sexta-feira, 12 de março de 2010

# 139 - 12/03/2010



Fear Factory – Mechanize
Forgotten Boys – you draw the line
Superguidis – Aos meus amigos

Cavalera Conspiracy – Sanctuary
Soulfly – Unleash
Nailbomb – Vai tomar no cu
Sepultura – O Matador

Drop Loaded:

Charme Chulo Ao Vivo no Sala Especial Loaded
• Nova onda Caipira
• Fala comigo Barnabé

Agent Orange – Living in darkness
Fear – I Love living in the city
Chron Gen – Jet Boy, Jet girl
Adolescents – Amoeba
Redd Kross – Annette´s got the hits
Stepmothers – Don´t kill the beat

Nebula – Atomic Ritual
Monster Magnet – Powertrip
Fu Manchu – Knew it all long
Queens Of The Stone Age – In my head
Kyuss – thumb

Discoteca Básica: Pixies – “Doolittle”

• Tame
• Wave of mutilation
• Dead
• Crackty Jones
• Mr. Grieves
• La La Love you
• There goes my gun
• Gouge Away
• No. 13 Baby

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DISCOTECA BÁSICA – (Revista Bizz, Edição 143, junho de 1997)

Pixies - Doolittle (1989)

A confissão de Kurt Cobain bate com o depoimento de outro monstro sagrado, David Bowie: "Fiquei puto quando escutei Nevermind pela primeira vez. A dinâmica das músicas era totalmente roubada dos Pixies!" Essa genial brincadeira não é invenção do cantor e guitarrista Charles Michael Kitteridge Thompson IV. Indubitavelmente, porém, foi o quarteto que ele fundou em Boston, há onze anos, que a elevou ao status de arte pop. Filho de pentecostais, Charles - ou Black Francis, como assinava na época - era um gordinho esquisito que amava Hüsker Dü (outra influência decisiva do Nirvana), ficção científica e a língua espanhola (fez intercâmbio em Porto Rico). Quando se juntou ao guitarrista Joey Santiago (filipino de nascimento), à baixista Kim Deal e ao baterista David Lovering para formar o Pixies, finalmente conseguiu botar pra fora a confusão reprimida que insistia em gargalhar além de seu subconsciente.
Há quem prefira Surfer Rosa, primeiro álbum do grupo, que ajudou a criar o mito do produtor Steve Albini. Mas o segundo, Doolittle, de 1989, tem apelo irresistível. Contrariando o esnobismo underground do selo inglês 4AD, com quem tinham contrato, os Pixies trabalharam com som limpo, estruturas simples, senso melódico apurado (Elton John elogiou) e refrões fortes.
Popular e doentio, quando saiu, Doolittle foi interpretado pelo Melody Maker como um disco que tematizava a inutilidade da linguagem e a repulsa ao corpo. Parece pretensioso, mas faz sentido. E, igualmente importante, é divertidíssimo. O título referiria-se ao Dr. Doolittle, que, quem teve infância sabe, tinha o dom de falar com os animais. Era para ser Whore (Prostituta), mas Francis achou "católico demais, ou bobamente anticatólico". Preferiu o homem que falava com as bestas, conceito que traduz seu estilo adoravelmente demente de cantar, um diálogo com monstros interiores.
Já na primeira faixa, "Debaser", Francis incorpora um freak adolescente urrando de excitação depois de ter assistido ao filme Un Chien Andalou, de Luis Buñuel, e tentando transmiti-la para uma colega. "Garotinha, é tão legal... ha ha ha ho! Fatiando os globos oculares... ha ha ha ho! Não sei de você, mas eu sou ‘un... chien andalousia’! Quero crescer para ser um pervertor." A voz de Kim Deal ecoa Francis ironicamente sexy: "Pervertor!" Em "Hey", os grunhidos e gemidos dos dois fazem sexo animal - a música é mais nirvanesca do que o próprio Nirvana, encaixaria perfeita em In Utero, com as vozes de Kurt e Courtney.
"Tame" começa falando em "lábios de Cinderela", mas em poucos segundos explode num grito psicopata: "Você é tão mansa!" Kim geme, Francis arfa, as guitarras uivam, e todos (inclusive o ouvinte) chegam juntos a um orgasmo sonoro.
Em várias faixas, guitarras surf de Joey e Black prenunciam o revival promovido pelo locadora boy Quentin Tarantino. David Lovering canta um delicioso deboche sixties, "La La Love You". "Monkey Gone To Heaven" tem celos, cordas, backing vocais celestiais de Kim Deal e uma desconcertante equação na letra: primata em desacerto com a natureza + numerologia bíblica = apocalipse.
A poesia de Francis é tão brilhante quanto os desenhos melódicos de sua guitarra: "Beijei sereias, cavalguei o El Niño, andei pela areia com crustáceos, numa onda de mutilação". O produtor Gil Norton chegou a ficar assustado com alguns versos, mas Francis o tranqüilizou: "É tudo bobagem, eles não querem dizer nada, são só sons que eu junto". Pois sim. Confiram a travadíssima "I Bleed": "Alto feito o inferno, um sino toca atrás do meu sorriso, sacode meus dentes e, esse tempo todo, enquanto os vampiros se alimentam, eu sangro".

Pedro Só

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Superguidis lança terceiro disco por Senhor F & Monstro Discos

A banda Superguidis realiza o lançamento nacional de seu terceiro disco neste próximo dia 20 de março, com show em Santa Maria (RS), no Macondo Circus, responsável pelo festival independente mais importante do estado. O álbum traz 11 canções assinadas por Andrio Maquenzi e Lucas Pocamacha (veja abaixo) – Superguidis é Andrio (vocal e guitarra), Lucas (guitarra e vocal), Diogo Macueidi (baixo) e Marco Pecker (bateria). O disco vem assinado pelos selos Senhor F (casa da banda desde a estréia, em 2006) e por Monstro Discos, o maior dos independentes nacionais. A produção é de Philippe Seabra, com mixagem do americano Kyle Kelso e masterização de Gustavo Dreher. A arte é de André Ramos.

O novo disco aponta para a consolidação da banda no cenário independente nacional como uma das mais criativas e produtivas entre as revelações dessa segunda metade da década que passou. Fiel e, de certa forma, parceira na construção da platafaforma independente, a banda gaúcha também tratou a internet como grande aliada. Com isso, tornou-se conhecida nacionalmente, o que abriu as portas do festivais e casas de shows, do que é exemplo a largada da turnê pelo Norte do país, com shows em Manaus, Porto Velho, Ji-Paraná e Vilhena, além de Cuiabá, Goiânia e Brasília.

Além de ter seu disco de estréia figurando em listas de melhores da década, e de ter seu show considerado um dos destaques do rock atual, a banda desenvolveu uma sólida carreira discográfica. Segundo eles, além da circulação, e do constante aprimoramento dos shows, discografia e repertório autoral são fundamentais para afirmar a banda no cenário independente nacional. O disco-bônus contendo show acústico (veja abaixo) realizado em Porto Alegre, em maio passado, é demonstração da quantidade de hits acumulados pelo quarteto. Apenas duas canções, do conterrâneos Prozak, não são de autoria da banda.

Sempre destacada por produzir "indie em português", neste terceiro disco o grupo afirma definitivamente sua linguagem particular, por meio de flashes poéticos e desencanados, identificada com uma visão de mundo do jovem suburbano desses novos tempos. Natural de Guaíba, cidade operária e dormitório de Porto Alegre, a banda traduz de forma universal o cotidiano do jovem que anda de ônibus/metrô, tem a "simplicidade de um tênis furado", faz uma faculdade pelo ProUni, mas que, mesmo com internet discada, corre atrás de informação.

O novo disco também premia as escolhas e estratégias de carreira da banda, que afirma-se no cenário nacional apostando na plataforma independente, sem afastar-se de sua realidade vivencial. A parceria dos selos Senhor F e Monstro Discos, assim como a presença de Fabrício Nobre (Macaco Bong, Black Drawing Chalks & Lucy and The Popsonics) como seu novo agente nacional, fortalecem o potencial de crescimento da banda, que conta com público em todas as regiões do país.

Informações gerais

Contatos

Senhor F Discos/Fernando Rosa – senhorf@senhorf.com.br (51) 97251475.
Monstro Discos/Léo Bigode – leobigode@monstrodiscos.com.br (62) 84064241.
Superguidis/Produção (Ernando Daitx) - ernandodaitx@hotmail.com (51) 92460676 / 97698449
Andrio Maquenzi – andrio@superguidis.com.br
Lucas Pocamacha – lucas@superguidis.com.br
Marco Pecker – marco@superguidis.com.br
Diogo Macueidi – gunies@gmail.com

Shows

Agente & booking: Fabrício Nobre – fabricio_nobre@uol.com.br
Superguidis/Produção & shows para o RS (Ernando Daitx) - ernandodaitx@hotmail.com (51) 92460676 / 97698449



Ficha técnica

Produzido por Philippe Seabra.
Gravado no Estúdio Daybreak, em Brasília.
Mixado por Kyle Kelso, nos Estados Unidos.
Masterizado por Gustavo Dreher.
Arte por André Ramos.
Produção Executiva de Fernando Rosa.

Superguidis (2010)

1 Roger Waters (Lucas Pocamacha)
2 Não fosse o Bom humor (Andrio Maquenzi)
3 Visão Alem do alcance (Andrio Maquenzi)
4 As camisetas (Lucas Pocamacha)
5 Quando se é vidraça (Andrio Maquenzi)
6 Fã-clube adolescente (Andrio Maquenzi)
7 De mudança (Andrio Maquenzi)
8 Casablanca (Lucas Pocamacha)
9 O usual (Lucas Pocamacha)
10 Nova_completa (Lucas Pocamacha)
11 Aos meus amigos (Andrio Maquenzi)

Superguidis – Acústico (bônus)

Acústico no Cultura Rock Club - Maio/2009

1 Piercintagem (Andrio Maquenzi)
2 Fã-clube adolescente (Andrio Maquenzi)
3 Por entre as mãos (Lucas Pocamacha)
4 O véio maximo (Lucas Pocamacha)
5 Mais do que isso (Andrio Maquenzi)
6 Nova_completa (Lucas Pocamacha)
7 Ainda sem nome (Andrio Maquenzi)
8 Discos arranhados (Andrio Maquenzi)
9 O banana (Lucas Pocamacha)
10 O manual de instruções (Lucas Pocamacha)
11 Aos meus amigos (Andrio Maquenzi)
12 As camisetas (Lucas Pocamacha)
13 Romantismo a base da modernidade (Bruno Daitx)
14 Retardado (Bruno Daitx)
15 Mais um dia de cão (Andrio Maquenzi)
16 Nunca vou saber (Lucas Pocamacha)
17 Visão alem do alcance (Andrio Maquenzi)
18 Malevolosidade (Andrio Maquenzi)
19 O coraçãozinho (Lucas Pocamacha)
20 Spiral arco-iris (Andrio Maquenzi)

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Abaixo, a íntegra da primeira matéria e um apanhado de entrevistas com o Sepultura na extinta Revista Bizz - durante muito tempo, a mais importante publicação sobre música do Brasil.

Fonte: CD-Rom Bizz 20 Anos

BRASILIAN * SPEED METAL FOR EXPORT

* NOTA: O título da matéria saiu assim mesmo, com a grafia errada, na revista.

por Sonia Maia

Fonte: Revista Bizz – Ed. 026 – setembro de 1987

Para os leigos - e até para boa parte dos que ouvem heavy metal, mais especificamente fãs de posers - o estilo se resume a um bando de cabeludos barulhentos que adoram o diabo. Já alguns críticos de música dizem que o HM estaria, atualmente, apontando o caminho da salvação para o rock.
O primeiro caso demonstra uma atitude preconceituosa e desinformada que se expressa, por exemplo, na pouca atenção dada às atuais releituras do metal. No caso da crítica, são os eternos sedentos por alguma novidade que resolveram eleger o speed-metal como a grande coisa do momento. Grupos como Metallica, Anthrax e Slayer receberam até a deferência de ocupar a capa do semanário londrino New Musical Express há uns quatro meses. Enquanto a paradoxal comédia entre leigos e exacerbados corre solta, a legião de headbangers atentos prossegue. Pelo menos aqui, o reflexo mais evidente disso é o ativo mercado independente, que sobrevive glorioso, sem perdas ou danos, a não ser o fato de continuar isolado.
"O HM chegou errado e distorcido no Brasil", tenta explicar Max, vocal e guitarra base do Sepultura - uns mineiros prestes a invadir o mercado europeu e americano. "A mensagem que se trabalha lá fora é diferente", continua. "Aqui o pessoal acha que o som é um incentivo à porrada, quando lá fora é um meio de diversão".
Foi neste contexto que os irmãos Max e Igor resolveram pegar na guitarra e bateria em 84. Com os ouvidos ligados em Iron Maiden e Venom e, mais tarde, Kreator, Motorhead, Judas Priest e os agrupamentos punk/metal de bandas como English Dogs, mais uma atenção especial ao hardcore, eles montaram o Sepultura com Paulo, que assumiu o baixo, e Jairo na guitarra solo. Depois de algumas divergências de estilo, Jairo deixa o grupo e o paulista Andreas fixa residência em Belo Horizonte para substituí-lo. Hoje bandas como Kreator, Death e Sacrifice estão ligados no Sepultura.
Mas como esses caras ficaram sabendo da existência destes mineiros? "Não sei quem mandou um disco (Morbid Visions, segundo LP do grupo) para WBCR (rádio nova-iorquina especializada em metal). Logo em seguida estávamos em quinto lugar na parada", diz Max. Daí para a frente foi mero desenrolar natural: cartas e mais cartas de pedidos de camisetas e buttons (todos desenhados por Igor), um primeiro lugar na rádio Overkill do Canadá e o interesse de várias gravadoras em lançar o grupo no exterior. E quem venceu a última concorrência foi o selo alemão Argh!, que lançou, no mês passado, dez mil cópias de Morbid Visions. Em caso de venda total, o Sepultura terá direito a uma turnê européia bancada pela gravadora. Caso isso não ocorra, eles vão por conta própria, "para ganhar experiência de palco e produção", como afirma Max.
A história do grupo se resume a três anos de trabalho constante. Eles ensaiam diariamente, todas as tardes, poupando apenas os domingos. Na administração, um esperto selo independente mineiro: a Cogumelo Discos que, além de ser a ponte de todos estes contatos internacionais, mantém o programa Metal Massacre na única rádio de rock no Brasil que merece o nome: a Liberdade FM de Belo Horizonte.
Fora isso, os garotos - cuja idade oscila entre 16 e 18 anos - se preparam para lançar, ainda este mês, seu terceiro LP, Esquizofrenia. A quem possa interessar, com uma turnê pelas principais capitais brasileiras e interior de São Paulo.
O disco carrega a temática da esquizofrenia, da depressão e do cotidiano de cada um, ligada à rejeição que eles sofrem em seu próprio país. Por isso mesmo todas as letras são em inglês. E, além disso, para que servem os cabelos longos, senão para cobrir a própria face, preservando o espaço vital?

ENTREVISTAS

SEPULTURA - CAOS DESENCANADO

Fonte: Revista Bizz – Ed. 098 – setembro de 1993

O primeiro superlançamento mundial do sepultura, Chaos A.D., tem o peso Tradicional do metal, um que de industrial e Hardcore, uma faixa quase acústica, atitude punk e até um gosto de baião! Entre as Fraldas de Zyon Cavalera e um exército de jornalistas, Ana maria G. de lemos passou um fim de semana comendo churrasco com a banda e conta essa história direto

Sábado, sete da noite num vilarejo no meio do campo inglês. Numa virada típica do verão da ilha, só agora é que o sol saiu, depois de um dia cinzento. Mas ninguém está reclamando: a geladeira está abarrotada de cerveja e o churrasco está quase pronto. É hora de relaxar.
Já se foi o tempo em que dava para entrar no Marquee, ver o Sepultura passar o som e pedir uma entrevista. Hoje o grupo faz parte daquele clube exclusivo de bandasinternacionalmente famosas, e a proteção aumentou. Merecidamente. Mas o trabalho de ser interrogado pela mídia - que Max, Igor, Paulo e Andréas passaram a tarde fazendo - continua o mesmo. "What does ‘legal’ mean?", indaga um francês; outro, alemão, confessa à empresária Glória seu alívio ao ouvir algumas faixas do disco novo - "Pensei que eles fossem viras para o rock industrial!". Depois foi a vez do programa Raw Power e sua câmera: a banda é forçada a "dar um passeio pelo campo", no melhor estilo Led Zeppelin.
Agora os jornalistas desapareceram; o churrasco ficou pronto graças ao talento de de Sílvio (Bibica para os íntimos), amigo e roadie da banda. Aparece gente da Roadrunner e Glória, de cabelos que desafiam a paisagem verde, traz Zyon, seu filho com Max. Aos sete meses, ele é a criança mais Cool deste mundo. Curte o som alto, ri, vai no colo de quem o quiser. A piada que rola por aqui é que, quando crescer e perguntar o que seu pai faz, Zyon vai responder, morrendo de vergonha: "Ele é metaleiro".

Depois de seis semanas em Rockfield, no país de Gales, o sepultura se mudou de mala, cuia e master tapes para o Wool Hall Studio, no vilarejo de Beckington. Ainda faltam alguns vocais e solos, mais a pressão agora é para mixar o obra-prima que será Caos A.D.. "Entre uma turnê e outra", lembra Igor, "a gente dava uma paradinha e trabalhava no disco novo. Passamos seis meses só nisso. Quando chegamos ao Rockfield, só faltava dar uma limada." O estúdio no país de Gales foi sugerido pelo produtor Andy Wallace. A única exigência da banda era um certo isolamento. "No Brasil não dava", explica o baterista. "Ensaio virava festa, com quatrocentas pessoas assistindo. Em Los Angeles, agente estaria no estúdio pensando ‘Porra, aquela banda que eu gosto está tocando hoje à noite e só eu que não estou lá’ (risos). No Rockfield não tinha nada além da gente e o mato. Quem não estava gravando, ficava lá, olhando para as paredes."
E o Rockfield tem história: já passaram por lá o Black Sabbath, o Queen (para gravar o A Night At The Opera) e outros como Robert Plant. Mas o Woll Hall também tem suas vantagens: a paisagem lindíssima, a proximidade da cidade de Bath, uma mesa gigantesca de sinuca e uma foto do Miranda (sim , o nosso Carlos Eduardo Miranda, da BIZZ) vetido de Jesus Cristo!!!
A fama é um assunto fascinante. Quem é que não quer saber o efeito que ela teve sobre quatro garotos brasileiros? A questão é: o sepultura mudou?
Todos compraram casa em Phoenix, Arizona, menos Igor, que vive uma vida de nômade e sai em busca do mar sempre que pode. Max virou pai e em 94 lança um projeto paralelo com seu "genro" Alex Newport, do Fudge Tunnel, chamado Nailbomb (Alex é casado com a filha de Glória). Paulo começou a fazer aiqui-dô e Andreas ficou amigo do baixista Jason Newsted do Metallica (fundaram o Sepultallica!). O comentário de Jack Endino na BlZZ ("Já tem Sepulturas demais por aí") provoca sorrisos. "Tem mais Nirvanas do que Sepulturas", replica Max. "É legal saber que tem molecada tocando um som baseado na gente. Foi assim que a gente começou. Jack Endino estava lá no Rockfield, produzindo outra banda. Pegamos ele xeretando nas nossas guitarras duas vezes." (risos)
Eles conheceram o Ozzy, são amigos de bandas famosas (vide alista de agradecimentos do disco novo). Sobrou algum ídolo? "O Paulo tem o Bruce Lee", revela Max. O Sepultura mudou? Continuam sendo a banda mais despretensiosa do planeta.

Beneath The Remains atraiu os olhos internacionais, mas foi seu sucessor Arise que vendeu bem. Segundo Igor, foram duzentas mil cópias nos EUA, trezentas mil na Europa e cem mil no Brasil. Segundo a Roadrunner, um milhão ao todo. Para a gravadora, o Sepultura é prioridade em 93. O sentimento geral é de que Caos A.D. é o disco que vai levar o Sepultura a alturas nunca d´antes imaginadas. Igor diz que é legal gravar um disco tendo mais dinheiro, um bom estúdio etc. Mas e a pressão? "Isso sempre tem. O ´próximo álbum´ é sempre importante. Tentamos bloquear esse lance. Se a gente chegou até aqui com o nosso som, não é agora que vamos mudar, por causa de gravadora ou de público." Enquanto isso, a Roadrunner vai trazendo jornalistas do mundo todo e montando uma campanha publicitária forte, incluindo a festa de lançamento que promete ter desde capoeira até cachaça. É óbvio que, sem a música, nada disso adianta. Mas nesse ponto eles não precisam se preocupar...

Caos AD. é uma direita explosiva no queixo. Uma mistura do velho Sepultura com novos elementos que estavam querendo entrar nesta festa há tempos. Tem "We Who Are Not As Others", por exemplo, ou "Slave New World", composta com Evan Seinfeld do Biobazard; há também "Propaganda", "Clenched Fist"... mas falemos de uma música em especial, "Refuse And Resist!":
Max - "Essa rolou num dia que estava todo mundo desesperado, pois não saía nada há três dias! Aí apareceu o riff, um dos mais destacados do disco. Isso foi em Phoenix... a letra eu fiz ontem." (risos)
Andreas - "Não é muito diferente do que a gente já fez antes, mas é a primeira vez que abrimos um disco com uma música devagar."
Max - "Ela tem mais groove que rapidez. A letra é sobre o confronto entre polícia e juventude. O pessoal jogando pedra, botando fogo em carro. As primeiras frases deram o nome ao disco. O vocal é bem berrado, como no disco todo. Aliás, no encarte do disco nem escrevi ´vocal´; eScrevi ´Max: guitarra e garganta´."
Andreas - "´Territory´ é o single, com "Polícia" no lado B. Não é um som novo. A letra é sobre guerra, sobre a luta pelo território. O vídeo vai ser feito em Israel, com clima de guerra mesmo,"
Max - "Estamos com umas idéias bem loucas, de ir para o Mar Morto e cobrir a cara de lama e fazer uma parte do vídeo assim,".

Para produzir o disco novo, o Sepultura chegou até a pensar em AI Jourgensen, do Ministry.
Igor - "Depois da turnê com eles, vimos que não era bem isso, ele tem outra cabeça. Eu queria que o Jobn Zorn produzisse, mas ia precisar de mais tempo. Quem sabe no futuro..."
A escolha, muito bem feita, foi Andy Wallace, que havia mixado Arise. Ele também mixou Nevermind, produziu o Slayer, o Sonic Youth, o White Zombie, a Rollins Band... É um senhor alto, magro, de cabelos brancos que coleciona carros antigos. Este americano de uns cinqüenta anos deu ao Sepultura um som que Scott Bums, por melhor que fosse, não foi capaz. Mesmo com as músicas ainda não mixadas, dá para sentir a diferença: com um som mais cheio, o Sepultura ficou ainda mais poderoso.

Max - "A música ´Amen´ é baseada naquela história em Waco, do David Koresh. Li muito sobre isso, fiz anotações. Vivendo nos EUA, você vê isso de uma maneira diferente. De trinta canais de TV, quinze são religiosos, com aqueles tele-evangelistas loucos. Isso me impressionou e fiz uma letra irônica, no estilo dos Dead Kennedys. Como se eu estivesse me confessando, com a voz rouca. ´Me perdoe, sei que pequei matei esse tanto de gente. Mas sei que você vai me perdoar.´ A quebradinha é assim meio reggae, meio Fugazi. E tem um canto medieval que a gente tirou de uma fita que a Glória comprou no castelo (de Chepstow, no País de Gales)."

Para quem está de fora, a impressão que se tem é de que o Sepultura de repente percebeu que havia chegado a hora de fazer algo diferente, com mais expansão do que mudança propriamente dita.
Igor - "O processo foi gradual. Aos poucos, a gente vinha tentando colocar coisas novas na nossa música. Desta vez, o esforço foi maior. E depois, foram dois anos de turnê. Deu para ver o que funcionava ou não. Deu para pegar a energia do Sepultura ao vivo."
Quando o assunto é a direção do metal em geral, ele diz achar o momento atual confuso. Depois de um período prolífico de abertura para novos elementos, alguém pisou no breque.
Igor - "Foi legal o metal se abrir para essas influências, mas talvez tenha chegado a um ponto em que estava virando outra coisa."
Como disse um glam rocker do Sunset Strip de L.A., ´Seattle acabou com a gente!’ É impossível ignorar modas e tendências, mesmo se você estiver disposto a segui-las.
Igor - "Concordo, mas dentro de uma banda também acontecem muito naturalmente. Nunca paramos para decidir nossa direção musical. Somos meio pessimistas, quase nunca vemos o lado positivo das coisas. Então tudo o que acontece com a banda é surpresa.

"Kaiowas" é a grande surpresa do disco. Para começar é acústica. Mas tem peso, com muita percussão e até um gostinho de bailão.
Max - "É o nome de uma tribo que se suicidou. Eu estava precisando de umas idéias para o nome da música, algo brasileiro. O Joio Gordo (Ratos De Porão) e a Fabiana (fotógrafa amiga da banda) me mandaram uma lista de trios.
Quando li suicídio em protesto contra o governo, vi que era esse mesmo.
Andreas - "A gente gravou ao vivo, no castelo de Chepstow, no País de Gales. Um dos castelos mais antigos da Europa, é só ruína. Foi numa sala sem teto, cheia de reverberações, onde gravamos vários teckes como Andy. Ele pegou os melhores e montou".
Max - "É Led Zeppelin com Olodum e Sonic Youth. (risos) O começo é bem no estilo do Led Zeppelin III (Nota: que também foi gravado no País de Gales!). Dá até para ouvir as gaivotas. Temos tudo registrado em vídeo."
Andreas - "Tinha uma equipe gravando tudo, fazendo uma reportagem geral do disco. Pode ser que seja lançada futuramente."
Max - "Tem uns lances legais, como por exemplo ontem, quando o teto caiu na cabeça do Andreas durante a gravação de ´Polícia´." (risos)

Ainda há um resto de luz no céu quando acaba o churrasco. O jeito é ir para um pub. Afinal, temos aqui um sério caso do que em inglês se chama "cabin fever", aquele desespero que dá depois de ficar trancafiado muito tempo no mesmo lugar. Se alguém no bar da vila acha estranho ver um bando de cabeludos tatuados, não demonstram. Scott, da Roadrunner americana, vai comprando as cervejas. Paulo já conhece o barman.
Max - "A música ‘Manifest’ é sobre o que aconteceu no Carandiru."
Andreas - "Algo como se o Max fosse um repórter brasileiro falando em inglês."
Max - "Nem tirei o sotaque, falei palavras erradas. O Andy mudou um pouco a minha voz, ficou mais grave. Tipo rádio AM, só que transmitindo para o resto do mundo. Minha guitarra é só barulho. A gente tinha acabado de sair do Brasil quando aconteceu o massacre, consegui um monte de informações e tirei a letra disso. Coisas como o fato de que 80% do pessoal lá dentro ainda estava esperando julgamento. O Andy ficou horrorizado, achou que eu tinha inventado! (risos)"
Andreas - "No disco, cada letra tem uma foto. Para essa tem uma foto do Notícias Populares, de uma cela meio aberta, tem braço ainda segurando nas barras. Em cima está escrito, Departamento de Justiça, Polícia de São Paulo..."
Max - "Essas coisas tem que ser ditas. A última frase é ´pavilhão 9´ (em português mesmo). A primeira vez que misturamos português com inglês."
Igor - "O pessoal pira com o português. O Max grita ´Um, dois, três, quatro´ antes de uma música, aí vem gente do Japão perguntar disso. (risos)"
Max - "Estamos fazendo tudo que estamos a fim, pela primeira vez. Ontem, antes de gravarmos ´Polícia´, ficamos os quatro sentados, discutindo se ia ter palavrão ou não. Um dizia ´não, as rádios não vão tocar´, o outro dizia ´pau no cu das rádios´. Pronto! (risos) Ficamos meia hora gritando ´filho da puta´."
Se no começo o sucesso da banda criou certo ressentimento no Brasil, isso hoje virou respeito.
Igor - "É estranho, não é? Quando estávamos lá, ninguém ligava para nós, fora os fãs. No Brasil só se respeita o que já vem aprovado de fora. Na época do Made In Brazil, ninguém dizia que era uma ótima banda. Preferiam dizer que gostavam do Led Zeppelin ou do Black Sabbath. Precisou que uma revista inglesa dissesse que o nosso som era legal. Agora é tudo assim: ´O Sepultura é demais!´ É bom gostarem da gente, mas isso fica meio falso." Não é que a banda não goste de sua terra natal. Pelo contrário... as referências ao Brasil são constantes e a saudade é palpável. Mas o Sepultura sente que, profissionalmente, é preciso estar fora e acompanhar cara a cara o que acontece no mundo da música.

Andreas - "Sempre quisemos tocar uma música do New Model Army, mas ficava só no papo."
Max - "A gente nunca achava a música certa, aí o Igor deu a idéia de gravar ´The Hunt´. Tentei não gritar muito, porque a letra é tão legal. É sobre um cara querendo se vingar do traficante que fez do irmão dele um junkie. O Andy disse ´Pensa bem, você está puto, o cara fodeu com o teu irmão´. Aí eu entrei no clima, fiquei bravo."
Paulo - "Para falar a verdade, a gente quis dar uma força para o cara comprar um dente novo. Todo o dinheiro do disco vai para isso." (risos)

A Sony queria o Sepultura para si. Ficou difícil para a banda sair do contrato que havia assinado com o selo independente Roadrunner. Conclusão: por enquanto, a Sony vai apenas cuidar da distribuição dos discos do grupo na América do Norte.
Igor - "Se agente tivesse assinado com eles, teríamos ido de número um na Roadrunner para número mil na Sony, de Michael Jackson e todos os outros. Nós sabemos que gravadora grande é um perigo, se você não vende o quanto eles esperam, é adeus. Estamos indo aos poucos: quando acabar o nosso contrato com a Roadrunner, se tudo estiver indo bem, vamos para a Sony".

Andreas - "´Nomad´ é bem pesada, bem lenta."
Max - "É uma espécie de resposta do Andreas ao ´Sad But True´." (risos)
Andreas - "É sobre as tribos do Brasil e dos EUA... do que foi feito com a cultura, com a língua, com os costumes dessa gente."
Max - "Gravei um documentário sobre uma tribo da Amazônia. Eles usam um toco enfiado na boca, falam uma língua do além e tem gente tentando catequizá-los! Os caras acreditam na lua! Sampleamos eles batendo uns paus no chão."
Andreas - "O som veio de um soundcheck que fizemos na Indonésia."
Max - "Temos um monte de material gravado em vídeo. A hora em que der um branco e bater o desespero, vamos apelar para isso!" (risos)

Quando pergunto a Igor se eles jamais pensam em chegar - em termos de fama e vendagem - onde bandas como o Metallica chegaram, ele me responde calmamente que acha legal o que aconteceu com esta banda em particular, mas não existe pressão dentro do Sepultura para acharem que têm que fazer algo semelhante.
Igor - "O nosso objetivo nunca foi querer ser o Metallica ou os Guns N´Roses."
Pode ser, sugiro, que uma banda perca muita coisa ao chegar a tais alturas - como o Guns N´Roses por exemplo, que parece ter perdido a saúde mental!
Igor - "É, mas eles vieram do nada e em cinco minutos chegaram lá em cima. Não é como o Metallica, que foi aos poucos."
Queiram ou não, a possibilidade deles chegarem a tal eminência é uma realidade. Mas é fácil concordar com Igor, dizendo que a banda é coisa de irmão. É família mesmo, casamento. Você aprende a conviver, vai indo e lidando. Fazendo esse disco, saía pau todo dia. Se tem algo que eles não gostam, tem que dizer para os outros no ato.

Andreas - "´Biotech Is Godzilla´ é a única música rápida do disco. Foi o Jello Biafra quem escreveu a letra. O que foi uma grande honra."
Max - "O dia em que telefonei para ele ficamos meia hora conversando. O cara ia ficando cada vez mais empolgado. Disse que faria a letra, que já tinha mil assuntos... eu nem conseguia falar! (risos). Disse que seria uma honra para ele fazer a letra. Ele recebe mil convites desse tipo e não aceita quase nenhum. Poderia ter juntado os Dead Kennedys de novo, ganhando uma grana, mas é íntegro demais."
Andreas - "Ele mandou a fita com uma música nossa com a voz dele por cima, para termos uma idéia do vocal. Ele canta tudo, até o solo. (risos) O Max deu uma ajeitada, ficou legal."
Max - "Começa com ´Rio Summit 92/Street people kidnapped/Hid from view´. Na verdade, o Jello esteve Já, misturou tudo aquilo que viu com uma informação - não sei de onde ele tirou essa coisa! - sobre um plano de George Bush para testar germes, bacilos etc. na América Latina. Um plano de usar gente de cobaia. A partir disso, a letra diz que foi a biotecnologia que criou a Aids. O que ele diz é que a tecnologia por si não é uma coisa má, mas está nas mãos erradas."

Para o lado B, o Sepultura escolheu a dedo suas covers: "Polícia", dos Titãs, que no Brasil fará parte do álbum, "Crucificados Pelo Sistema" dos Ratos De Porão e "Inhuman Nature", do Final Conflict.
Max - "As escolhas não foram nada óbvias. Qual a graça de fazer ´War Pigs´ ou ´Anarchy In The U.K.´? Deveriam se proibir covers dessas músicas." "Sympton Of The Universe" foi gravada especialmente para um disco de homenagem ao Black Sabbath, que sairá pela Concrete nos EUA. Além dos "boys from Brazil", contribuíram o Bodycouot, o White Zombie e o Pantera, entre outros. Das demais covers que talvez nunca vejam a luz do dia, a mais intrigante parece ter sido "Looking Down The Barrel Of A Gun", dos Beastie Boys (do injustamente ignorado Paul´s Boutique).

Domingo de manhã: o estúdio se enche novamente de jornalistas, desta vez todos alemães. Andreas se enfurna no estúdio com Andy Wallace enquanto os outros três começam mais uma rodada de entrevistas. "Sorte que eles sempre querem o Max e o Igor" diz Paulo, conseguindo escapar do interrogatório. Na hora de gravar algumas chamadas para rádios inglesas, ele capricha no sotaque britânico e diz "Lovely!" como um membro da família real.
A notícia ruim é que os shows que a banda faria junto ao Black Sabbath (com Ozzy novamente no comando) foram cancelados. A boa é de que talvez o Sepultura esteja no Brasil em janeiro, tocando no Hollywood Rock. Numa pesquisa feita durante o festival deste ano, o Sepultura foi eleito o grupo que as pessoas mais gostariam de ver. Enquanto isso, o fim-de-semana chega ao fim, e a pressão recomeça. Quem vai dar a palavra final?
Igor - "Acho que este é um disco que tem mil influências, tem tudo aquilo que a gente costuma escutar, das viagens de dois anos de turnê. Estamos felizes com ele. É um disco que vai dar o que falar. Falem bem ou mal, mas vão falar."

MAX CAVALERA

Fonte: Revista Bizz – Ed. 123 – outubro de 1995

Você apareceu na festa da MTV se balançando feito um doido, desfigurado. Era alguma espécie de transe?
É macumba, véio! (risos) Tem sido assim há dez anos. Forças espirituais, vem de família, saca? A minha mãe é muito ligada ao candomblé. Macumba é assim mesmo. Um minuto antes a pessoa tá normal. Baixa o espírito, é aquela doideira.

Esse espírito já chegou a sair de controle?
Já. Quando eu bebia, era foda. Eu tomava pra caralho antes do show e rolava energia negativa na parada. Essa possessão tem que rolar naturalmente, se não dá tudo errado.

E quando vocês quebraram tudo no festival de Donington, na Inglaterra, o que aconteceu?
O show foi tão bom que deu vontade de quebrar tudo! Depois explicamos pra imprensa que o Sepultura não é Nirvana e que não temos essa atitude todo dia.

Você não se sente culpado por demolir equipamentos caros no palco?
De vez em quando dá aquela dor... Porra, eu sou o maior FDP que existe! Eu não tinha grana para comprar guitarra, tinha que usar instrumento emprestado e agora quebro tudo. Mas quando rola o instinto, não dá pra segurar.

Porque o Sepultura faz mais sucesso na Europa do que nos EUA?
Preconceito. Nos EUA, tudo que vem do México pra baixo é visto com o olho torto. Se tiver que rolar Pantera ou Sepultura, rola Pantera.

Esse comportamento do americano chateia?
Chateia. A tesourada é puramente racial. Mas minha batalha só vai terminar quando eles me respeitarem.

O disco novo, Roots, vem carregado de world music?
Tá todo mundo pensando que vem mais brazuca. Errado. Vamos pegar digeridoo, da Austrália, guitarras indianas, uns lances do Brasil e misturar com a nossa veia. Queremos chegar num degrau que bandas de metal não alcançaram. Ampliar os horizontes, sair do mundinho metaleiro. O disco sai dia 3 de fevereiro.

Você mudou muito depois que vieram os filhos?
Já entrei numa onda de achar que eu não emplacava mais um ano, uma viagem meio esquisita. Mas o Zyon veio me mostrar o meu valor. Me deu inspiração e força de vontade numa época em que acho que ia acabar num esquema Kurt Cobain.

O que te levou a pensar nessa detonação?
Tem muito a ver com a morte do meu pai, em 79, que até hoje eu não superei. Quando você entra num esquema de bebedeira e drogas, é difícil segurar. Ainda mais para mim, que sou um cara fraco, não consigo resistir à tentação.

Você está mesmo curtindo uma de família, né?
Tô. Não tem como não estar. Pó, o Zyon tá com dois anos e meio e acabou virando um chegado meu. Mexe nos meus CDs, pede para repetir música, conhece o nome dos caras da banda. É impressionante! Mas já tem muita gente achando que eu só quero saber de fazer filho. Não é nada disso, o Igor veio rápido porque quero que ele e o Zyon sejam unidos e amigos como eu e meu irmão.

Quando o Sepultura volta a tocar no Brasil?
Queremos tocar no Hollywood Rock. Ouvi dizer que o Metallica está confirmado e tem tudo a ver. De qualquer modo, detonamos a nova turnê no Brasil.

IGOR CAVALERA

Fonte: Revista Bizz – Ed. 145 – agosto de 1997

Como vai o Sepultura?
Temos dez músicas prontas, entre elas "Floaters In Mud", "Old Earth", "Rumors", "Common Bonds", "Choke" e "Reza", esta em português. Fizemos uma demo e os gringos da gravadora caíram de costas, cara! Então, resolvemos entrar em estúdio em novembro, para que o disco saia uns três meses depois. Estamos querendo chamar os Dust Brothers para produzi-lo.

As novas músicas seguem um estilo novo ou vão na trilha do Roots?
Agora, só com uma guitarra, as músicas estão mais simples. Mas o negócio tá pesado pra caramba. Tá Sepultura!

Vocês já acertaram com um novo empresário?
Fechamos com John Reese, o mesmo empresário do Guns. Ele ligou querendo me levar para tocar com o Axl e nós é que o trouxemos para o Sepultura...

O que você acha do Axl Rose?
Odeio a voz do Axl, mas não posso falar mal do cara, não o conheço... Achei legal pra cacete que, entre todos os bateristas do mundo, ele tenha lembrado do meu nome!

Você e o Andreas estão compondo a trilha sonora do filme No Coração Dos Deuses. As músicas já estão prontas?
Não. Quando o filme estiver pronto, vamos vê-lo e só aí colocar cada música. Mas o Andreas viajou até Tocantins (lugar onde a fita está sendo rodada) para entrar no clima. Ele disse que conversou pra caramba com o Antonio Fagundes e... Adorou!

Você fez um golaço no Rock E Gol, da MTV. Ninguém sabia que você é bom de bola...
Desde moleque eu e o meu irmão somos maníacos por futebol. A gente dormia e acordava abraçado com a bola. Quando tô jogando, quero dar o melhor possível. Comigo é assim: jogador tem de dar o sangue!

Falando da sua grife Cavalera, o que você entende de moda?
Gosto de desenhar, mas tenho uma equipe que saca melhor do assunto. Não entendo de moda! Também, se eu falar que entendo, é capaz de alguém querer me matar, como fizeram com o Versace... (risos)

Agora que você virou empresário, já conseguiu ficar rico?
Não! Com a grife, não deu pra ficar rico... O Sepultura é que deu dinheiro... É, não vou dar uma de Kurt Cobain e falar que o sucesso é uma merda. Cara, vivo bem pra caralho...

Você tem falado com o Max?
O Max mandou um cartão para a minha filha no Dia dos Pais (nos Estados Unidos a data é comemorada dia 5 de julho) e, acredite, eu tive de agradecer por fax... Pô, a Gloria bloqueou o telefone deles de uma forma que ligação feita da minha casa não completa. Não consigo entender esse tipo de atitude, ela é mãe, pô! Acho que não gostaria que acontecesse o mesmo com os filhos dela...

O Max fez uma música chamada "Judas", dizendo que ele teria sido traído. O que você acha da atitude dele?
Foi a válvula de escape que ele arrumou pra sair da situação que ele mesmo criou. Acho que seria mais fácil simplesmente admitir que não funcionou com a mulher dele empresariando o Sepultura e pronto.

Particularmente, você não gostaria que o Max voltasse?
Pessoalmente, quero restabelecer a relação com o meu irmão. Mas, profissionamente, não vejo uma reconciliação. A nossa realidade é que o Sepultura nunca mais vai ser o mesmo. No entanto, o grupo não se resumia ao Max. Continuamos furiosos!

MAX CAVALERA

Fonte: Revista Bizz – Ed. 149 – dezembro de 1997

É coincidência gravar seu primeiro álbum-solo na mesma época e no mesmo estúdio onde foi feito Roots?
Eu estou trabalhando neste disco desde janeiro. Grande parte do novo material foi composto nesta época, e assim que ficou pronto resolvi entrar no estúdio. Nada foi planejado.

Todas as canções são novas ou também há sobras que você não usou no Sepultura?
Desde a época da turnê do Chaos A.D. eu tenho um gravadorzinho portátil de quatro canais que eu levo para trabalhar na estrada. Eu usei um pouco dessas coisas mais antigas. Mas não muito. A maioria veio da necessidade de compor e colocar a vida no lugar.

É muito diferente trabalhar sem contar com o apoio de uma banda?
É diferente, mais difícil... Mas, ao mesmo tempo, tenho mais liberdade, também. Há coisas que estou fazendo aqui que talvez não fizesse se estivesse com o Sepultura.

Algum exemplo?
Eu estou curtindo muito o trabalho com a Nação Zumbi e se estivesse no Sepultura o Lúcio (Maia, guitarrista) só tocaria em uma música e não no disco inteiro, como está acontecendo. Admiro muito o trabalho dele e acho que ele é um dos melhores guitarristas da atualidade. Também não gravaria coisas como "Umbabarauma", do Jorge Ben, uma coisa tão fora do comum para mim... Estou tendo a chance de expandir o meu trabalho.

Você parece muito empolgado. Quais são as suas expectativas em relação a este disco?
Acho que este CD vai abrir muitas portas para mim. No futuro, vou poder levar minha música para muito além do Sepultura.

Onde exatamente você quer chegar?
Quero atingir um público que não ouve o Sepultura por achar que é só heavy metal. Esse trabalho vai ser a chance de um cara que ouve Beastie Boys e Bob Marley gostar também. É mais eclético...

Com tantas mudanças, você não acha que pode assustar os velhos fãs do Sepultura?
Tenho certeza que não. Há elementos novos, mas ao mesmo tempo as músicas mantêm o mesmo peso, aquele fogo anterior... Não quero e não vou dar as costas aos fãs que me botaram onde eu estou agora.

Este disco é muito diferente do que teria sido o sucessor de Roots, o último que você fez com o Sepultura?
Acho que é uma progressão natural. Se eu ainda estivesse no Sepultura, o faria do mesmo jeito, tentando fazer a banda ir mais para a frente, expandir o som para ficar sempre original e atual.

Você também foi ousado em Roots... Há diferenças na confecção dos dois trabalhos?
Esse foi mais fácil de sair porque os músicos que estão aqui têm menos medo e estão mais a fim de experimentar.

Como você escolheu os músicos da nova banda?
O baixista Marcelo Dias é amigo meu há doze anos. Ele fazia luz para o Sepultura e a gente sempre trocou figurinha. Em turnê, ele sempre vinha pro meu quarto para a gente tirar um som. Ao invés de pegar alguém famoso, fiquei em casa mesmo, é mais fácil trabalhar falando português. Quanto ao Roy Mayorga (baterista), fiquei bastante impressionado quando ele remixou "Refuse and Resist" para o Chaos A.D., que saiu na trilha do filme Mortal Kombat, e botou bastante percussão. Ele é baterista de hardcore das antigas, mas é apaixonado por viagens brasileiras: ele ouve Olodum e Chico Science pra caralho! Acho que ele é mais brasileiro do que muito brasileiro que eu conheço.

Quantas canções terão percussão do Nação Zumbi?
Pô, eles tocam na metade do disco. Tirando as músicas mais agressivas, este álbum está mais para o lado das raízes africanas, o lance dos escravos do qual já falei na SHOWBIZZ. Tem até letras falando de Zumbi, Quilombo... Nesses casos, os tambores deles encaixam perfeitamente.

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