"As pessoas iam ao Napalm para conhecer coisas novas, não
simplesmente para referendar o que já conheciam. Essa era a grande
diferença. A pessoa que ia ao Napalm ia aberta para uma experiência numa
noite. A noite era uma aventura." Ricardo Lobo em Napalm, O Som da Cidade Industrial.
O rock brasileiro dos anos 80 nasceu no Napalm. O rock que importa - o
rock com DNA punk, fosse o som qual fosse. O Napalm tinha vídeos,
discotecagem, cerveja e principalmente shows, mas era antes de tudo um
posto avançado - um pé na porta do futuro.
O Napalm era ideológico e idealista. Foi inspirado nos inferninhos onde nasceu a melhor música
nova-iorquina da época, o CBGB e o Max´s Kansas City, que seu criador
Ricardo Lobo frequentava. E o rock que cristalizou no Napalm era outra
coisa também. Não tinha nada que ver com a Blitz, que tinha acabado de
estourar. Nem com vários outros grupos engraçadinhos que começavam a
pintar no Chacrinha. O Napalm era eclético em seus gostos (tocava Clash e
Blondie e Grandmaster Flash), mas ortodoxo em sua postura radicalmente
underground.
Era embaixo do Minhocão, tão longe conceitualmente dos Jardins quanto
fisicamente da periferia. Convidativo para punks, e a grande São Paulo
era o único lugar onde existiam punks de verdade. E também para
universitários entediados e excitados - a maioria da USP e da ECA. Boa
parte eram trotskistas, garotos que rejeitavam igualmente a chatice da
ditadura militar vigente, e a oposição oficial, stalinista. Meus amigos.
Mas isso veio depois.
O Napalm era aglutinador. Foi criado para juntar pavio com dinamite.
Nenhum dos lugares que o sucederam teve o mesmo espírito. E é claro que
nada parecido com o Napalm seria possível hoje. Não só porque a
informação corre muito mais solta no século 21. É que o espírito do
Napalm amalgamava nova política, nova música, novo comportamento. Era
espírito de aventura. De escárnio à caretice, da percepção de inimigos
claros, e de possibilidades muito além do Brasil e do mundo.
Era punk. De espírito, não de jaqueta preta, moicano e alfinete.
Espírito que vive pra muita gente, e pelo jeito também para Ricardo Lobo
e para Ricardo Alexandre, que dirige seu primeiro documentário.
Gostaria de rever o primeiro Ricardo, cara muito inteligente,
bem-informado e intencionado, que não vejo há muitos anos. Seguiu
carreira como homem de vídeo, sua vocação desde os tempos do Napalm,
trabalhando pra ONU e se metendo em boas.
Sou amigo há duas décadas do segundo Ricardo, cujo currículo como
jornalista e escritor dispensa meu confete. Basta dizer que o
documentário entrevista todos os principais personagens da história, e
revela preciosas imagens em vídeo do Napalm. O doc não explica a época,
nem se propõe a isso. Mas é informativo, engraçado e... terno.
É muita forçação chamar qualquer um dos dois de punk. Mas Ricardo
Alexandre sempre entendeu que jornalismo e paixão são indissociáveis, e
criou e cria seu caminho. O Napalm não era um plano de negócios para
Ricardo Lobo, era um projeto de vida. Seu sonho não era ficar rico -
embaixo do Minhocão? Programando uma banda desconhecida por noite? Com
um staff de punks? Claro que não queria ter fechado em seis meses. Mas
seu objetivo era bem maior que grana.
Ser punk é querer ser livre, querer ser diferente, querer importar -
contra todos os obstáculos e probabilidades. Ricardo Lobo resume na
entrevista para o documentário: "O Napalm era uma casa onde as pessoas eram livres. Era uma Zona
Franca. E você precisa de coragem para ir a uma Zona Franca. Porque não é
um lugar em que as regras estão estabelecidas."
É preciso mais coragem ainda para fazer você mesmo uma Zona Franca.
Ou mesmo para revisitá-la... assista e inspire fundo. É o cheiro da
cidade grande, safra 1983. É perfume da aventura.
NOTA DO EDITOR (Adelvan): Meu primeiro fanzine, xerocado e publicado em Itabaiana, interior de Sergipe, no final da década de 80, se chamava Napalm em homenagem à casa noturna, que eu conhecia de ler sobre na saudosa e extinta revista Bizz. Copiei inclusive a marca, com o A circulado de anarquia, que eu conhecia de uma foto de um show da Legião Urbana, publicada na mesma revista.
por André Forastieri
do Blog
SERVIÇO:
Napalm: O som da cidade industrial
Direção: Ricardo Alexandre
Produção: David Barkan e Ricardo Alexandre
Direção de fotografia: David Barkan
Montagem: Fabiana Freitas
Estreia: segunda-feira 04 de março, às 19h30, no Canal BIS
Reprises:
quarta, 06/03 às 16h30
quinta 07/03 às 09h00
sexta 09/03 às 19h30
sábado 10/03 às 03h30
domingo 11/03 às 15h30.
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