quinta-feira, 4 de março de 2010

Festivais "independentes" em discussão ...



O RACHA DOS INDIES

Mario Marques e Ricardo Schott

Fonte: LABORATÓRIO POP

Os independentes estão oficialmente rachados. Criada em 2005, a Abrafin surgiu como organizadora dos eventos de música no Brasil, ganhou o apoio dos grandes, como Abril Pro Rock (Recife), Mada (Natal), Porão do Rock (Brasília) e Eletronika (Belo Horizonte), embora sua influência nunca tenha chegado a Rio e a São Paulo. Hoje inchado (contabiliza-se 44 festivais, a maioria sem expressão e com pouco público), a associação, que se move entre Goiânia e Cuiabá, está sendo duramente contestada. É acusada de favorecimento a festivais de amigos para permanecer no poder, de fazer listas negras com bandas que se recusam a tocar nos eventos de seus diretores e agora estão no centro da maior das polêmicas: uma verba de R$ 10 milhões que estaria sendo negociada com a Funarte, cuja divisão ainda não foi definida. Já se fala nos corredores até em desfiliação dos grandes em retaliação às manobras da entidade, o que a enfraqueceria.

Paulo André, criador do Abril Pro Rock, um dos mais importantes festivais brasileiros (em Recife) e diretor de relações internacionais da entidade. conta que procurou outros caminhos quando percebeu que o rumo político na associação o afastaria de seus objetivos principais.

"Fui vice-presidente na primeira gestão porque o Fabrício Nobre topou ser presidente (e o é ate hoje, eleito) e a galera queria um festival que estivesse há mais tempo no cargo”, conta Paulo André. “Mas sou pela música, não pela política. Vou ser curador do festival Womax, vou fazer uma turnê pelos principais festivais de verão na Holanda, no segundo semestre de 2009 fiz seis viagens internacionais, todas elas a trabalho... Fui à Argentina com o mundo livre s/a. Não tenho tempo para isso, abdiquei porque quero participar, mas não com esse nível de entendimento".

Discussões públicas numa lista fechada na internet mostram o nível de divergência de seus associados. Criador do festival Eletronika (Belo Horizonte/MG), diretor regional da Abrafin e empresário da banda mineira Pato Fu, Aluizer Malab anunciou sua saída da entidade na própria lista na semana passada. Ao LABORATÓRIO POP, lamenta que o nome Fora do Eixo apareça bem mais do que o da própria Abrafin em algumas empreitadas. “Entidades podem colaborar umas com as outras, mas nem todos os que estão na Abrafin são Fora do Eixo. Quando começa a haver uma unificação dentro da entidade não acho saudável, em alguns momentos os interesses se confundem", afirma Malab. “Essa estrutura de só se voltar para a articulação política não dá. Não dá para ter essa lógica de trabalho, do ofício pelo ofício".

A divisão tende a piorar na eleição, no fim do ano. “É quando o debate vai explodir”, garante Paulo André.

A política é prato diário na Abrafin. A associação apresenta os festivais em seu site como algo que, "além de gerar pelo menos três mil empregos fixos e temporários, são os principais vetores de estímulos da cadeia produtiva da música independente brasileira, impulsionando também a abertura do diálogo com os mercados ligados ao setor em nível internacional".

Malab acredita em duas chapas. "É difícil manter uma entidade com tanta gente corroborando as mesmas convicções e surge necessidade de oposição. Eu próprio já falei que se deve fazer uma oposição ao que está aí porque não me sinto contemplado".

É neste ponto que gira o monte de insatisfações. Seis diretores de festivais estão se mobilizando para barrar a tentativa de manutenção do poder. Eventos de porte mínimo estariam sendo abrigados na Abrafin pela presidência para garantir voto na eleição. "No modelo anterior, havia vários gargalos e gente que ficava sonhando entrar. Mas excluir todo o modelo anterior é tão cruel quanto só colocar gente nova", afirma Malab.

A suposta verba de R$ 10 milhões da Funarte alimenta as diferenças. A entidade teria se movido em direção à Abrafin após ter desistido do Projeto Pixinguinha. Eulicia Esteves, coordenadora de música popular da Fundação, não quis informar valores ao LABORATÓRIO POP, mas confirma que a associação estava numa reunião da Funarte com integrantes do projeto Rede Música Brasil, em São Paulo, na segunda-feira à tarde. "Seria prematuro falar sobre os valores, mas há mesmo uma aproximação com a Abrafin", admite Eulicia.

A falta de clareza e de debate na distribuição dessa verba é que vem desagradando aos grandes festivais. A manobra vem sendo chamada de Bolsa-Roqueira, numa alusão ao Bolsa-Família do PT, que garante os votos ao partido em lugares mais carentes oferecendo dinheiro às famílias pobres.

Um dos festivais de maior público e com muita influência Brasil afora, o Mada também não está nada satisfeito com os rumos da Abrafin.

“A Abrafin saiu do seu foco principal, que era fortalecer os festivais”, denuncia Jomardo Jomas, produtor do Mada, em Natal. “Um grupo está aproveitando para colocar muitos festivais para servirem de massa de manobra em negociação com o poder público e conseqüentemente o fortalecimento pessoal de alguns membros da associação e do grupo a que pertencem. O que vemos hoje é todos trabalhando para alguns, enquanto o correto seria todos trabalhando para todos. Muitos critérios utilizados por essas pessoas não são claros”.

Procurado pelo LABORATÓRIO POP para comentar as declarações sobre a Abrafin, o presidente da entidade, Fabricio Nobre, rebateu as declarações dos festivais.

"Acho que o que acontece na Abrafin é uma diferença geracional. Todo mundo que está na associação lida com música, entende e gosta do assunto", diz. "Não existe uma turma que trabalha mais a música e outro mais ação política. É uma divisão de gerações. Tem uma galera que pegou mais o mercado dos anos 80 e 90. E tem uma galera bem mais nova, porque para entrar na Abrafin tem que ter três anos consecutivos de festival. Esse pessoal mais novo está antenado no contexto político do Brasil, nos novos governos, que têm mais ligação com a cultura e com a educação. Mas existe, sim, uma divisão de pensamento, de posicionamento, que talvez fique mais clara porque vai ter uma sucessão esse ano, já que eu não posso ficar mais um ano como presidente da entidade".

Nobre nega o inchaço da Abrafin com festivais menores. "Quem diz isso está equivocado. Sempre fomos formados por grandes festivais e por pequenos festivais, de segmento. Tem festival de hardcore, festival de cidade do interior... O que importa não é o tamanho do festival, mas sua representatividade dentro do mercado independente. Dos festivais da minha empresa, o Goiânia Noise recebe quase 2 mil pessoas e movimenta centenas de bilhares de reais. Já o Bananada é mais focado no ineditismo, no mercado local, e se realiza com dezenas de milhares de reais. Não faz sentido esse tipo de colocação. Torcemos para que mais festivais grandes e pequenos estejam com a gente".

Um comentário:

  1. A Abrafim nunca me foi confiável. Assim como qualquer outra entidade que fiz lutar pelo interesse de todos. Já era tempo de abri essa dirscussão. Sou produtor independente e giro por todo Brasil acompanhando esses festivais citados. Muitas bandas me falam que existe essa "camaradagem" nesses festivais. Onde é aberta inscrições pra muitas bandas, mais que são selecionadas somentes as que tem mais influências, digamos assim.
    Outro rotulo que precisa ser mudado é esse de "festivais independentes", eles não são mais assim. São 'totalmentes' depedentes da Abrafim. A real, é que os festivais estão se tornando empresas milhionária entre certo organizadores, e tudo para o bem das bandas que tentam chegar em algum lugar..fala sério...
    Quando se coloca política no meio, tudo vira uma baderna. Aqui não poderia ser diferente.

    Festivais independentes...sei do que eles depedem.

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