimentos. Aos poucos, fomos pensando maior e bateu o estalo: "porque não gravar o show inteiro e ver no que dá ?". Lucas (primeiro baterista da banda) que hoje mora na Suíça tinha programado vir  para esse show, o que foi um  estímulo para pensarmos em algo maior e  chamar Elvis, e outros músicos que fizeram parte da história da The Baggios. A gente tinha a noção que custaria caro e que quebraríamos bastante a cabeça, mas nada pagará a energia que sentimos naquela noite, onde o Teatro Atheneu estava lotado para nos ver, vibrar e cantar todas as músicas conosco.

BC- No show de amanhã vocês irão repetir, na íntegra, o conteúdo do DVD ?

JA- O repertório será parecido, mas apresentaremos umas coisas novas e terá participação inédita do gaitista Julio Rêgo.

BC-  A banda pretende realizar uma turnê de lançamento do DVD? Já tem o roteiro traçado?

JA- Estamos analisando  algumas propostas para julho, mas no dia 31 de maio, já faremos um show na Virada Cultural de Campinas, abrindo o show de Titãs, e esse será o nosso ponta pé inicial da nova turnê nacional. Esse ano, estamos pensando em turnê de uma forma menos intensa, com datas mais quebradas, pois ao mesmo tempo que estaremos divulgando o DVD, vamos estar em processo de pré-produção das novas músicas. Em 2016, pretendemos lançar um novo álbum de inéditas e apresentar um novo Baggios de repente...

BC- O que a Baggios tem de novíssimo já engatilhado ?

JA- Estamos no momento pensando mais no DVD. Mas estou com muitas músicas novas e ansioso para iniciar a pré-produção delas para ver como funcionará na banda, e poder começar a montar o conceito do novo disco. Além disso, queremos produzir dois clipes ainda do álbum "Sina". Os planos estão no papel, agora é ralar prá ver se conseguiremos colocá-los em prática.

por Suyene Correia

#

terça-feira, 5 de maio de 2015

Saravá, Abril pro rock ...

Foto: Juarez Ventura (Agência Pavio)
As portas do inferno estremeceram e todos correram para ver quem é. Eu dei uma gargalhada lá no Chevrolet Hall: era a Pomba Gira Maria Mulambo, O Caboclo Sete Flechas, Exu Caveira, Exu Tranca Rua das Almas, Exu Mirim, Omolu e Zé Pelintra pisando pela primeira vez no palco do Abril pro rock !!!

A entrada foi apoteótica: o povo já clamava pela Gangrena antes mesmo das cortinas se abrirem, com Renzo – ex-DFC e Zumbi do mato - em pé fumando cachimbo, de tanguinha e chifrinhos vermelhos, em cima da bateria. Ele desce e vem para a frente saudar o público, enquanto os demais componentes vão entrando aos poucos. Zé Pelintra, o comandante do caos, é o último a aparecer, em traje de gala, todo de branco, como manda o bom figurino, entoando um ponto de macumba e anunciando que aquela era a Gangrena Gasosa com “surf iemanjá”. Aí o lugar veio abaixo ...

"Renzo, tá levando seus chifres?"
“Se Deus é 10 Satanás é 666” veio na sequencia e aí foi só correr para o abraço: audiência pra lá de conquistada, nem os problemas com o som – muito alto e com a guitarra saturada – e a execução – altas “atravessadas” – atrapalharam a festa: o botão do “foda-se” estava ligado no volume máximo, já que aquela era a primeira apresentação do lendário combo de “saravá metal” carioca não apenas em Pernambuco, mas em todo o nordeste! Os hits se sucediam e a molecada ia à loucura com verdadeiros clássicos do cancioneiro underground tupiniquim que chamam a atenção já a partir dos títulos - “Quem gosta de Airon Meiden também gosta de KLB”, “Eu não entendi Matrix”, “Terreiro do desmanche”. Nas mais aceleradas, como “Matou a galinha e foi ao cinema”, a roda era insana – e gigantesca. Em outras, a interação foi perfeita, com todos gritando a plenos pulmões que “Emilia pomba-gira é uma boneca de Vodu” em “Centro do Pica-pau Amarelo” e clamando por Satanás em “A Supervia deseja a todos uma boa viagem”. Pra mim, que sou fã de longa data e sonhava em vê-los por aqui um dia, foi emocionante. Sucesso total, amplamente confirmado pelo assédio que as entidades sofreram depois do show, nos corredores da casa – impressionante a paciência, simpatia e boa vontade dos caras – e da “mina” - especialmente de Ângelo/Zé Pelintra, o “frontman”, em atender a todos, tirando uma infinidade de fotos com os fãs.

Na porta, mas vão entrar ...
Com a difícil tarefa de exorcizar qualquer resquício de blasfêmia “metalica” que porventura ainda pairasse no ar, subiu ao palco, na seqüência, a Headhunter DC, da Bahia, e sua ortodoxia “headbanger” a toda prova. “Dedos em chifre!”, clamava o vocalista, Baloff, a toda hora, no que era prontamente atendido pela multidão. Peso e melodia na medida certa! Destaque para os solos do veterano guitarrista Paulo, único membro fundador ainda presente. Um show perfeito, inclusive na qualidade do som, muito melhor equalizado. Headhunter “Death Cult” é, a meu ver, a melhor banda do estilo no Brasil, e não deixou pedra sobre pedra, mesmo fazendo uma apresentação corrida, devido aos atrasos. Quanto à ortodoxia mencionada acima, ela existe – “666”, totalmente – mas é natural do show dos caras, não creio que tenha sido uma resposta à Gangrena – muito embora, por ter vindo na seqüência, tenha dado essa impressão.

Duas "papa-girimum"
Foram sucedidos por um tal “Project 46”, de São Paulo, apresentado como “a nova revelação do metal nacional”. Não conhecia, e não gostei. Por uma questão de gosto pessoal, mesmo. Fazem uma espécie de “groove metal”, ou um “Nu Metal” tardio. Muito competente, a galera curtiu, mas eu dispensei, preferi circular pelos stands e banquinhas, revendo os amigos e babando nos produtos à venda, especialmente nos discos de vinil – outra tradição do abril. E vendo o pessoal da Gangrena ser impiedosamente assediado ...

Tive bastante tempo para circular, já que a banda seguinte foi o Dead Fish, que eu respeito, mas não curto. E então, numa dobradinha perfeita para uma noite que teve também a Gangrena Gasosa – pra quem não sabe, uma só existe por causa da outra – sobe finalmente ao palco, numa “vibe” politicamente engajada, exibindo, num dos amplificadores, uma faixa a favor do fim das tarifas de transporte público, o Ratos de Porão. Que fez, no entanto, um show nitidamente burocrático, pra “cumprir tabela”. Não sei o que houve, mas os caras pareciam cansados. Não houve entrega! Foi, certamente, o pior show do Ratos que eu já vi na vida – e eu já vi muitos, desde a primeira vez, no inicio dos anos 90, em Salvador, na turnê do “Anarkophobia”. Mas não foi ruim. Ratos não faz show ruim. Não tem como, com um repertório daqueles e tantos anos de estrada nas costas. Nem a longa “pausa técnica” no meio da apresentação, com direito a farpas verbais de Jão e do Gordo direcionadas, pelo que entendi, ao Boka, conseguiu acabar com a empolgação do público, que seguia intacta, já noite avançada adentro – e com muita coisa ainda pra rolar, como bem observou o Gordo ao perguntar, ironicamente, “vocês vieram pra ver o Marduk, né?”

Foto: Juarez Ventura (Agência Pavio)
Mas quando o show acabou a situação mudou: boa parte do público foi embora e quem ficou exibia sinais claros de cansaço, o que prejudicou bastante aquele que prometia ser o retorno triunfal aos palcos dos pioneiros da Câmbio Negro HC, comemorando os 25 anos de lançamento de “O Espelho dos Deuses”, primeiro disco de Hard Core lançado por uma banda nordestina. Prejudicou, principalmente, porque a falta de resposta da audiência – e o som, terrível! - contaminou a banda, que fez um show “truncado”, sem ritmo, com o vocalista Ajax – também “pesado”, mas não “aquele”, dos primórdios – reclamando a todo momento da “morgação” dos presentes - algo que nenhuma banda, JAMAIS, deve fazer! Faça sua parte, se houver resposta, ÓTIMO, senão, ligue o foda-se e toque o terror, apesar os pesares. Pesou(sic) também o fato de que a banda ficou muito tempo fora de atividade e voltou desfigurada, o que certamente contribuiu para que se instaurasse um clima de apatia entre os que nunca os tinha visto ao vivo anteriormente. Vivemos em tempos frenéticos de excesso de informação e de ofertas de distração, o que torna difícil para uma banda se manter relevante se não estiver em atividade constante. Em todo o caso, não foi de todo ruim: foi bom ouvir de novo, em alto e bom som, o velho brado, “evacuem essa área!”. E o vocal de Ajax é legal, substitui com dignidade o “frontman” original – algo sempre complicado, pra qualquer banda. Mas não gostei da música nova apresentada. Muito repetitiva.

Foto: Juarez Ventura (Agência Pavio)
O final da noite foi reservado para as apresentações “gringas”, a começar pelo Coroner, da Suíça. Banda lendária, foi fundada pelos roadies do Celtic Frost, que a lapidaram nas passagens de som dos pioneiros do Black metal. Mas foram, também, extremamente prejudicados pelos problemas de som e pelos atrasos na programação. Tanto que, depois de apenas quatro musicas – totalmente retrô, anos 80 até o talo - o guitarrista vai ao microfone e explica que teriam que limar o repertório, a pedido da produção. Volta a tocar mas entrega os pontos, encosta a guitarra e sai do palco, mandando dedo para os bastidores. Os demais membros, numa demonstração de profissionalismo exemplar, seguem tocando até o fim, quando finalmente se despedem, sob aplausos e visivelmente constrangidos pela atitude do outro. E eu segui intrigado, sem saber o que um deles fazia no palco, aparentemente “tocando” um ... laptop !!! Não havia nada de eletrônico no som, nem bases pré-progrmadas identificáveis que justificassem sua presença. Mas ok, ele fazia também uns vocais de apoio ...

Foto: Juarez Ventura (Agência Pavio)
Já era madrugada e eu estava cansado demais, mas teríamos ainda o Marduk, da Suécia, para encerrar a maratona, o que prometia um ataque ensurdecedor aos nossos ouvidos já tão castigados. Promessa cumprida, com louvor! Depois de uma introdução “climática” com uma névoa densa envolta em sons que pareciam vir das profundezas de uma floresta nórdica, eles sobem aos poucos ao palco, começando pelo baterista. E o inferno se instala, mais uma vez, mas desta vez numa potencia elevada ao cubo, implacável e sem descanso – antes no entanto, o guitarrista teve que chutar o retorno para que o som voltasse. Totalmente “satan”, “from Hell”, “666”, “Belzebu”, “Belial” e coisa e tal. Pra quem gosta, foi um prato cheio. Mas eu nunca curti muito estes Black Metal “metranca” – aos meus ouvidos, soa como se eles estivessem tocando sempre a mesma música, o que é insuportavelmente chato - então aproveitei para ir embora mais cedo. No caminho de volta pra casa comentávamos, eu e meus companheiros de viagem, que quem nos visse saindo, mais uma vez, antes do fim, provavelmente não entenderia o que, afinal, nós queríamos, já que na noite anterior havíamos dispensado o show da Pitty. “Um meio termo, talvez”, respondeu, sabiamente, meu camarada Lenaldo. Fica uma certeza: de falta de ecletismo ninguém pode acusar o Abril pro rock ...

Não era o Marduk no palco ...
Já passava das duas da manhã de uma noite que havia começado bem mais cedo, por volta das 19H – estava marcado para as 18 – com a Lepra, “feijão com arroz” detah/grind local, e com o sensacional Catarro (tem trema no nome, mas eu não sei como colocar, sorry), do Rio Grande do Norte. Pedro “Mendigo” veio para confundir e entortar a mente dos cognitivamente mais limitados com sua perfomance insana que mistura cambalhotas e muito barulho com uma cover de Marcio Greik (se não me engano) na introdução. Antológico. Depois teve Hate Embrace, chatinha, e Almah, CHATÍSSIMA.

A noite anterior havia começado para nós, “atrasildos”, com o Boogarins, de Goiânia. Que, para mim, não disse ainda a que veio: muita viagem pra pouco som. “Don´t believe the hype”, já dizia o Public Enemy ...

Era ela ...
Depende do hype. Do Far From Alaska eu gosto. Primeiro show que vi deles. Curti bastante. Um pouco “certinho” e “profissional” demais, talvez – me pareceu pouco espontâneo, mas pode ter sido impressão minha – mas a perfomance de todos - especialmente das duas vocalistas - foi perfeita. Amigos meus não curtiram, acharam o som genérico, sem definição, ora soando como Adele (???!!!), ora como o Metallica (talvez), ora como Rage Against The Machine (aí pode até ser), mas eu discordo. Acho a banda muito boa, tem boas composições, ótimos músicos e uma excelente presença de palco. Aprovadíssimo.

Foram seguidos pelo dEUS, da Bélgica. Experimental, “pero no mucho” – algumas melodias são bastante “assobiáveis”. Bom show, apesar do som falhando e do exagero perfomático do violinista, que eu achei meio “poser” ...

Priscila Novaes Leone
Quem também fez um (muito)bom show foi o Pato Fu. Periga ter sido um show perfeito, admito. Mas não consigo avaliar direito porque sou um ex-fã xiita, daqueles que só gosta, MESMO, do primeiro disco, o clássico “Rotomusic de liquidificapum”, e mais ou menos dos dois seguintes. Deixei de gostar depois do “Televisão de cachorro”, quando o comando criativo do grupo passou a ser nitidamente compartilhado por John com a Fernanda Takai, que sempre foi muito mais para o pop e a bossa-nova que para o rock and roll. Mas nunca deixei de respeitá-los. Segue sendo uma banda, no mínimo, simpática. E decente. E extremamente competente e de muito bom gosto: as projeções de imagens no palco são sensacionais! Foi o que mais me prendeu a atenção, aliás. Fazia tempo que não os via ao vivo. Curti. Quase dancei ao som de “Uh uh uh lá lá lá yeah yeah” ...

A primeira noite se encerrou com Pitty e a incrível revelação – para mim, pelo menos – que a nossa cabeça tem 7 buracos! Nunca tinha pensado nisso. Mas só vale se descartamos os olhos, não é?

Bom show, grande domínio do palco.

Respeito a Pitty.

Ela é massa.

A.


#