terça-feira, 13 de abril de 2010

Nota de Falecimento




Rafael Jr ( Via E-mail) : " Meus caros, é com pesar que informo sobre o falecimento do ex-guitarrista da Snooze Daniel Garcia, da primeira formação. Ontem a noite, de ataque cardíaco fulminante, durante um jogo de futebol, em SP.

Estamos arrasados, era uma pessoa especial e querida.

Autor de vários hits da primeira demo e do primeiro CD, ainda chegou a colaborar um pouco nos CDs "Let My Head Blow Up" (2002) e "Snooze" (2006). Morava em Campinas/SP há cerca de 10 anos e trabalhava na área de informática, campo que desde cedo mostrou dominar muito bem.

O corpo chega a Aracaju na quarta a noite, o enterro provavelmente será na quinta.
Rest in Peace, brô! "

Rafael Jr.



------------

Fabio Snoozer ( Em comentário dia 14 de abril de 2010 às 17:54 no Blog "zinismo" ) : " Acabei de chegar do enterro.. muitos amigos, saindo de vários cantos do Brasil. Um irmão muito querido e amado por todos. Eu e rafael falamos à mãe de daniel, D. Leônia, como ele tem sido lembrado no meio rocker. tá todo mundo muito chocado, mas por aqui temos certeza de que ele está muito bem, pois sua luz é grande, uma grandeza que não acaba em um corpo. "

paz e bem
fabinho

----------------

Daniel Garcia, num relato pessoal

Por Marcelo Viegas

Fonte: Zinismo

Minha relação com a banda sergipana Snooze é notória. Conheço esses cabras há pelo menos 15 anos, desde a época da primeira demo-tape, aquela dos olhos cansados. Escrevi sobre eles em zines e revistas, coloquei músicas deles nas coletâneas 100trifuga e 100% Stereo, lancei dois discos (“waking up...waking down” e “let my head blow up”) pela sHort, organizei a primeira tour em SP, etc. Parceria forte. Eles sempre fizeram por merecer.

De entusiasta passei a amigo. Foi em dezembro de 1997, depois de uma longa viagem de ônibus, que finalmente conheci pessoalmente meu brother Rafael Jr, que me esperava na rodoviária da cidade. Tive o privilégio de assistir um show do Snooze pela primeira vez em Aracaju, terra natal dos caras. Foi a primeira de muitas visitas à capital sergipana. Sempre fui recebido de braços abertos, assim como meus amigos que viajaram comigo. Fiz muitos amigos por lá, e essas amizades permanecem até hoje.

Daniel Garcia, o guitarrista da formação original, sempre se mostrou o mais “na dele” dos três. Inclusive mais reservado do que o tímido Fabinho. Seu jeito tranquilo também o acompanhava no palco. Sem firulas ou exibicionismo, Daniel deixava que a música falasse mais alto. E ela falava. Suas guitarras ora limpas, ora no limite da distorção, estão eternizadas no primeiro álbum da banda. Tenho muito orgulho de ter lançado esse disco.

O primeiro show do Snooze em SP, no extinto Planeta Rock, em SBC, aconteceu numa fria noite de outubro de 1998. Era o lançamento do “Waking Up...Waking Down” no Sul maravilha. Acostumado com o calor do Sergipe, Daniel cometeu o erro de vir à Sampa sem uma blusa na mala. Batendo os dentes, me pediu uma emprestada. É com essa blusa que ele aparece nas fotos p&b desse show, feitas pelo então principiante Marcelo Ribeiro.

Algum tempo depois, Daniel mudou para Campinas (SP) para estudar e, assim, encerrou sua história como guitarrista do Snooze. Mas sua voz, guitarra e letras estão lá, nos primeiros registros da banda, ad infinitum.

Por conta desse meu histórico com o Snooze, foi com muita tristeza que recebi a notícia do seu falecimento. Não consigo evitar a lembrança que, em menos de um ano, Daniel é o terceiro nome da cena independente dos anos 90 que nos deixa. Em maio de 2009 morreu Fábio L., do Second Come, e em junho de 2009 faleceu Carlos Véio, do Concreteness.

Nossa geração, que sedimentou o terreno da cena indie nacional, começa a perder alguns nomes que participaram desse processo. Assim, aqui fica a minha lembrança e homenagem, para que essas pessoas e histórias não caiam no esquecimento.

RIP, Daniel Snoozer!

-----

Adolfo Sá em Viva La Brasa (o link vocês já devem saber de cor)

Esta semana perdi um amigo do mesmo jeito que perdi um irmão há 2 anos: infarte fulminante. Nando, meu irmão, tinha 29 anos quando morreu. Daniel Garcia estava c/ 34. Aconteceu na noite de segunda, durante um jogo de futebol em SP. Daniel foi meu colega de sala no Colégio de Aplicação durante o 2º grau. Filho da professora de literatura, ‘Sha-La-La’ era um cabra namorador. Só lá na escola beijou a Danielle, a Gabriela, a Isabela, todas elas... Seus olhos verdes e estatura de modelo faziam sucesso c/ a mulherada.

O gosto pelo rock logo nos uniu. Todos nós éramos cabeludos naquele tempo, ouvíamos Sepultura e Nirvana. O apelido dele vem de um refrão dos Ramones, da música ‘Howling at the Moon’ do disco TOO TOUGH TO DIE: “Winter turns to summer/ Sadness turns to fun/ Keep the faith baby/ You broke the rules and won/ Sha-la-la-la/ Sha-la-la-la-la”... Foi a 2ª música que aprendeu a tocar. A 1ª foi ‘Terezinha de Jesus’, hahaha... Ensaiamos juntos em garagens, só de chinfra, e logo ele estava tocando na Outshine, banda que daria origem a uma outra que está aí até hoje: Daniel foi o 1º guitarrista da Snooze. São dele os riffs e solos do disco de estréia, WAKING UP... WAKING DOWN, de 1997.

“Sem firulas ou exibicionismo, Daniel deixava que a música falasse mais alto. E ela falava. Suas guitarras ora limpas, ora no limite da distorção, estão eternizadas no primeiro álbum da banda. Tenho orgulho de ter lançado este disco”, diz Marcelo Viegas da Short Records, gravadora independente que lançou 2 discos da Snooze. “Autor de vários hits da primeira demo e do primeiro CD, ainda chegou a colaborar um pouco nos CDs LET MY HEAD BLOW UP (2002) e SNOOZE (2006)”, lembra Rafael Jr., baterista da banda, irmão do vocalista Fabinho e amigo em comum. O trio que Sha-La-La formava c/ os irmãos ‘Snoozers’ tinha influências de Pixies, Sonic Youth e Hüsker Dü.

Eu e Rafael fizemos muitas sessões de surf no início dos anos 90, e juntos editamos o fanzine Cabrunco de 95 a 97. Daniel ‘Sha-La-La’ foi o diagramador das 4 primeiras edições do zine – até eu ganhar meu 1º micro. Ele me ensinou a usar o Corel-Draw. Inteligente e filho de um intelectual de esquerda, sempre teve contato c/ computadores e ganhou grana c/ isso. Aracaju ficou pequena demais. “Morava em Campinas há cerca de 10 anos e trabalhava na área de informática, campo que desde cedo mostrou dominar muito bem”, escreveu Rafael na nota de falecimento. “Estamos arrasados, era uma pessoa querida e especial.”

Daniel era um cara saudável, não bebia, não fumava, não cheirava; gostava de jogar bola, tocar guitarra e namorar. “A cada férias que ele vinha passar aqui, trazia uma mulher diferente. Ano passado foi uma loira, a atual é morena...”, analisa Rafael: “Acho que depois de 1 ano ele enjoava e trocava!” Haha!.. Grande figura, amigo firmeza. Espero que seus pais e irmãos segurem a onda – seu Roberto, dona Leônia, Beatriz, Marieze e meu mano Cláudio ‘Salsicha’ [sósia do Shaggy do Scooby-Doo]...

Conheço o sentimento de perder um ente querido sem mais nem menos. Mas a dor passa, os momentos compartilhados ficam guardados na lembrança. Pra sempre.

------

Maíra Ezequiel
Muito Má

Lendo todos os relatos sobre o Daniel e as homenagens feitas pelos amigos, senti que faltava a minha parte. Resolvi que compartilhar minha história com Daniel, com quem possa se interessar, talvez me ajudasse a superar a tristeza profunda que sinto agora e que me impede de tocar a vida com a mesma fluidez de antes.

Foi no dia 24 de julho de 1996, num fim de show da extinta Mosaico, um domingo a noite, no extinto Tequila Café, que eu passei pelo Fabinho, voltei e falei: "Oi, você é o cara da Snooze, né?".

Eu estava com a Daniela e o Fabinho, com o Daniel. Nessa noite mesmo, já voltamos pra casa da minha tia no carro com os meninos. Antes, porém, bebemos juntos até o bar nos expulsar e, não satisfeitos, compramos um vinho barato e ficamos falando besteira dentro do carro até de manhã. Por pelo menos um ano, não conseguimos nos desgrudar mais.

Ainda morava em Maceió nessa época. Então começamos uma rotina louca de num fim de semana a gente vinha, no outro eles iam lá. Viramos um quarteto inseparável. Eu ficava com Daniel e a Dani ficava com Fabinho. Só beijinhos. Mas uma regra silenciosa proibia que qualquer um assumisse que estava namorando. O mais importante era a união dos quatro.

Nossa amizade tinha uma pureza muito grande. Não era nada do tipo "sexo, drogas e rock'n'roll", apesar deles serem "os caras daquela banda de rock". A gente gostava mesmo era de falar besteira. Ríamos muito. Nos amávamos intensamente e só queríamos estar juntos. Cada vez que tínhamos que nos despedir era um sofrimento.

Era o início da nossa independência, fase de ouro que tive o privilégio de compartilhar com Daniel, Fabinho e Daniela. Fizemos viagens loucas pra Recife e Salvador, só como desculpa pra passar mais tempo juntos.

Essa em Salvador é antológica. Tocamos o terror num bar, também extinto, que tinha o sugestivo nome de 'Vicious'. O dono era o Messias, na época ainda vocalista da brincando de deus e já amigo dos meninos. Muito foda aquele bar. Aquela noite foi inesquecível.

A de Recife Fabinho não foi - e ficou arrasado por isso. Daniel encarou 8 horas de ônibus só pra passar um fim de semana com a gente, na roubada. Ficamos os três num mesmo quarto de hotel. Levamos uma bronca da recepcionista por isso, mas nem ligamos. Não teve nenhuma orgia. Só enchemos a cara e rimos muito. Muito mesmo. Com todo tipo de bobagem que nos vinha a cabeça. Saímos uma noite, só pra sair mesmo. Fomos num show do Kid Abelha no (também) extinto Circo Maluco Beleza. Mas a gente nem ligou pro show, especialmente depois que Daniel fez um comentário infeliz sobre as pernas da Paula Toller (humpf!). Conversamos, bebemos muito e rimos alto.

Quando eles iam pra Maceió ficavam na minha casa. Eu ainda não sabia dirigir. Numa dessas vezes, Daniel, com aquela cara de bom moço, conseguiu uma façanha inacreditável: dirigir a caravan do meu pai pra gente sair à noite. Quem conhece o meu pai, e a relação dele com o carro DELE, deve estar agora de queixo no chão.

Quando eu e Dani vínhamos pra Aracaju, ficávamos na casa do Fabinho. O pai do Fabinho era representante dos vinhos Santa Felicidade e a loja era na garagem da casa. E mais: os pais dele não passavam o fim de semana em casa. Era o verdadeiro paraíso. Demos uma boa baixa nos estoques de seu Rafael.

Mas, um dia, Daniel conheceu outras meninas. E, do mesmo jeito que eu tinha roubado ele das amigas dele (Alessandra, Ágatha e Gabi - que naturalmente me detestavam) elas roubaram ele de mim. E, óbvio, eu as detestei. Na verdade, isso eu iria entender só muito tempo depois, Daniel é que era assim: desprendido, aventureiro, nômade. Algum tempo depois, ele foi embora morar em Campinas e também deixou essas meninas pra trás. E lá, deixou outras muitas.

Apesar da distância e da eterna queixa por ter sido abandonada, é óbvio que ele sempre teve um lugar especial na minha vida. Principalmente porque foi depois que ele se afastou que eu comecei verdadeiramente minha história de amor com o Fabinho.

Uma década se passou. Crescemos, amadurecemos e nesses últimos três anos, não teve uma vez sequer que ele viesse por aqui que não desse um jeito de nos ver. Nesse último fim de ano, a visita dele foi bem especial. Ele passou lá em casa numa noite e, dessa vez, ficou claro que estava sem nenhuma pressa pra ir embora. Sentei do lado dele como há muito tempo não fazia e, por diversas vezes, olhei pra ele, sorri e falei que estava muito feliz por vê-lo.

Na última segunda feira, comecei o dia com minha sessão de terapia. Espontaneamente, passei a sessão inteira contando essa história pra minha psicóloga. As lembranças ficaram vívidas em minha memória ao longo de todo o dia. À noite, Fabinho me deu a notícia triste quando chegou em casa.

Essa vida é estranha.

Nenhum comentário:

Postar um comentário