Terminou em torno das 22h de ontem (1/4) a exibição do espetáculo “The Wall”, de Roger Waters, em São Paulo. Cerca de 70 mil pessoas foram ao Estádio do Morumbi e viram o ex-baixista do Pink Floyd recontar a história do álbum de mesmo nome, lançado em 1979. Foi o maior público der toda a turnê, que percorre a América Latina a cerca de um mês; só na Argentina foram nove apresentações.
No espetáculo roteirizado, Waters voltou a falar com o público em português, para homenagear o brasileiro Jean Charles de Menezes, morto pela polícia de Londres ao ser confundido com um terrorista em 2005. O músico também agradece ao coral de crianças da comundade de Heliópolis, que participa na música “Another Brick In The Wall Part 2″, grande sucesso radiofônico do álbum “The Wall”.
O espetáculo tem a duração de aproximadamente duas horas e vinte minutos, sendo que cada uma das partes é a íntegra de um dos LPs lançados originalmente em “The Wall”, divididas por um intervalo. O grand finale é a explosão do muro que é contruído durante o show - os músicos chegam a ficar com completamente encobertos pela estrutura gigantesca, montada com materia reciclável.
O show começou com 15 minutos de atraso, menos do que em Porto Alegre e Rio de Janeiro (clique nos links para ver como foi), onde o público teve que esperar meia hora para o início do espetáculo. Apesar da grande quantidade de fãs, não houve registros de problemas no acesso ao Morumbi, muito embora o trânsito fosse intenso na região.
Agora, o espetáculo “The Wall” tem uma segunda exibição no mesmo Morumbi, amanhã (3/4), quando Roger Waters se despede do Brasil, com o gramado configurado com cadeiras, o que deve atrair um público de “apenas” 50 mil pessoas. Ainda há ingressos; saiba tudo aqui. Depois do Brasil, a turnê e “The Wall” prossegue pelo México e Estados Unidos, começando pelo dia 27 de abril.
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Da decepção veio a grandiosidade. O baixista e mente criativa do Pink Floyd Roger Waters estava incomodado. A frustração crescia. Em uma apresentação no Olympic Stadium, no Canadá, durante a turnê In The Flesh, baseada em Animals (1977), irritou-se com um grupo barulhento posicionado em frente ao palco. Foi a gota d’água. Na ocasião, pensou em criar um muro que separasse banda e público. Era o embrião do conceito que se tornou, dois anos depois, no disco duplo The Wall.
Toda a concepção artística do álbum foi transportada para o palco. Há três décadas, só era possível realizá-lo em locais fechados. Com avanços na tecnologia e na logística dos megashows em estádios, o lendário álbum ganha o mundo em uma impressionante versão para arenas. Os 120 mil fãs presentes no estádio do Morumbi, em duas noites (70 mil ontem e 50 mil, sentados, na terça-feira), saberão por que tudo é grandioso.
Quando se fala de Roger Waters, cujo ego é quase tão grande quanto a fama de sua ex-banda, nada pode ser pequeno ou inexpressivo. Muito menos um concerto baseado no seu ambicioso álbum que, a princípio, era apoiado em sua própria vivência. Aí está genialidade toda. Uma obra quase autobiográfica, lançada há mais de 30 anos, consegue ser atual, tratar temas tão presentes nos dias de hoje. Distanciamento, solidão e opressão.
O próprio Waters percebe que o álbum é muito mais abrangente do que um mero autorretrato depressivo criado aos 34 anos. The Wall ganhou força e fôlego com o passar do tempo. Como as grandes obras de arte, o disco saiu do controle do seu criador e correu o mundo, atingiu de líderes de nações a pessoas comuns. Transcendeu o tempo.
O álbum ajudou a consolidar o fenômeno chamado Pink Floyd. Uma das maiores bandas de rock de todos os tempos, o grupo inglês transformou o rock progressivo, consolidou as bases do que hoje conhecemos por ópera rock e aliou letras politizadas a outras psicodélicas, criadas a partir dos delírios de Waters, Sid Barrett (vocalista, que saiu da banda em 1968), David Gilmour (voz e guitarra), Nick Manson (bateria) e Richard Wright (teclado).
Legado permanente - Os números dizem tudo. São mais de 200 milhões de discos vendidos ao redor do mundo, desde The Piper at the Gates of Dawn, lançado em 1967, até o último trabalho do grupo, já sem Waters, The Division Bell, de 1994. The Wall faz parte da fase mais frutífera e genial do grupo. É antecedido pelos igualmente clássicos The Dark Side of the Moon (1973), Wish You Were Here (1975) e Animals (1977). Ele, sozinho, vendeu 25 milhões de cópias – ainda assim, metade do que rendeu o poderoso Dark Side of the Moon. Seu sucesso não é tão comercial, mas, sim, de um grande disco conceitual.
Assim como fez com o catálogo dos Beatles, a gravadora EMI relança, desde o ano passado, toda a discografia do Pink Floyd remasterizada, em edições que abrangem desde discos vendidos separadamente, a chamada edição Discovery (R$ 39,90 cada disco), a outras mais ousadas, como a linha Experience (R$ 89,90), com CD extra e livreto, até caixas luxuosas que incluem pôsteres, fotos, gravações recém-descobertas, versões inéditas de clássicos, CD e DVD, de nome Immersion (R$ 535,90).
Teatro roqueiro - Dada a importância do Pink Floyd e do seu The Wall, o espetáculo que se verá no Morumbi não poderia ganhar outro adjetivo: é majestoso. Assim como U2 e sua turnê 360º, que passou pelo estádio no ano passado, a produção trabalha em dois palcos simultaneamente. Enquanto era realizada a apresentação da quinta-feira no Rio de Janeiro, no Engenhão, o Morumbi era preparado. São seis dias de trabalho para cada show e cada dia da turnê custa R$ 365 mil. Tudo para fazer com que o conceito bolado por Waters, naquela apresentação em 1977, seja colocado em prática. Megalomaníaco como os políticos e ditadores que ele tanto critica, o baixista constrói um muro durante o show. São 424 tijolos de papelão, que formam uma verdadeira muralha de 11 metros de altura. Durante a apresentação, o muro é usado como um telão e é destruído por um avião.
O repertório do show é baseado no disco homônimo. Waters executa as 26 faixas. Talvez você só conheça Another Brick in the Wall Part 2, Hey You e Comfortably Numb, mas ainda assim, é difícil desgrudar os olhos de toda a estrutura montada. O baixista sabe montar um show. E, numa irônica contradição, a muralha construída por Waters para se afastar das pessoas faz com que elas queiram estar ainda mais próximas dele.
por Pedro Antunes e Felipe Branco Cruz
Fonte: Combate rock
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