Guidable - Documentário sobre o Ratos De Porão
Entrevista com os diretores FERNANDO RICK E MARCELO APPEZZATO
Por Márcio Sno para Portal Rock Press
Resgatar da forma mais transparente a história de quase trinta anos de uma das mais importantes bandas de hardcore do mundo. Essa foi a missão confiada pela banda Ratos de Porão, em 2006, aos diretores documentário Guidable, Fernando Rick e Marcelo Appezzato (na primeira foto, Marcelo à esquerda).
E essa missão não incluía apenas colher depoimentos dos integrantes, mas também de diversos personagens que participaram paralelamente da trajetória do RDP. E para isso, foi necessário resgatar figuras que contribuíram para o nascimento do movimento punk no Brasil além, é claro, de ex-integrantes da banda. Precisaram também resgatar documentos dos mais diversos formatos e condições.
O filme teve uma sessão aberta para a imprensa e convidados em 4 de maio na Galeria Olido, que fica ao lado de um dos pontos de encontro mais conhecidos para quem gosta de barulho: a Galeria do Rock. Na verdade, a maioria dos presentes era formada por figuras clássicas do punk dos anos 80 que se manifestaram cada vez que apareciam em cena no documentário “Guidable”.
A produção contou a história do RDP desde o seu começo e foi conduzida pelos discos lançados pela banda, com opiniões dos membros atuais e dos que faziam parte na época de cada lançamento. E nenhum detalhe foi esquecido ou camuflado: foram explicitados os problemas que os integrantes passavam com drogas, as brigas internas e até como que foram articuladas as saídas de membros da banda.
Essa é a história definitiva do RDP, agora ficará difícil fazer uma entrevista com banda, pois quase tudo que se precisa saber está nesse documentário. Se virem jornalistas!
Os diretores foram muito felizes e produziram o registro definitivo do que é a banda. E também acertaram na mensagem antidrogas que passam no decorrer com os depoimentos dos próprios membros e mais explicitamente no final do documentário, com uma frase que deixa faz o expectador ir para casa pensando.
Porém, apesar de a intenção os diretores fazerem um documentário para quem já conhece e para aqueles que nunca ouviram falar da banda, esse é um material para fãs do RDP. O interesse é direcionado para quem acompanhou a carreira (no bom sentido!) deles. Quem não conhece a banda, pode ficar sem entender alguns momentos.
O filme será exibido em cinemas alternativos, centros culturais e teatros (veja os locais e datas em: http://www.blackvomit.com.br/guidable) e em breve sairá a versão em DVD duplo com todos os bônus possíveis e cabíveis em duas mídias.
Portal Rock Press conversou com os diretores do documentário que falaram um pouco dessa viagem em que se meteram.
Como foi o convite para rodar o documentário com o RDP? Quais foram os critérios?
Fernando Rick - Eu havia feito um clipe para uma música do último disco do Ratos, o Homem Inimigo do Homem, que foi censurado pelo dono da gravadora Deck Disc, que achou o conteúdo muito violento. Meio absurdo, pois não tem metade da violência contida em metade da programação da MTV, mas tudo bem. À partir disso surgiu este link entre mim e o Gordo e rolou a idéia de fazer o documentário sobre a história da banda. O lance é que outros diretores já haviam tentado fazer este documentário, mas ninguém concluiu. Aí surgiu a idéia. Isto foi em 2006.
Como é ter um clipe censurado em pleno século XXI? A Deck não exagerou? Pra mim, o clipe tem cara de filme B...
Rick - Exagero total! O clipe tem uma violência exagerada, que passa longe da realidade. A letra é antiviolência, e metade da programação da MTV é mais pesada, basta ver o clipe do Sepultura que saiu na mesma época, aquele em que o Iggor toca com pé de bode [Convicted in Life, dirigido por Ricardo Laganaro]. Eles nem ao menos se deram ao trabalho de me informar, apenas não exibiram em nenhum lugar.
Vocês estrearam na direção de um longa-metragem justamente contando a história de uma das mais importantes bandas de hardcore do mundo. Isso teve muito peso de responsabilidade?
Rick - Claro que teve! Mas além de produtores audiovisuais, nós somos fãs da banda, e sabemos o que um fã gostaria de ver. Então, não ficamos com medo de errar a mão e, além do mais, a ideia era fazer um filme que pudesse agradar tanto os fãs mais hardcore quanto as pessoas que nunca ouviram falar da banda. Ele tinha que ter vida própria e se sustentar enquanto filme, além de ser um registro histórico de uma das mais importantes bandas de punk/hardcore do mundo. Acho que o resultado está aí, pras pessoas tirarem suas próprias conclusões.
Marcelo Appezzato: Talvez se fosse um documentário sobre o Agnaldo Rayol, as coisas teriam sido mais difíceis.
Antes de contarem a história do RDP, vocês optaram em contextualizar o movimento punk da época. Têm idéia de quantas fontes de pesquisa que utilizaram para chegar ao resultado final?
Rick - A pesquisa foi feita com base no nosso conhecimento sobre o movimento, internet e amigos. Sendo que toda a história é contada pelas pessoas que viveram e construíram este movimento aqui no Brasil, entre eles Rédson [Cólera], Clemente [Inocentes], Fabião [Olho Seco] etc. Utilizamos fotos de arquivo pessoal e imagens do festival Começo do Fim do Mundo. Acho que deu pra dar uma esclarecida legal.
Marcelo - Sem contar a infinidade de VHS bolorento, com muito material antigo que a gente conseguiu.
Vocês tiveram autonomia total para filmar?
Rick - Sim, tivemos autonomia total. É um documentário independente, sobre uma banda e um movimento que sempre andou com as próprias pernas. Não tem o que esconder, histórias de brigas e drogas são de praxe.
Algo assustou vocês no decorrer da produção do documentário (imagens, depoimentos)? Houve algum momento de tensão?
Rick - Não, a maior tensão foi passar um ano decupando [processo que consiste em assistir todo o material gravado para selecionar cenas que possivelmente entrarão na edição] fitas madrugadas adentro. Ou a gente terminava ou teria uma overdose ou um coma alcoólico.
Marcelo - A gente acabou entrando no clima “droguístico” da banda, mas foi só durante a finalização. Hoje somos uns santos. Eu juro.
Houve algum fato curioso das gravações que não entrou no documentário?
Rick - Várias histórias legais não entraram. Uma delas é a briga do Ratos com o Sarcófago, ouvir essa história da boca dos caras, é lindo. Talvez entre nos extras do DVD.
Marcelo - Se todas as histórias legais entrassem, o documentário iria ter umas 8 horas. A ironia do destino é que apesar da treta com o Sarcófago, o documentário do Ratos foi feito por uma produtora chamada Black Vomit, em homenagem a um dos clássicos da banda mineira.
A produção contou com algum incentivo (Lei do Audiovisual, por exemplo)?
Rick - Não, foi tudo grana do próprio bolso e, principalmente, ajuda de amigos. Desde a pré-produção até a pós, tratamento de cor, edição de som etc. Tudo com ajuda de amigos.
Qual foi o custo dessa produção?
Rick - Merreca, não deve ter chegado a 5 mil reais. Mas não sei com precisão.
Vocês se inscreveram em festivais com o “Guidable”. Já começaram a ter retorno?
Rick - Inscrevemos em alguns, ninguém aceitou. Ontem (05/04) saíram matérias na Ilustrada da Folha [de S. Paulo], no Caderno 2 do Estadão [jornal O Estado de S. Paulo], e no Variedades do Jornal da Tarde. Hoje, no Correio Brasiliense. Pronto, agora começaram a chegar convites de festivais no meu e-mail. Incrível, né?
Já têm algum projeto futuro?
Rick - Temos um roteiro de curta que foi enviado pra dois editais, estamos esperando resposta. Mais um roteiro que vamos produzir este ano, de curta também. Um piloto de web TV e algumas coisas menores. O nosso problema maior é tempo, toda equipe da Black Vomit tem trampo paralelo, a maioria em TV, o que é foda, pois o horário é móvel e cruel, o que atrapalha nos projetos pessoais.
Marcelo - A gente acabou de colocar no Youtube também, um documentário em curta-metragem chamado Decepção. É só procurar por “decepção black”, que ele aparece lá. [http://www.youtube.com/watch?v=v1seGlBu4-U]
Sempre depois que acaba uma produção se fica pensando: faltou isso, aquilo. O que faltou nesse documentário?
Rick - Faltou a uma hora que cortamos. O primeiro corte tinha três horas. Mas tudo isso vai virar extra no DVD. Também faltou dinheiro, mas o resultado está aí, pra quem quiser ver.
Marcelo - O DVD vai ficar lindo. Estamos preparando umas surpresinhas aí. Aguardem.
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