quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Cinemerne, uma entrevista

Mudanças na vida: isso é um ciclo constante, intenso e justo na existência do homem. Algumas amargas, outras doces, mas experiências marcantes que nos formam. Que nos diga o compositor e músico sergipano Paulo Henrique, que passou momentos desfavoráveis e agora retorna – o lado bom – para a música com o projeto chamado Cinemerne.

Paulinho é de Lagarto, interior sergipano, e nos idos dos anos 90 foi membro-fundador do promissor trio rock Lacertae, combo avant-garde que aliava um rock denso com experimentalismos. Depois de decepções pessoais, misturadas com drogas e álcool, ocasionando perturbações mentais, afastou-se para tratamento. Hoje, totalmente “limpo”, retorna ao meio com uma investida musical, que é espécie de confessionário da sua vida até o momento.

Cinemerne resume-se numa catarse musical que lhe deu direção e sustentação depois da tenebrosa fase. Esse resultado ele dá o nome de “anti-pop”, mas ainda é nítida a poesia idiossincrática que exerce desde o tempo de sua antiga banda. A sonoridade é monocromática, constituídas de melodias retas, parcimônia de refrões e harmonias simples. Não poderia ser diferente. Seu trabalho é sincero e bastante direto, sem muito apelo. Entende-se melhor quando se entende a história do homem.


Gravado recentemente, “Coisa belas e sujas” dá titulo ao EP com cinco músicas produzidas por Leo Airplane (Plástico Lunar), que trabalhou bem com a proposta de Paulinho, além de ter tocado baixo, teclados e programação de bateria. Em fase de divulgação, Jesuíno André, do Blog "MeuSons", fez uma entrevista exclusiva com o Cinemerne (NOTA: O texto de apresentação também é de autoria de Jesuíno André e foi copiado do mesmo blog):

Após longo tempo distante da música como tem sido seu retorno?

Estou achando agradável. A música pra mim é o meu norte. Passei 15 anos longe, devido a minha loucura (mania depressiva bipolar) e o uso e abuso de drogas e álcool. Estou limpo a mais de uma década e a psicose está controlada. Padeci, cai, levantei, sonhei e agora estou livre. A produção desse EP veio como um bálsamo. Estou compondo mais algumas canções, para no meio do ano gravar e fechar um CD. Vou continuar a batalha e insistir, o meu retorno está sendo de uma magia serena. Vou aproveitar.


Sua antiga banda, Lacertae, tinha uma pegada experimental e inovadora lá nos idos dos anos 90. Seu projeto Cinemerne tem a mesma tendência? Fale um pouco disso.
Não tem a mesma tendência. O projeto CINEMERNE é completamente diferente, é uma pegada anti-pop. Utilizo sim elementos primitivos como flautas artesanais, pedaços de metais velhos mais sem ser experimental. Estou tocando guitarra (sou um músico medíocre, toco com as tripas), gosto de colocar violão com acordes naturais e econômicos. Quero fazer um som que transporte a mente para lugares multicoloridos e agradáveis, através de letras calcadas na poesia do Séc.XVI e Séc.XVIII.Utilizando as palavras como imagens. No EP “Coisas belas e sujas” uso sem economia os artigos definidos e verbos. É pura contemplação. Por isso CINEMERNE está muito distante do Lacertae da minha época.

Como você avalia o cenário independente atual?

Hoje em dia as coisas estão mais fáceis (produção, divulgação, equipamentos),muitos espaços para tocar apesar das panelinhas.Tem muita gente boa fazendo som com atitude e boa vontade. A rapaziada de Recife faz um som muito bom, Salvador, Aracaju. Enfim o nordeste continua parindo bandas muito boas (apesar do brega e do forró do mal). Eu avalio positivamente a cena independente.

O que de novo tens escutado e lhe agradado?

Cara, lá nos idos dos 90 eu ficava viajando no Séc. XXI na virada do milênio, pensava eu que as artes iam se mistificar, um transbordar de almas e pensamentos novos e únicos, que decepção. A arte do Séc. XXI é a pior coisa que aconteceu na história humana. Música, literatura, cinema e artes plásticas são de uma decadência, uma falta de inspiração e vazio imensuráveis. Deprimente. Tenho os pés e os ouvidos fincados nos anos 60 e 70. Desses sons novos gosto de The Dead Weather, Cage the Elephant, The Mars Volta e At the Drive In. É o que deu para citar.

O que significa Cinemerne e porque esse o nome de seu novo projeto.

CINEMERNE foi extraído do livro “A Utopia” de Thomas More. Os utopianos celebram uma festa nos primeiros e últimos dias do mês e do ano. Esses primeiros dias se chamam CINEMERNE que significa festa inicial. Achei o nome sugestivo para o projeto que eu tinha em mente. Que é me afastar e me transportar para longe daqui,desta realidade funesta e nada melhor do que uma festa como veículo de fuga.


Você passou por um longo período de turbulência pessoal. Poderia dizer como isso afetou na sua vida e como saiu dessa?
Passei por uma longa “tempestade cerebral” foi terrível. Fui ao inferno várias vezes, sorvi o cálice da estupidez humana. Cai,levantei, enlouqueci. Mas não há mal que não traga um bem nas suas asas sujas. Aprendi muita coisa, hoje estou mais forte do que nunca. Tudo agora é proveitoso, tem cor, tem som, tem gosto. Para eu sair dessa deixei bem para trás o álcool e as drogas. Não tenho religião (religião é um terreno muito perigoso), mas Deus soprou no meu ouvido lições edificadoras. Minha ótica agora é serena e limpa.

Como surgiu essa parceria com o talentoso Leo Airplane?

Conheci o Léo através do Fabio Snoozer (mantenho contato com os irmãos Snooze). Estava a procura de um lugar para gravar um EP e Fabinho me deu o toque de Léo. Nos encontramos, apresentei os sons e ele fez os overdubs de bateria,tocou baixo e teclados. Foi proveitoso.

Ainda tem alguma ligação com o pessoal da Lacertae, banda que você foi um dos fundadores?
Não. Os caras não têm nada a ver comigo. Aliás, desde os primórdios do Lacertae (que não é nenhuma homenagem a cidade de Lagarto) não me dava muito bem com as idéias fracas dos caras e hoje em dia não me interessa nenhum contato.O passado é pobre.

Qual sua pretensão depois de ter feito esse EP?

A minha idéia é ficar divulgando pela internet o EP. Tenho a pretensão de formar uma banda, mas isso é uma mera conseqüência, hoje em dia as coisas estão mais fáceis. No meio do ano vou gravar mais umas canções para fechar um CD vai se chamar “A noite do Sol”. Vou batalhar para colocar este EP nas mãos de pessoas certas,estou aliviado. Tirei um fardo enorme da cabeça.

Para escutar CINEMERNE

Contatos:
e-mail: vitelloni@bol.com.br
twitter: @Paulovitelloni

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