sexta-feira, 27 de setembro de 2013

The Baggios - uma entrevista

Às vezes a boa nova vem de onde menos se espera. Neste caso, em meio a um período de falsa decadência do Rock Nacional, quando, na verdade, o estilo encontra-se buscando novos meios de divulgação e formação de público, surge uma ou outra banda que nos faz ter fé de que o Rock, este imorrível ser, parece disposto a manter-se firme. The Baggios, dupla de São Cristóvão, Sergipe, faz Rock com sotaque de Raul Seixas e guitarras de Blues, no sentido Jimi Hendrix do termo. No balaio ainda vão os ritmos nordestinos de sua primeira formação musical, riffs do Black Sabbath e muita manha para compor canções com voz, guitarra e bateria. Gabriel Campos e Julio Andrade são The Baggios propriamente ditos e batemos um papo com Julio para saber como andam as coisas neste momento em que lançam seu segundo disco, Sina. 

MB: Contem pra nós um pouco sobre a história do The Baggios e de onde veio o nome da banda.

The Baggios: The Baggios surgiu da necessidade de matar a secura de compor música e tocar no estúdio. Eu toquei em outras bandas entre 2001-2003 e todas elas deram erradas. Ninguém queria levar música a sério. Eu e Lucas Araújo (primeiro baterista) eram os únicos instigados a fazer isso, e no final de 2003 estávamos discutindo sobre como matar essa secura de fazer música, e começamos a dar nomes para uma suposta nova banda, e como buscávamos referência da nossa pacata São Cristóvão, o nome de Baggio prevaleceu na conversa. Ele foi um figura que vivia perambulando pelas ruas com roupas esquisitas e uma viola no ombro, e sempre parava nos botecos ou esquinas para tocar suas composições e clássicos da jovem guarda. Como na época não tínhamos mais amigos afim de se juntar a nós, acumulamos um repertório de bandas que gostávamos e fomos os dois para o estúdio. Lucas na real nem era baterista, ele tocava baixo, mas se prontificou em pegar alguns equipamentos emprestados e aprender a tocar bateria. O primeiro ensaio aconteceu em março de 2004 e estamos nessa até hoje. 

MB: Como é fazer Rock numa cidade histórica de Sergipe?

The Baggios: Pra você ter noção, em quase 10 anos de banda, só fizemos três apresentações em São Cristóvão, e já fazem 5 anos desde a última vez. A banda começou justamente quando o FASC, um dos principais festivais de artes do estado, senão do nordeste, morreu. Esse era o único evento no qual teria orgulho me apresentar novamente, pois quando tocamos em 2004 foi caótico, não houve um pingo de organização, e acabamos sendo mal tratados. Aqui não há um público para alimentar uma cena Rock, tudo depende de Aracaju, e a primeira conquista da banda foi conseguir um show lá. Me lembro como hoje o quanto fiquei empolgado. Isso aconteceu em Agosto de 2004. Eu era fã de bandas como Snooze e Plástico Lunar, e estava ansioso para mostrar minhas músicas para esses caras. Sergipe tem uma das melhores e mais diversas cenas musicais do Brasil, sou fã de várias bandas daqui. Nomes como Plástico Lunar, Elvis Boamorte, Renegades of Punk, Patricia Polayne, Maria Scombona, Ferraro Trio, Coutto Orchestra, entre outros nomes, precisam ser descoberto no Brasil. Cada um desses nomes tem sua própria identidade, e isso é uma das coisas mais fortes da música sergipana. 

MB: O novo disco de vocês, Sina, é conceitual. Qual é a história por trás das canções?

The Baggios: É interessante ouvir que Sina é um disco conceitual. Ele parece ser, mas não foi construído com essa intenção. Tínhamos uma música com esse titulo, e de repente quando começo a rever as letras, vejo que o tema se encaixava bem, e daí batizei o disco com este nome.
Eu sempre costumo observar pessoas como andarilho, mendigo, puta, e imaginar histórias que estão por trás do que eles são. Eu fico imaginando que nem todos escolheram ser assim, e que existem histórias que os fizeram assim, acho que o principio das letras desse disco é mais ou menos isso. Além de algumas coisas mais pessoais também. No disco tem personagens como Salomé, Leão, Zorrão, que eu cresci ouvindo histórias e desenvolvi letras a partir das minhas lembranças dessas figuras quase folclóricas. Leão por exemplo, era um figura baixinho, parecia frágil, e vivia dormindo na estação de trem (estação que aparece na capa do disco), e os pivetes costumavam provoca-lo gritando “esturra leão”, ele ficava pirado e apontada um cajado fingindo ser uma arma, mas por trás disso tem uma história muito mais forte. Reza a lenda que ele matou sua mulher, enterrou no quintal, cumpriu pena, despirocou e viveu como andarilho, passando períodos em várias cidades do interior.
Zorrão foi outro personagem que marcou São Cristóvão, tinha seus 60 anos, e se amarrava em perambular pelas ruas de São Cristóvão fazendo versões de músicas da Jovem Guarda e MPB, fazendo a melodia da percussão com a boca. Era de uma forma "troncha", chegava a ser engraçado, mas marcou bastante.

Outra coisa que influenciou as letras do disco, é que eu acredito que somos reféns de uma sina. Podemos até pegar uma rota diferente, mas acabamos sendo pegos pelo que está escrito. Parece algo religioso, mas não é meu tipo. Eu simplesmente tenho algumas crenças loucas e foi a partir daí que algumas ideias de “Sina” surgiram. 

MB: Vocês são uma dupla, com bateria e guitarra, mas conseguem um som grandioso no disco. Como driblaram a carência de bons produtores no país?

The Baggios: Nós já lançamos três EP’s e dois álbuns cheios, e todos produzidos pela banda. Não por escolha, mas por necessidade. As coisas mudaram, as bandas tem mais autonomia, mais direcionamento, mais segurança, mas é claro que custa tempo para conseguir algo maduro e legal. Ficamos satisfeito com a produção de “Sina”, deve ser porque estamos ficando calejados e amadurecendo aos poucos com essas experiências de produzir nossos próprios discos. Uma das coisas que nos ajudou bastante foi a nossa pré-produção. Passamos meses gravando ensaios, ajustando, bolando ideias. Quando entramos no estúdio, sabíamos o que queríamos. Na captação, devemos muito a nossos amigos que ajudaram na parte da engenharia, e emprestaram microfones, placas, pré-amps. Esses fatores, com certeza foram responsáveis pelo resultado legal, mesmo gravando num estúdio super simples. Sina seria produzido pelo Rafael Ramos, chegamos a mandar demos, discutir algumas ideias, ler emails empolgados, comprar passagens para o Rio, mas as coisas começaram a desandar, e fomos obrigados a não viajar, gravar tudo em Aracaju e lançar de forma independente. Era pra ser assim, eu preferi acreditar nisso. No fim das contas ganhei muito com isso, foi surreal o quanto eu aprendi com esse disco e ainda pude convidar músicos que eu admiro pacas para participar. Eu ainda quero trabalhar com algum produtor, para discutir ideias, ter mais uma cabeça na hora de gravar junto com a gente, com o intuito de buscar renovação mesmo, eu me amarro em me reinventar, faço questão que cada disco tenha uma viagem própria, tenha novas influências. Espero que possamos ter essa experiência no próximo. 

MB: Dá pra notar influência forte de Raul Seixas nos vocais. E de Hendrix nas guitarras. Quem mais vocês ouvem atualmente? 

The Baggios: Raul Seixas é o cara responsável por me fazer escrever música em português. Passei anos acanhado para escrever, mas depois que passei a me aprofundar na discografia dele, aprendi muito e hoje sou grato a ele. Jimi Hendrix foi o cara que me levou ao Blues, e me fazer levar guitarra mais a sério. Juntando esses dois figuras com Zé Rodrix, Jorge Ben, Tim Maia, Black Sabbath e Led Zeppelin, resulta nas minhas principais influências. (Atualmente) estou viciadão em Arnoud Rodrigue. Que cara genial! É surpreendente como o cara é criativo. Além dele estou ouvindo bastante Alceu Valença, Graham Nash, Neil Young, Buffalo Killers, Daniel Norgren, Seasick Steve, Wolf People, e acabei de descobrir o disco “Babylon by Gus” do Black Alien que me fez gostar um pouco mais de Rap. 

MB: Sabemos que é complicado para uma banda sobreviver hoje no Brasil. Como vocês analisam esse cenário atual do Rock no país?

The Baggios: Tem rolado um clima estranho. A gente tem circulado bastante e em todo canto a queixa é a mesma: “Cara, ta foda pra tocar nesta cidade, não tem casa de show”. Isso é preocupante. Por outro lado tem vários festivais legais espalhado pelo Brasil e tem muitas bandas boas produzindo grandes discos. Eu não sei muito bem como julgar essa cena, eu posso dizer que tá bem esquisito e que tá cada vez pior conseguir shows com boas condições. 

MB: Sina está disponível para download no site da banda e o visitante atribui um valor que acha justo. Vocês têm "versão física" do disco? Versões em LP? Como o fã de música faz para ter o disco de vocês na estante?

The Baggios: Essa ideia de “Doe Quanto Achar Que Vale” até que tem funcionado, muita gente aderiu e essa grana vai nos ajudar de alguma forma. Fizemos 1.000 cópias no formato CD e elas estão à venda na loja na página do facebook e em breve no site da banda. Estamos cientes que hoje em dia as pessoas perderam o interesse em ter o disco físico, 40% dos discos damos para produtores e jornalistas e o restante vendemos. Nosso primeiro disco conseguimos vender 1.500 cópias em 2 anos de lançamento, por outro lado foram mais de 12.000 downloads direto do nosso site, sem contar os números dos links que foram gerados noutros sites. Assim ajuda a ter uma noção de quanto a música digital tem ganhou o mundo. “Sina” sairá na versão vinil, e estamos muito ansiosos por isso. Começaremos a pré-venda no nosso site (http://www.thebaggios.com.br/) dia 30 de Setembro. As pessoas tem procurado mais pelo vinil que pelo CD. Isso é legal! O vinil está com tudo. Sairá pelo selo Media4Music, serão 250 cópias, feitas na República Tcheca, na mesma fábrica que os discos do Black Sabbath, Rolling Stones são produzidos, e virá com uma faixa bônus exclusiva para o vinil, chamada “Adios Baggio”, música que escrevi em homenagem ao Baggio que faleceu no ano passado.
Quem tiver interesse de adquirir nossos discos, camisas e o documentário acesse nossa lojinha no Facebook (http://goo.gl/HgCHs0 ) ou através do email loja@thebaggios.com.br 

MB Quais as boas bandas em atividade no Brasil na opinião de vocês?

The Baggios: Curto o Mopho, Autoramas, Vanguart, Porcas Borboletas, Plástico Lunar, Maria Scombona, Snooze, Vivendo do Ócio, Siba, Supercordas, Dingo Bells, Forgotten Boys. Deve ter mais nomes esquecidos na minha cabeça agora, e peço desculpas... 

MB: The Baggios tem algum plano para excursões pelo país? Como podemos ver um show de vocês?

Sim. Faremos a primeira parte da turnê para divulgar “Sina” em Outubro, onde passaremos por cidades da Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Serão 12 shows, em três semanas de turnê. Pretendemos divulgar as datas e detalhes até o final deste mês, pois estamos fechando os últimos detalhes. 

MB: Voltando a Sina, há várias misturas sonoras, mas o Blues parece ser o ponto de partida da sonoridade do disco. Vocês têm heróis do Blues?

Como falei anteriormente, Hendrix me levou ao Blues, ele é um dos meus heróis. Ele me levou a Buddy Guy, Muddy Waters, e esses me levaram a Robert Johnson, Skip James, Mississipi John Hurt, Blind Willie Mctell. Devo muito a meu jeito de tocar a esses caras. Devo a Iommi e a Page também, mas esses dois sugaram da mesma fonte com certeza (risos). 

MB: Como vocês acham que o Rock nacional pode se renovar no sentido de mais pessoas terem acesso ao disco de bandas como The Baggios? Falta divulgação, união entre as bandas?

Agradeço por enxergar na gente uma forma de ajudar a renovação da música (risos). Eu acredito que existe muito “oba, oba” com bandas bem “mais ou menos”, assim como tem bandas que merecem estar sempre na mídia. Não sei se minha música vai ajudar em alguma coisa, mas seria bem legal se tivéssemos oportunidades de tocar nesses grandes festivais, e que fôssemos “descoberto” pelos “grandes”. Falo isso, porque não faço música por hobby, posso até me divertir, mas levo essa ‘onda’ muito a sério e quero muito que a gente forme um público cada vez maior, pra nos dá ainda mais força e moral para continuar nessa estrada enlamaçada. Voltando a falar sobre mudanças na cena roqueira brasileira... eu não sei bem se deveria haver essa mudança, cada um tem sua viagem, eu sigo uma linha, Supercordas tem a sua onda, o Autoramas tem a sua, mas eu gosto deles, me entende? Há umas bandas “mela cueca” que é foda suportar, mas eles acabam uma hora ou outra. É a força da natureza. Sobre divulgação, de repente a gente precise um pouco mais, mas não é fácil trabalhar sozinho. Sem grana não dá para pagar uma boa assessoria, e por ai vai. Hoje em dia eu posso dizer que convivo com pessoas que me ajudam bastante a montar nossas turnês, descolar contatos. Eu vejo nisso uma forma de união. As pessoas realmente gostam da gente, e fazem por onde estar contribuindo com nossa história. Eu agradeço a todos eles por nos dar uma chance e estar sempre acreditando na nossa música. Não vou evitar citar nomes, pois seria injusto esquecer algum. O lance é continuar produzindo, acreditando no que faz, e deixar rolar. Uma hora a coisa funciona de verdade, se já não está funcionando.

Carlos Eduardo Lima perguntou
"Julico" respondeu

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