Atitude! É a única palavra que eu encontro pra definir o que presenciei sábado passado em Simão Dias, cidade do interior sergipano distante 103 km da capital, Aracaju. Atitude da parte do organizador do II Hammer Metal Festival, Plinio Elkson, um batalhador do underground, do público e das bandas que se deslocaram para lá, especialmente a Luxúria de Lillith, que veio de Goiânia (isso mesmo, Goiânia! Região centro-oeste, quase 2.000km de distancia) para se apresentar exclusivamente neste evento. Não estavam em turnê, não deram uma "esticadinha": vieram apenas para tocar para o público sergipano. Impressionante!
Não era nenhuma horda ensandecida a tomar de assalto a cidade, mas o publico compareceu. Se não em grande número, em número suficiente para lotar o local, caso fosse menor - era relativamente grande, o estacionamento do único ginásio de esportes da cidade. Aportei por lá na hora marcada, 21:00H, mas nada de rock: acontecia uma partida de futebol de salão entre os times de uma construtora e uma Livraria (!!!!) e fui informado de que o show só começaria quando o titânico embate esportivo terminasse. Ok, fazer o que? Nada. Demos um rolê, voltamos e fomos assitir à tal partida ...
Assim que soou o apito final, as guitarras guincharam nos amplificadores. Legal, o atraso, ao que parecia, não seria tão grande. Ledo engano: Demorou mais cerca de 2 horas até que tudo estivesse pronto e a primeira banda subisse ao palco, já por volta da meia noite. Era a Human, de Feira de Santana. Bom Heavy Metal tradicional, mas precisava de uma melhor postura de palco do vocalista: muito paradão, sem carisma. No final, apelaram (ou não): Tocaram "Holy Diver", do Dio. É sempre bom ouvir Dio, e os camisas pretas foram à loucura, evidentemente. O vocal, importante numa hora dessas, se não foi arrebatador, também não passou vergonha. Ponto pros caras.
Na sequencia, SenandiomA, combo thrash sergipano que já está há algum tempo na estrada mas só agora parece estar levando mais a sério seu trabalho. Estão em turnê divulgado uma ótima demo tape, "order and progress lies and death". Thrash metal crossover na veia. A banda tem uma boa pegada e se saiu bem no palco, apesar dos problemas com o som da guitarra. Legal também ver de volta aos palcos o bom e velho visual "oitentista" dos tênis de cano longo e das jaquetas cheias de "patch".
A terceira a se apresentar foi a Warfield. Death metal brutal com batida reta, riffs pesadíssimos e vocais guturais e cavernosos. Àquela altura da madrugada, fiquei pensando o que seria da pacata Simão Dias caso Plinio tivesse colocado o palco virado para a cidade ao invés de de frente para o nada - ou melhor, para a Serra do Cruzeiro, onde não mora (quase) ninguém ...
E eis que é chegada a hora das hordas satânicas darem o ar de sua graça. Dali pra frente teríamos apenas o mais negro e obscuro Black metal, diretamente do colo do capeta para os já castigados tímpanos dos sobreviventes. E foram muitos, os sobreviventes: quem foi, não arredou pé (até porque a maioria era de fora e não tinha mesmo pra onde voltar), então um bom publico assistiu à volta triunfal da "Horda" Mystical Fire aos palcos sergipanos (nesta nova fase eles haviam tocado apenas uma vez, mas em Recife, Pernambuco). Já começaram "causando" com um "figurino" impressionante: Elias parecia um guerreiro bárbaro, o guitarrista um carrasco medieval e o baterista, Gabbirin Nagall Giborin AKA Villas Parakas, também conhecido como Bilal, o rei do Metal - A Base de tudo aqui nessa porra - uma espécie de Demonio-serpente tosco e careca. Foi um grande show, com a banda muito bem entrosada entoando seus já clássicos hinos pagãos. Destaque para o novo guitarrista (o mesmo da Warfield), que manda muito bem. Sem baixista. Sem frescura. Um show dedicado à irmã de Elias (me escapou o nome dela agora, mas acho que era Graciele) e a Jaiminho, dois verdadeiros "guerreiros do underground" já falecidos. Homenagem mais do que justa. Foi legal também ouvir a pagação de Elias em cima de quem não compareceu por causa das já manjadas e cansativas fofoquinhas do undergound que empresteiam e contaminam a cena. "Quem veio aqui mostra que sabe andar com suas próprias pernas, ver com os proprios olhos, pensar com o próprio cérebro", ele disse. E eu aplaudi.
A principal "fofoca", ao que parece, era a de que Drakkar, da Luxúria de Lillith, havia declarado em algum lugar, não sei onde (procurei e não vi nenhuma referência a isso na net) que achava legal o uso do "corpse painting" nos desfiles de moda, mais especificamente na São Paulo Fashion Week, pois isso ajudava a espalhar a mensagem do metal negro. Verdade ou não, concordando ou não com o dito ou não dito, o que sei é que a Luxuria subiu ao palco com o dia prestes a nascer e nos conduziu até a alvorada com uma apresentação precisa e matadora. Fazem um som, digamos, "de raiz": Black metal como era feito nos primordios, nos anos 80, brutal porém cadenciado e ritmado, para além daquela massaroca sonora chata e sem sentido que costuma dominar o estilo hoje em dia. Duas garotas na frente, tocando baixo e guitarra, e o baterista Drakkar se incumbindo dos vocais, cuspidos em português alto e claro entre caras e bocas numa perfomance que, confesso, beira o cômico, mas não num sentido depreciativo. Parecia uma espécie de demônio irônico e satírico.
Quem mais me impressionou, no entanto, foi a guitarrista. Toda miudinha, caladinha, vendendo o merchandising da banda antes do show, parecia tímida, porém no palco se transforma: com cara de poucos amigos, despeja uma saraivada de riffs precisos que é o verdadeiro fio condutor do som da banda. Grande perfomance.
Não cheguei a ficar até o final, já que as luzes do astro-rei já despontavam no horizonte e me lembravam que havia um longo caminho de volta a ser percorrido. Saí, no entanto, satisfeito, ao som da musica que leva o nome da banda e ainda a tempo de ouvir Drakkar anunciar mais uma, "o Sarau dos Vampiros".
A caminho de casa, cruzo com caminhões do exército em sentido contrário, provavelmente com destino a Salvador, onde o caos estava instalado por conta de uma greve da polícia ...
por Adelvan
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