Abaixo, um texto de André Barcinski sobre o filme, publicado originalmente em seu blog:
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Tente esquecer os cabeludos tocando Raul em barzinhos e os sósias dando abraços coletivos e cantando sobre a sociedade alternativa. Isso é engraçado, mas não faz justiça ao sujeito. Se você conseguir enxergar por trás do folclore, vai perceber que até as canções mais batidas de Raul – “Metamorfose Ambulante”, “Maluco Beleza” e “Tente outra Vez”- são obras-primas.
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Raul fez a fusão da música brasileira e do rock’n’roll como ninguém. Foi a ponte entre Luiz Gonzaga e Elvis, com pedágios em Bob Dylan e Jackson do Pandeiro. Mas nunca soou folclórico ou falso. Raul fez música autenticamente brasileira, incorporando a guitarra elétrica de uma forma original e sofisticada. E sempre com a preocupação de ser popular.
Não consigo pensar em um artista brasileiro que tenha feitos discos tão variados. Pegue um LP qualquer de Raul – “Gita” (1974), por exemplo: tem rock (“Super-Heróis”), balada caipira (“Medo da Chuva”), repente (“As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor”), folk pastoral (“Água Viva”), um jazz-bossa-lounge (“Moleque Maravilhoso”) e um bolero (“Sessão das dez”). E isso é só o lado A!
Adoro a fase mística de Raul. A sequência de “Krig-ha Bandolo!” (1973), “Gita” (1974), “Novo Aeon” (1975) e “Há 10 Mil Anos Atrás” (1976) é insuperável. Mas ele fez grandes músicas em quase todos seus discos.
O filme de Walter Carvalho merece ser visto. É um grande registro histórico, com muita música boa e ótimas imagens de arquivo. A entrevista com Paulo Coelho é antológica. O mago fala de sua colaboração com Raul, da ligação de ambos com Aleister Crowley e o ocultismo (“um período negro na minha vida”) e confessa ter apresentado Raul às drogas. Já o papo com Marcelo Nova sobre seus últimos dias da vida também é revelador. Marcelo conta que chegou a pagar a feira do amigo e ídolo. Aliás, Marcelo fez um texto muito bonito sobre Raul para o UOL, que você pode ler aqui.
Outra qualidade do filme é sua independência. Não é um documentário “chapa branca”, desses que escondem os defeitos e conflitos do personagem. Mostra as relações traumáticas de Raul com suas mulheres e filhas e seus problemas com álcool e drogas. Sylvio Passos, amigo e presidente do fã-clube de Raul, conta que o maluco beleza andava com um galão de cinco litros de éter debaixo do braço, cheirando constantemente.
Espero que o documentário ajude uma nova geração a descobrir a música de Raul Seixas, sem aquela velha opinião formada sobre tudo.
Ele merece.
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