terça-feira, 10 de novembro de 2009

The Exploited em Natal



Fonte: Rock Em Geral

"O punk não está morto"

No dia destinado à música pesada, o Festival DoSol recebeu um público jovem em Natal, disposto a ter lições com o Exploited, criador do movimento “punk’s not dead”, e a se divertir em rodas de pogo sem perder a consciência com Devotos e Confronto.

Foto do Exploited: Rebeca Correia
texto por Marcos Bragatto

Com uma paisagem decorada por muitas camisetas pretas, o domingão do Festival DoSol, em Natal, foi marcado por uma programação voltada para bandas de heavy metal – em seus segmentos mais variados – e punk rock/hardcore. O destaque maior foi a apresentação do grupo britânico Exploited, ícone do renascimento do punk no início dos anos 80, que apresentou uma indelével vitalidade. Devotos (ex- do Ódio) e Confronto não ficaram atrás e mobilizaram o público com shows contagiantes.

Não é qualquer dia que se vê um símbolo vivo do rock, carregando no peito sua própria imagem. Pois quem se acostumou a reconhecer a caveira moicano do Exploited no imaginário coletivo do rock, pôde ver, ontem à noite, em carne e osso, a cabeça que lhe deu origem. Quando Wattie subiu no palco para encerrar um dia em que treze bandas se apresentaram, trouxe com ele toda a história do punk mundial, que certamente não seria a mesma sem a interferência do Exploited. Por isso o início com “Let’s Start a War (Said Maggie One Day)” tratou de colocar os pingos nos is. Além da origem do hardcore em si, através do movimento “punk’s not dead”, Wattie trouxe para Natal as cusparadas refutadas por John Lydon em todos esses anos.

E também um repertório consagrado por clássicos que transformam o Exploited, hoje, numa banda de classic punk – se é que cabe o maneirismo. Entre mais de 20 músicas, sempre anunciadas sob um sotaque terrível do vocalista, “War”, logo no início, “Alternative” e “Sex And Violence” foram as que resultaram em grande interação com o público, que girava em rodas de pogo sem parar. A última com participação de fãs que subiram no placo após o chamado do batera Wullie Buchan, no bis. Nada que superasse o carisma de Wattie, que anda sem parar de um lado a outro e mantém a tradição de bater com o microfone na cabeça e jogá-lo no chão quando acaba o show. Possesso, o público enlouquecia a cada nova música.

Seguramente o Devotos não existiria não fosse o Exploited, e o grupo de Recife tem em comum com o britânico um punhado de bons hits – mais até, por estas plagas – capazes de criar rodas de pogo sem parar. A colante “Eu Tenho Pressa” e “Futuro Inseguro”, de conteúdo simples e direto que o digam. Canibal está muito bem, comunicativo e fazendo o grupo dialogar com a platéia, em que pese a timidez do guitarrista Neilton, que se esconde atrás de um boné e fica quase o tempo todo de costas para a platéia. Houve tempo para um bis, depois da obrigatória “Punk, Rock Hardcore, Alto Zé do Pinho”.

Sem o Exploited também não teríamos o Confronto, do Rio, outro que proporcionou cenas de diversão explícita. Cada vez mais o crossover hardcore/metal cabeçudo do grupo, com letras de conteúdo social, aponta para a música extrema, cortesia do guitarrista Maximiliano, vidrado em referências como o Slayer do auge do thrash metal. O Confronto tem um público fiel em Natal, e o vocalista Felipe Chehuan sabe muito bem comandar a massa. Em “Abolição”, por exemplo, ele garante a diversão ao transformar a turma do gargarejo em front de combate. Um showzaço que só reforça a vocação do grupo para conquistar novos adeptos, nesta que foi apenas a segunda vinda a Natal.

O heavy metal não foi citado só pelo Confronto, mas suas mil e uma ramificações vieram ao DoSol na tarde de ontem, arrastando um diverso público cuja soma deve ter superado os três mil pagantes. Desde o hard rock de coreografias ensaiadas e trejeitos repetitivos do Comando Etílico, passando pelo retorno do metal tradicional do Deadly Fate e pela modernidade pesada do goianiense Mugo, até chegar no metal extremo do paulistano “Nervochaos”, que toca sem a presença de Deus, havia de tudo um pouco no domingo de sol. Buscando algo de diferente, Natal tem as parentes Calistoga e Distro, ambas descendentes de um ancestral emocore, mas que não querem carregar a herança maldita.

A primeira apresenta a performance à Incubus, acrescida de roupas cheias de pulgas que fazem todos pular de modo desconexo, sem parar. O grupo precisa urgentemente rever seus conceitos – e se ver no espelho – de modo a aprender a hora de dar um passo atrás para acertar dois adiante. Já o Distro, rico pela presença de dois guitarristas/vocalistas, achou seu caminho. As passagens de guitarra e as composições do grupo são boas, e só tendem a melhorar com o tempo. Para o show ficar bom, só falta parar com esse negócio de ficar afinando guitarra entre todas as músicas.

Na série banda nova que tende a crescer, as locais I.T.E.P. (hardcore com metal), Fliperama (bubblegum) e Dr. Carnage (“estilo brucutu”) encaram o desafio de tocar para quase ninguém como abertura num festival de renome nacional. Até o norueguês Pulverhund, que tem na bateria um brasileiro torcedor do Corinthians, fez bem a sua parte depois de cair de pára quedas na Ribeira. A banda pode não ser essa coca-cola toda, mas ao menos o baixista/vocalista é a cara do líder do Queens Of The Stone Age, Josh Homme.

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Na noite anterior ...

Começou ontem, em Natal, no Rio Grande do Norte, a sexta edição do Festival DoSol. Realizado pela terceira vez utilizando simultaneamente o Centro Cutural DoSol e o Armazém Hall, tendo como área comum parte do Largo da Rua Chile, o evento reuniu cerca de 3 mil pessoas, entre 15h30 e 4h da madrugada de domingo. Ao todo, se apresentaram 17 bandas, nos dois palcos. Embora o canadense Danko Jones tenha causado grande expectativa, coube o Retrofoguetes, de Salvador, fazer o melhor espetáculo da noite, que levantou o público do palco Armazém Hall, destinado às bandas principais - o grupo já havia se apresentado no DoSol em 2005.

Havia sido uma tarde problemática nos dois palcos. Mais cedo, um dos bateristas do Vendo 147 teve dificuldades para segurar parte de sua bateria, que se deslocava de acordo com a vibração do palco. O grupo faz um instrumental pesado com dois bateristas tocando num kit siamês, um de frente para o outro. Foi, até então, a melhor apresentação do festival, que citou o tema do personagem “Vingador”, do seriado “A Caverna do Dragão”, e encerrou com um pout pourri excepcional, que incluiu trechos turbinados de clássicos do Black Sabbath, AC/DC, Led Zeppelin, Jimi Hendrix e Metallica.

O som também castigou o público no show do local Rejects, cujo volume, altíssimo, não encontrou equalização adequada e atrapalhou a performance pesada do grupo. O trio traça um crossover moderno de metal lento, pesado e arrastado, com o grunge de Seattle. Embora seja revelação da cena local, não cativou a quantidade de público que se esperava. No outro palco, a psicodelia do ótimo Plástico Lunar também foi prejudicada pela ausência dos teclados, ocultos no som que chegava a público, e com o projeto solitário O Melda, Claudão Pilha não conseguiu se fazer ouvir como havia planejado, usando o capacete crivado de anéis metálicos.

Foi nesse cenário que o Retrofoguetes, dessa vez trajando macacões brancos, mudou a história da primeira noite do festival. Acompanhado por um ténico de som experiente, o combo instrumental já entrou no palco com pompa e circunstância. De início, o som quase cristalino da guitarra de Morotó Slim causou espanto, mas aos poucos a platéia, inicialmente comtemplativa, passou a aplaudir o grupo compulsivamente, sobretudo depois da adesão a outros ritmos que não a surf music de raiz, incluindo até uma versão impagável para o antigo tema da entrada de jurados do programa de calouros de Silvio Santos. É de se estranhar, inclusive, que o nome de Morotó não apareça entre os maiores guitarristas brasileiros em todos os tempos.

Dentre os nacionais, o grupo baiano foi o que reuniu um maior público, entre o translado de um palco a outro, incluindo a área aberta onde funcionava uma feirinha com vários lançamentos de selos independentes à disposição do público. Por pouco o trio não roubou a cena do canadense Danko Jones, que soube muito bem se afirmar como atração principal, aproveitando a boa qualidade do som, o tempo para apresentação, maior que os demais participantes, e a disposição do público em receber um artista pouco conhecido no Brasil, quiçá em Natal. Falando muito entre uma música e outra, o guitarrista (que dá nome à banda) disse estar orgulho de estar pela primeira vez no Brasil, e de o País ser o primeiro da América do Sul que ele visita.

Fazendo um hard rock moderno, nervoso e cheio de riffs, não tardou para o grupo arrancar aplausos do público, que acompanhava cada pedido de palmas do baixista. Em cerca de uma hora de show, o guitarrista instigou os natalenses a pensar sobre política, sexo e se eles realmente gostam de rock. Ao final, numa homenagem ao conterrâneo Rush, um trecho de “YYZ”, a instrumental mais cantarolada do mundo, foi levada num volume altíssimo, e ainda rolou tempo para um bis solitário.

Outro show que entra facilmente no rol dos melhores do festival é o do paranaense Sick Sick Sinners, que levou vantagem por tocar no palco DoSol. Com o local abarrotado, o psychobilly do grupo converteu os fãs de hardcore ao gênero, que se divertiram a valer em sucessivos moshes, rodas de pogo e stage dives. Tanto que nem perceberam os constantes problemas com o som que culminaram no corte de um dos vocais. A combinação da guitarra semi-acústica com o baixo acústico, tocado em alta velocidade, acrescenta muito ao som do grupo.

Duas bandas de Natal, já conhecidas de outras festivais, foram bem. O Bugs, como quarteto, ficou bem mais pesado que antes, e as músicas do novo EP prometem. O Bonnies também tocou para um bom público no palco DoSol, mostrando uma empatia trazida por mais experiência de palco. O Cassim & Barbária, de Floripa, reúne integrantes de outras bandas da cidade, e precisa definir melhor qe tipo de som quer fazer, já que o show apresenta tantas variações que é claro, positivamente, a falta de um rumo. Mais que isso, o The Baggios, grupo do guitarrista do Plástico Lunar, deve complementar a formação antes de agendar o próximo show.

BARULHINHO RUIM

Nessa edição a produção do festival apostou num público mais, digamos “adulto”, e para isso escalou uma espécie de prorrogação com artistas de gosto questionável. Assim, os palcos praticamente se transformaram em pistas de dança de salão e o chamado “Barulhinho Bom”, se eventualmente atraiu mais público, acabou saindo pela culatra, ao distoar (em princípio) dos objetivos de um festival como o DoSol. Exceção honrosa se faça ao Eddie, de Olinda, cuja credibilidade supera com facilidade tais circunstâncias.

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