segunda-feira, 28 de abril de 2014

Paulo André, uma entrevista ...

Enquanto não me sobra tempo - e disposição, já que é bastante cansativa a viagem daqui ao Recife de carro por uma BR 101 eternamente em obras pra ver uma infinidade de bandas tocando numa mesma noite - para fazer minha tradicional resenha do Festival Abril pro rock, deixo-os com a reprodução de uma entrevista com Paulo André, o produtor, conduzida por Diego Albuquerque e publicada originalmente no Altnewspaper ...

O que mudou no “Fazer” o Abril Pro Rock na década de 90 e neste novo século?

Paulo Andre: Mais fácil dizer o que não mudou. Os gargalos são os mesmos, comunicação pública mofada, atrasada, não apoia o surgimento de novos artistas, promovendo-os, tocando. Ausência de um circuito forte e organizado de clubes, que ainda são restritos ao sul/sudeste. Estou falando da nossa realidade, da nossa região. Há tempos não faz sentido trazer grandes bandas dos 80 e 90 pro APR, salvo alguns casos. Tivemos elas em outros tempos, outro contexto. Nem queremos ficar refém de bandas grandes que podem dar prejuízo. O Motorhead so não foi prejuízo porque tínhamos os patrocinadores, tomamos a decisão de não mais ficar refém de uma única banda, mas dividir o bolo e compor uma noite.

A comunicação mudou, ficou mais interativo com o público, mas a realidade do cenário, a dificuldade pra novos artistas na região, parece até ter encolhido, nos 90/00 tinha a Mtv aberta, mais revistas, mais selos. Mudou do cassete pro Soundcloud, já nem é mais MySpace, mas não mudou nossa proposta, de apostar no novo.

Temos cinco bandas internacionais que nunca tocaram na região, três delas inéditas no Brasil, não tenho certeza se o Obituary tocou no MOA. Só Autoramas (1 vez), Tulipa Ruiz (1 vez), Mukeka (2 vezes), e Desalma (1 vez), tocaram em 21 edições (do Abril Pro Rock). Além de novos nomes como Daniel Groove, Bárbara Eugênia, Felipe Cordeiro, Joanatan Richard, Trummer SSA, a galera da Cena Beto, Krow, Johnny Hooker tocou, mas agora é solo. 

A curadoria do Abril Pro Rock nos últimos anos sempre tomou cuidado em trazer bandas que funcionem ao vivo. Ou seja, que o show seja legal. Essa premissa se mantém?! Qual das atrações fez o show mais legal ao vivo, que garantiu eles no APR?

PA: Sim, eu fiz turnê com o Felipe Cordeiro, em Roskilde, ele colocou uma tenda com 4/5 mil pessoas pra dançar, ninguém entendia uma palavra do que ele cantava, mas reagia muito bem a música. Não queríamos mais um show do Autoramas no APR, encontrei eles e fiz a proposta, de convidarem o Renato pra fazer algo juntos. José Teles há tempos me dizia que deveríamos trazê-lo, como já fizemos com Tom Zé, Paulo Diniz, Lula Côrtes, Jacinto Silva, os clássicos.

Acompanhei de perto a Cena beto, sempre fui nos Desbunde Elétrico, acompanhei tão de perto, como acompanhei nos 90 a cena daqui. Acredito muito no potencial deles e na contribuição a cena musical da cidade. Gostamos muito do disco da Trummer SSA, será a estréia deles na cidade. Sebadoh é nossa aposta gringa da sexta. Tulipa tem um bom show, vi em Berlin, ano passado, ela não toca aqui desde o Rec Beat 2013. Barbara eu já queria ter trazido, acredito no potencial dela.

Antes mesmo de saber que a banda continuaria, nem o nome deles, eu liguei para o produtor de Reginaldo (Rossi), aí ele disse que os caras iam fazer o primeiro show sem Reginaldo Rossi e que se chamariam The Rossi, aí eles toparam reproduzir o tributo ao vivo, com convidados não só do cd, mas com novos nomes, afinal é nossa aposta é sempre no novo.

A maioria dos pernambucanos nem sabe quem é Johnny Hooker, mas essa situação mudará rapidamente em um mês, quando estréia a novela que ela protagoniza. Acreditamos nele há tempos, mas depois de Tatuagem, da música “Volta”, desse momento além música dele, tínhamos que convidá-lo, dar um horário melhor pra ele, que abriu em 2009, quando tocou como vencedor do Microfonia, com o Candeias Rock City.

Quando você começou o APR, pensava em durar tanto tempo?! E o que o festival precisa fazer para continuar existindo em alto estilo daqui pra frente?

PA: Cara, no início, não me interessava saber o que aconteceria no futuro, eu queria fazer algo pela cidade, pelas bandas, eu acompanhava tudo de perto e, achava que caberia juntar 12 bandas em um dia. Fui movido pelo incômodo, me incomodava a quantidade de bandas boas, tocando pra 200 pessoas no máximo, nos inferninhos, festas, Soparia e Galeria Joana D’Arc.

Mas, sou muito agradecido ao cantor de axé Ricardo Chaves, ele me fez testemunhar uma cena que me deu todo o gás pra querer fazer algo pela cidade e sua cena musical, eu explico: nos anos 90, havia um pré Carnaval na Av. Boa Viagem, 20 trios elétricos desfilavam na Avenida, de Pernambuco tinha Banda Pinguim, Versão Brasileira, André Rio e o axé chegando com tudo na cidade. Ricardo Chaves, não tinha carisma nenhum, cara de almofadinha, mas tinha um hit “vou te devorar crocodilo eu sou…”. Quando a porra do trio dele passava, eu via uma avenida inteira, bater os dois braços imitando a boca do jacaré e aquele som Tcha, tcha, me fodia! Eu achava deprimente, ver gente de todas as idades numa coreografia coletiva infantil. Até hoje, eu agradeço ter visto e vivido aquilo, me provocou. Eu pensei, não pode ser só isso.

Em mais de 2 décadas vimos muita coisa mudar, do cassete ao Soundcloud e Youtube, seguiremos antenados com o que rola no mundo, mas depositamos a esperança de um dia ter uma rádio pública, sintonizada com o tempo e o espaço em que vivemos, que possa tocar as bandas antes do Festival, pra que mais gente possa ouvir, conhecer, não pra vender mais ingressos, mas pra marcar melhor essa ignorada nova música brasileira. Nunca gozamos disso, enquanto outras cidades tem uma boa rádio, mas não tem um festival, que tenha repercussão nacional como o APR.

Ano passado, fui pro El Mapa de Todos, e publiquei um comentário, que pra mim, festival bom é quando a gente não conhece a maioria das bandas, ou conhece, mas nunca viu o show ao vivo. É isso que nos move, trazer bandas que de outra forma não viriam pra cá, como tantas que já passaram pelo APR, de pequeno, médio e grande porte, e que nunca mais voltaram na região nordeste.

O dia do rock pesado do APR, foi se desenhando ao longo dos anos, e ficou muito forte nos últimos anos. Mesclamos punk, metal, hardcore, com bandas novas, e nomes clássicos desses gêneros. São quatro bandas gringas inéditas no sábado, sendo duas inéditas no Brasil, só Obituary e Conquest for Death tocaram antes. A Krow de Minas Gerais já faz turnês internacionais, é uma promessa do metal brasileiro com carreira internacional. A Mukeka di Rato é uma instituição underground brasileira, assim como o RDP (Ratos de Porão), enquanto existir, os traremos. Há tempos queríamos o Olho Seco, antes tarde do que nunca.

Tentamos outra clássica, a Dorsal Atlântica, mas não rolou, quem sabe um dia. Chakal é uma banda clássica, da geração do Sepultura, conheço Wladimir Korg há tempos, também sou um grande fã da outra banda dele, The Mist. Chakal tocaram aqui nos anos 80, nunca voltaram, vai ser foda, o Korg é uma lenda do metal nacional. Hibria nunca veio pro Nordeste, e tem as apostas Dune Hill e Monster Coyote. Além da experiência Desalma com Bongar, o Bongar ao vivo é tão pesado percussivamente, quanto qualquer banda desse dia, uma porrada, merecem muito.

Eu acho que 30 a 40% do público do dia pesado, é de outras cidades do Nordeste. Já contabilizamos caravanas de 10 cidades diferentes, incluindo as distantes Aracaju e Paulo Afonso. 

Qual show você ta ansioso/curioso pra ver na sexta e no sábado? Quem bandas as pessoas precisam ver ao vivo?

PA: Pra mim, todos valem a pena, mas festival é isso, as pessoas se identificam mais com umas, menos com outras bandas, e é sempre uma boa oportunidade de fazer um bom show e ganhar público. Festival não é lugar pra lançar disco, nem pra experimentar, é pra fazer um show bom e deixar o gostinho de quero mais. Afinal, o que fizemos sempre foi apostar, e agente nunca pode dizer quando vai rolar um show histórico no APR, pra saber tem que apostar. 

E no sábado, quem você acha que pode surpreender o público?

PA: as bandas gringas do sábado devem fazer shows foda, porque todo mundo quer tocar no Brasil, Obituary é clássico, as outras três são relativamente novas, duas inéditas no Brasil. Das bandas do sábado, só vi ao vivo, Mukeka e Desalma. 

Tem mais alguma banda que vocês tentaram pra esse ano e bateu na trave? Quem sabe na próxima?

PA: Death, eu queria muito trazer, mas não rolou, continuarei tentando. Queria muito trazer esse show da Karina cantando Secos & Molhados. Tentei a Nação Zumbi, mas eles iam fazer carnaval aberto ao público e depois do carnaval já tinham um show fechado pro Recife. 

Valeu pela disponibilidade e pelo papo Paulo. Tem alguma coisa que tu quer dizer e eu não perguntei?

PA: Só se eu fiquei rico, mas é melhor deixar pra lá pra não frustrar o sonho de jovens produtores.

#



Nenhum comentário:

Postar um comentário