Jourgensen nasceu em Cuba, em 1958. Seu nome verdadeiro é Alejandro Ramirez Casas. Sua mãe tinha 16 anos e o pai prontamente sumiu. Al veio com a família para Miami, fugindo de Fidel Castro, e acabou em Chicago. Adolescente, começou a tomar gosto por música, drogas e confusão. Obcecado pelo classic rock de Led Zeppelin, ZZ Top e Pink Floyd, virou um vagabundo em tempo integral, matando aulas para fumar maconha e cheirar cola. Fugiu de casa inúmeras vezes e chegou a ser internado em um manicômio, onde recebeu eletrochoques e, segundo o próprio, se esbaldou ao visitar uma ala reservada a jovens ninfomaníacas e perturbadas.
O Ministry, banda que ele fundou no início dos anos 80, começou imitando New Order e Depeche Mode, fazendo um som dançante e acessível, depois deu uma guinada e começou a incorporar guitarras barulhentas às batidas eletrônicas. Foi Al que misturou o som industrial ao thrash metal, tornando o Ministry um sucesso em todo o mundo com álbuns extremos como “The Mind is a Terrible Thing to Taste” e “Psalm 69”, influenciando Nine Inch Nails, Tool, Slipknot, Linkin Park e tantos outros grupos.
Al Jourgensen deveria ter o corpo estudado pela ciência. Perto dele, Lemmy e Keith Richards são exemplos de comedimento. Já sofreu inúmeras overdoses, foi internado pelo menos uma dúzia de vezes, esteve envolvido em incontáveis desastres de carros e motos, e viu, segundo o livro, ao menos dez amigos próximos abraçarem o capeta.
É impressionante a capacidade que ele tem de estar perto da morte. Os companheiros Jeff Ward (Lard) e William Tucker (Ministry) cometeram suicídio; Mike Scaccia e Paul Raven, ambos do Ministry, morreram de ataques cardíacos antes de completaram 50 anos; o amigo e colaborador El Duce (Mentors) morreu atropelado por um trem enquanto fazia saudações nazistas para o condutor. Al estava no palco do Viper Club, em Los Angeles, enquanto River Phoenix morria de overdose na calçada, e fazia um show no clube ao lado de onde o amigo Dimebag Darrell, do Pantera, foi morto a tiros. Isso sem contar as inúmeras groupies que sofreram overdoses e a partida de amigos como Timothy Leary e William Burroughs.
Al teve o dedão do pé amputado depois de usar, por dias, uma bota onde havia deixado uma seringa cheia de heroína. Estava tão anestesiado que nem percebeu que a agulha necrosou seu dedo.
Uma da melhores histórias do livro é sobre Burroughs, com quem Al teve uma longa amizade. Uma vez, no aniversário do escritor beatnik, Al resolveu surpreendê-lo e marcou uma apresentação exclusiva do circo de freaks de Jim Rose, especializado em suspensões, pirecings genitais, e que contava com um “artista” que levantava pesos com os testículos.
Burroughs parecia entediado. “O que foi, Bill, não está gostando?”, perguntou Al. “Isso é coisa de criança”, respondeu Burroughs. “Uma vez, no Marrocos, vi um homem que engolia três serpentes de cores diferentes, daí você escolhia uma cor e ele regurgitava a serpente certa. Aquilo sim era um show!”
Al morou com Timothy Leary por dois anos e foi cobaia de experiências com drogas conduzidas pelo papa do LSD. Na época, Leary vivia confortavelmente na Califórnia, bancado por amigos milionários. “Você sabe que é um sucesso quando as pessoas te pagam apenas para você ser você mesmo”, disse Leary a Al.
O livro tem histórias hilariantes com Madonna (Al cismou que ela cheirava mal e torturou a cantora com insinuações sobre seu odor corporal), Courtney Love (Al e Mike Scaccia passaram uma turnê inteira roubando pacotes de heroína do quarto de Courtney, até que ela, assustada, aceitou fazer sexo com ele), Fred Durst, do Limp Bizkit (Al ganhou uma grana preta para mixar uma música do grupo e disse a Durst que, para cantar igual a ele, Durst precisaria usar seu chapéu de caubói e gravar pelado, o que Durst imediatamente fez) e Ice Cube, a quem Al perseguiu, pelado, no camarim do Lollapalloza.
Isso sem contar lendas medonhas envolvendo sanduíches de peru defumado e o grupo The Cult, a noite em que Al e amigos viraram o trailer do Slayer dentro de um rio congelado, o “rito de iniciação” de um jovem roadie chamado Trent Reznor, Al atirando com uma pistola 22 no chão e obrigando Jello Biafra a dançar para não ser atingido, sexo com uma groupie esquelética e purulenta que, anos depois, Al descobriu ser Marilyn Manson, Gibby Haynes, do Butthole Surfers, fugindo da polícia e esquecendo de jogar fora o cachimbo de crack que segurava, El Duce tentando agarrar a sexagenária mãe de Al, uma festa de Natal da família Jourgensen onde Al e a filha de 7 anos passaram a noite vendo “Scarface” e sexo grupal envolvendo universitárias, Al, e o septuagenário Timothy Leary.
Sascha Konietzko, do grupo KMFDM, conta que ele e os roadies odiavam tanto Chris Connely, vocalista do Ministry, que se vingavam regravando os samples que Connely usava nas canções. “No último show da turnê, Chris tinha que disparar um sample com a frase ‘Kill, kill, kill! You will not kill!’ (na faixa “Thieves”); nós gravamos no lugar alguém dizendo ‘Por favor, quero um frango assado pra viagem!’, você tinha de ver a cara de Chris quando ele apertou o botão e o público todo ouviu o pedido da galinha. Al achou aquilo hilariante.”
Confesso que fiquei surpreso com as opiniões venais de Al sobre Paul Barker, seu companheiro no Ministry por 17 anos. Barker é descrito como um aproveitador sem talento, que não colaborou em quase nada com a banda. Al diz que ele é quem fazia todo o trabalho no estúdio e que Paul só colhia os louros.
Tive a sorte de ver algumas sessões de mixagem de “Psalm 69”, em 1991, e minha lembrança é bem diferente: os dois pareciam parceiros. Lembro que era Paul, inclusive, que estava na mesa de mixagem, testando efeitos e sugerindo mudanças.
O negócio agora é aguardar o livro de Paul Barker.
por André Barcinsky
Folha
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