quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Black Flag por Keith Morris, como contado para Legs McNeil

Keith Morris e eu somos amigos há um milhão de anos, desde que eu apaguei no chão da casa dele depois de mais uma noite enchendo a cara em Los Angeles nos anos 70. Nos 80, quando eu trabalhava na SPIN, peguei emprestada uma cópia de Hardcore California (um livro sobre a cena punk do sul da Califórnia) dele e nunca devolvi. Eu me arrepiava sempre que cruzava com esse livro. Ano passado, finalmente mandei o livro de volta para ele com minhas mais sinceras desculpas e isso meio que reacendeu nossa amizade. Como sempre fiquei meio confuso sobre a época do Keith no Black Flag, Circle Jerks e toda a cena do hardcore da Califórnia, pensei: que maneira melhor de esclarecer as coisas do que entrevistar o Keith e deixar ele mesmo explicar? Conversamos por telefone durante umas quatro ou cinco horas e o Keith mandou toda a história da cena do hardcore. O que deve ter ajudado foi que comecei dizendo: “Fale como se eu fosse um idiota que não sabe nada dessa história”.

Um mês depois que terminei a entrevista, Greg Ginn, o cara que fundou o Black Flag com Morris, iniciou um processo judicial contra o Keith, o Dez Cadena, o Chuck Dukowski, o Bill Stevenson e o Stephen Egerton porque eles estavam em turnê usando o nome Flag, dando aos fãs um gostinho do verdadeiro punk rock hardcore. Henry Rollins também é mencionado no processo. Como o Greg Ginn se tornou uma carcaça inchada e monótona de tudo o que a gente mais odeia no rock 'n' roll, o Flag se juntou para passar a tocha para uma nova geração de handbangers e envergonhar a banda de Ginn, mostrando ao mundo como se toca o puteiro.

Enquanto esse processo passa por todas as instâncias, faça uma viagem de volta àqueles dias negros dos anos 1970: o mundo era uma gigantesca cara feliz de macramê e a angústia adolescente se afogava num refugo mortal de folk rock, quando alguns moleques fodidos ousaram desafiar o status quo ...


SEMENTES DA DISCÓRDIA

Conheci o Greg Ginn por causa da irmã mais nova dele, Erica, quando eu trabalhava numa loja de discos chamada Rubicon, na Pier Avenue em Hermosa Beach, em 1975. O cavalheiro que era dono da loja, Michael, era louco pela Erica. Então, o Greg Ginn passava pela loja com a irmã dele — e a Erica e o Michael saiam para fazer sabe-se lá o que os jovens amantes fazem: andar de mãos dadas e ver as gaivotas voando sobre a Hermosa Beach, sei lá. Sabe, eles iam comprar o almoço ou cigarros e eu ficava cuidado da loja enquanto o Greg Ginn ficava por lá, esperando a irmã dele.

Na loja, eles sempre tocavam Joni Mitchell, Linda Ronstadt, Eagles, os três primeiros discos do Springsteen, Linda Buckinghan e Stevie Nicks, mas eu não curtia muito esses sons. O que estava acontecendo, enquanto essas músicas tocavam, é que as sementes de minha rebelião musical estavam começando a brotar.

Eu pensava: “Não curto nada disso. Eu queria ouvir Black Sabbath, queria ouvir Raw Power do Iggy e Stooges, queria ouvir New York Dolls e queria ouvir power trios estourando dos alto-falantes, tentando arrancar meu crânio!”.

Então, quando o Michael e a Erica saíam, eu tirava a Joni Mitchell e colocava Uriah Heap e Deep Purple, sabe, alguma coisa que fosse alta e abrasiva. O Greg não tinha muita escolha porque eu era o cara atrás do balcão, mas eu gostava do Greg. Gostava de conversar com ele. Sabe, era legal andar com ele. Ele parecia um cara legal. Ele curtia a maioria das coisas que eu tocava e os comentários dele iam bem com o que eu estava pensando. Foi assim que a gente se uniu. Foi ali que as sementes do Black Flag foram plantadas, naquela loja de discos de Hermosa Beach.

MINIRREVOLTAS

O Michael tinha comprado ingressos para o show do Journey e Thin Lizzy no Centro Cívico de Santa Monica. Nós três — Michael, Ginn e eu — fomos até lá no meu Chevy Impala. Depois do show, o Greg disse: “Tenho umas músicas prontas. Por que a gente não monta uma banda?”.

Veja bem, a gente era uma dupla de nerds. Não éramos parte da cena musical local. Éramos só dois caras entrando cegamente nessa. Eu não sabia tocar nada, mas queria aprender. Eu tocava um pouco de baixo, mas não o suficiente. Então, não tínhamos sequer ensaiado ainda. Tínhamos que achar outros músicos. Tivemos três baixistas antes do Chuck Dukowski entrar, e isso foi quando o Black Flag se tornou uma banda, porque o Chuck Dukowski trouxe uma ética de trabalho. Agora, a gente estava começando a praticar mesmo, sabe? “Vamos aprender essas músicas! Não vamos ficar nos contorcendo como um peixe no convés de um barco!”.

A gente precisava achar um baterista de verdade, então, colocamos um anúncio no Pennysaver, o jornal gratuito local. Um dos caras que respondeu o anúncio foi o Robo [Roberto Valverde], que trouxe sua arma secreta, a cúmbia.

Foi quando os ensaios de três, quatro horas começaram. A gente meio que já parecia uma banda, mas nenhum dos nossos amigos gostava do que a gente estava fazendo. O melhor que a gente conseguia era tocar numa garagem, num quintal, mas esses shows acabavam sempre em minirrevoltas. De repente, os motoqueiros, os jogadores de futebol, as líderes de torcida, os traficantes e os surfistas estavam todos brigando no gramado da frente.

Ocasionalmente, algum amigo músico nosso aparecia, como o Juan, baixista do Ratt. Ele só ria e dizia: “Isso é hilário!”.

PUNK ROCK

A coisa do punk só estava começando a ferver em LA — com o Germs e o Runaways. Mas a gente não estava tão ligado nas coisas para se dar conta disso. A gente continuava indo aos shows do Ted Nugent e do Lynyrd Skynyrd no Estádio Anaheim, coisas assim. A gente assistia a qualquer coisa que despertasse nosso interesse, mas acabamos nos apaixonando pelo Ramones. Os Ramones eram uma grande influência. E eu não só assisti quando eles tocaram no Whiskey como, na verdade, eles deram uma festa, tipo uma festa mesmo, no Motel Tropicana até o amanhecer. Tinha tanta gente na festa que até hoje me surpreendo do Tropicana ter deixado rolar. Eles tinham um mínimo de 100 a 150 pessoas lá. Os Screamers estavam lá, os Germs estavam lá. Tenho certeza de que uns caras do Dickies estavam lá também.

E nós estávamos lá, uns caras de South Bay e se encontrei ou conversei com os Ramones, nunca vou saber porque estava completamente bêbado. E foi quando cortei todo meu cabelo. Achei uma daquelas tesouras de poda e cortei todo o cabelo, o que sobrou ficou arrepiado, quase um topo plano, um lance meio skinhead. Fiquei muito orgulhoso de mim na hora.

Claro, no dia seguinte, fui trabalhar com uma puta ressaca e com aquele corte de cabelo horrível. Meu velho ficou puto. Ele queria saber o que estava acontecendo. A esposa do sócio dele me acusou de ser um pecador, disse que nunca iam me deixar entrar no céu. Sabe, merdas idiotas e sem sentido tipo essas.

A MÁSCARA

A gente não sabia aonde ir para conseguirum show. Então, depois de alguns anos trancados no espaço de ensaio, o Greg Ginn e eu fomos até o Masque em LA, o bastião do punk rock, e falamos com Brendan Mullen, um dos meus heróis. Nós éramos uns tipos zoados — eu não tinha cortado meu cabelo ainda, então parecíamos os roadies do Peter Frampton.

Éramos impressionados com o Brendan porque éramos impressionados com o Masque — era onde a gente tinha visto o Germs e o Weirdos. Enchemos tanto o saco do Brendan que ele acabou cedendo. Ele disse: “Certo, eu deixo vocês tocarem, vocês podem ser a banda de abertura na noite de fechamento”.

Então, tocamos na noite de fechamento do Masque original, mas não me lembro, porque eu curtia mesmo era tomar umas cervejas regularmente e cheirar o Pó Mágico de Hollywood. Eu andava com o Derf, o Philo e o Spit do Fear — eles viraram meus amigos de copo. E, às vezes, o Darby Crash aparecia também. Eu não estava preocupado em transar, eu estava muito bêbado para me preocupar com o que fazer com meu pinto. Eu estava mais preocupado em ficar chapado.

Quer dizer, eu era um desses caras que se sentam no estacionamento do Hollywood Bowl bebendo xarope para tosse sabor pêssego antes de entrar escondido para ver os Allman Brothers, sabe?

BANDEIRA BRANCA

Greg Ginn e eu começamos a nos afastar. Nossa amizade começou a se dissolver por volta da metade de meu segundo ano na banda. A gente não estava fazendo muitos shows. Tudo o que a gente fazia era ensaiar, mas ensaiar pra quê? Sabe, era como se a gente estivesse tocando só para nós mesmos. Fizemos algumas viagens para São Francisco e foi bem legal, mas aí as coisas começaram a mudar. Quer dizer, quando o Gary entrou na banda, as pessoas começaram a escolher lados. Não era mais “Um por todos e todos por um, vamos para a festa!”. Sabe, não era mais “Ei caras, vamos ser amigos! Vamos farrear!”.

O que aconteceu foi que três se voltaram contra um. Eu, aparentemente, estava empatando o progresso deles por causa de minhas palhaçadas de bêbado e porque eles queriam aprender mais músicas. Minha mentalidade era a seguinte: “Tudo legal, tudo ótimo, mas por que aprender mais músicas? Qual é a vantagem?”.

Chegou um ponto em que eu não me divertia mais. Quer dizer, a gente tocava, e enquanto a gente estava no palco eu curtia muito, mas todas as outras coisas anexadas a isso estavam me moendo. Tinha uma luta pelo poder acontecendo e eu não queria me envolver nisso. Sempre que a gente tinha algum tipo de briga, eles faziam uma discussão em grupo. Eu era o enteado sardento, sabe, o órfão. Por fim, eu disse: “Caras, tô fora”.

Como acabou sendo, porque passei muito tempo com o Chuck Dukowski e tive que ouvir todas as histórias pós-Keith do Black Flag. O Chuck me disse que o Greg ia me chutar da banda porque eu estava impedindo eles de seguir em frente. Isso é uma coisa que eu nunca entendi no Greg Ginn. Nunca vi ele como particularmente ambicioso, ou como o rei de um império que ele acabaria se tornando.

Mas a coisa só foi ficar feia quando o Circle Jerks começou a tocar ao vivo.

RODADA DE MASTURBAÇÃO

Depois que saí do Black Flag, eu estava morando numa Igreja Batista abandonada em Hermosa Beach, na esquina da Pier com a Hermosa. Depois que a igreja foi abandonada, uns hippies se mudaram para lá e começaram a alugar seções da igreja para pessoas que sopravam vidro, faziam cerâmica, coisas assim. O cara no comando era o Red, que tinha vendido LSD pro Grateful Dead — hahaha! E acontece que o Redd Kross estava ensaiando lá.

Então,o Redd Kross estava no porão num sábado à tarde, e cruzei com o Greg Hetson e o Keith “Lucky” Lehrer. Eles iam fazer um teste. O Redd Kross estava testando uns bateristas e o Lucky era o baterista naquele dia. Eles estavam lá há uma hora. Eu, sentado no corredor, tomando cerveja, e o Greg e o Lucky foram os primeiros a sair.

Vi que o Greg Hetson estava bem chateado, então eu disse: “Como foi lá? Parecia que estava rolando, cara!”. Mas eles saíram balançando a cabeça e com uma cara desiludida. Então perguntei de novo: “Oque aconteceu?”. E o Greg disse: “Bom, foi ótimo, foi incrível, mas os irmãos não gostaram do Lucky, ele foi muito proficiente. Ele é um baterista bom demais...”.

Foi aí que me dei conta: “Olha, a gente tem um vocalista, um guitarrista e um baterista. A gente só precisa de um baixista!”. Algumas semanas depois, cruzei com Rodger Rodgerson na frente do Anti-Club em Hollywood e contei a ideia pra ele. E foi mais ou menos assim que o Circle Jerks começou.

RAYMOND PETTIBON

Raymond Pettibon é o irmão mais novo do Greg Ginn, e ele é parte da história toda desde o começo. A gente fez o colegial juntos. Quer dizer, não estávamos nas mesmas turmas, mas teve um ponto em que todo mundo estudava na Maricosta High School, em Manhattan Beach. Éramos todos Mustangs — verde e dourado eram as cores da escola, como os Green Bay Packers.

E o Raymond sempre foi fã do Black Flag. Bom, a gente se chamava Panic antes de sermos o Black Flag. Mas já existia uma banda francesa chamada Panic, que tinha lançado um 45. Quando descobrimos, nos entreolhamos e dissemos: “Temos que mudar o nome, não temos como lidar com nenhum processo judicial!”.

Quer dizer, que advogado ia querer representar a gente? Tipo: “Alguém aqui conhece um advogado? O que é um advogado?”.

Então, o Raymond foi o cara que pensou no nome Black Flag. Foi ele também que fez o logo da banda, sabe, as quatro barras que formam a bandeira tremulando? É um design muito louco. Isso vai durar para sempre. E o nome Circle Jerks foi outra criação do Raymond Pettibon, porque a gente já tinha passado por uns seis ou sete nomes, Plastic Hippy, The Runs, White Hassle...

Bom, a gente não curtia nenhum desses nomes. Um dia, estávamos com o Raymond em um dos quartos da casa dos pais dele em Hermosa Beach. O Greg Hetson e eu estávamos tentando pensar num nome para a banda. Então, puxei um livro da estante, era o Dicionário de Gírias Americanas, e a gente começou a folhear. Eu estava olhando todos os nomes e de repente surgiu Circle Jerk. E eu pensando: “Bom, Rolling Stones, esse sim é um nome escroto...”.

São sempre os piores nomes, os nomes mais horríveis, aqueles mais lembrados.

Então pensei: Circle Jerk não, Circle Jerks, no plural, porque somos quatro. O Greg concordou com a cabeça e foi isso. A gente quase pode culpar o Raymond Pettibon de novo.

O Raymond foi um dos três primeiros baixistas que a gente teve antes de achar o Chuck Dukowski. Ele era um desses baixistas que não consegue tocar baixo.

A gente era amigo de farra. Uma noite, estávamos num show do John Cale/Zeros no Whiskey e ele estava completamente bêbado. Aí ele pegou uma mina e eles começaram a se agarrar no chão do Whiskey a Go Go. O Raymond não se envolvia muito em nenhum desses trabalhos internos no Black Flag, ele era só um fã, sabe? Ele cresceu com a gente. E se dava bem com o irmão, Greg. Mas eles não se falam mais porque um deles é uma pessoa incrivelmente horrível — e não é o Raymond.

MAS QUEM É O VOCALISTA?

O Black Flag teve dois vocalistas ensanduichados entre o Henry Rollins e eu. Muita gente, quando pensa no Black Flag, pensa no Henry Rollins, porque ele esteve em todos os álbuns. Ou quase. Essa é uma das coisas fantásticas sobre o Black Flag; foram quatro vocalistas diferentes e cada um trouxe seu próprio sabor para a banda, sabe?

Então, o Henry veio depois do Dez, e o Dez veio depois do Ron Reyes e o Ron veio depois de mim. O Ron só ficou na banda por uns seis meses. Ele simplesmente não estava muito empolgado. Não sei qual foi a desculpa ou as razões que ele deu para sair, mas sempre escuto que o EP do Black Flag com o Ron, o Jealous Again, ele tem as melhores músicas que o Black Flag já fez.

Henry Rollins usou o Black Flag como um trampolim para todas as outras coisas que ele fez, e aplaudo isso de forma sincera. O Greg Ginn não gosta que o Henry é mais famoso do que ele. Fico surpreso que o Henry tenha ido tão longe com o Greg Ginn, porque o Greg estava sempre dizendo: “Não posso deixar ele me ofuscar! Ah, ele está fazendo todas as entrevistas!”. Mas o Henry conseguia ofuscá-lo logo que entrava no palco. Quer dizer, o Henry era um símbolo sexual do punk rock. Então, por um lado, acho que o Greg ficava satisfeito de ter ele na banda, mas também tinha esse ressentimento.

Você tem que entender que o Greg se tornou muito egocêntrico. Ele pensava: “Bom, tenho esse selo incrível com todas essas bandas. Tem todas essas coisas acontecendo e estou no controle!”. E aí o Greg Ginn saiu da banda. Não sei quando. Só sei que o Greg saiu e deixou o Henry com o Black Flag. Isso foi quando o Henry decidiu fazer sua própria coisa com a Henry Rollins Band. Mas não sei nada dessa época.

Só sei que o Greg Ginn nunca foi e nunca será um vocalista. Mas como guitarrista, eu colocaria o Greg lá em cima junto com Jeff Beck, Jimmy Page e Jimmy Hendrix. Ele foi um dos grandes guitarristas de todos os tempos.

Fui o primeiro vocalista, mas também não sei cantar. Eu era o cara que gritava. Não sou o tipo de cara que vai num casamento e alguém me pede para cantar uma música.

Era para eu estar no primeiro disco do Black Flag, o EP Nervous Breakdown, mas saí da banda. Estou no Everything Went Black. Estou num dos lados dos três lados e estou em outra compilação, acho que se chama Wasted Again. Tenho material gravado o suficiente e também poderia pegar um belo pedaço dos royalties. Mas nunca ganhei nenhum royalty do Black Flag.

O Ginn não paga os royalties. Uma vez, ele me convidou para subir no palco com ele e cantar quatro ou cinco músicas. Eu olhei o Greg nos olhos e disse: “Claro, pega lá um cheque de US$75 mil dos royalties passados”. E isso seria só a ponta do iceberg, mas ele riu na minha cara.

VOLTAS SÃO UM SACO

O Circle Jerks fez uma turnê em 2003 e tocamos num grande festival daqui, no LA Coliseum. Alguns caras do Golden Voice, os promotores com quem tratamos a maior parte das nossas vidas, me disseram: “Keith, precisamos de sua ajuda, vamos fazer duas noites de Black Flag no Hollywood Palladium...”.

E eu disse: “Nem precisa me dar os detalhes, só me avisem quando vocês forem fazer. Claro, vou estar lá; vou fazer parte disso. O que preciso fazer?”.

Quando me pediram para participar do show do Hollywood Palladium, a coisa estava sendo anunciada como “Black Flag: The First Four Years”. É uma dessas situações em que você tem US$100 mil no curso de duas noites, e isso deveria ser um show em prol dos gatos. Então fiquei pensando: “Uau, eles vão chamar o Ron, o Dez, o Chuck e o Robo também! Vou poder tocar com alguns dos meus amigos!”.

Fui para o primeiro ensaio e foi brutal. Uns outros caras — não o Dez, o Ron, o Chuck ou o Robo — estavam tocando as músicas, e eles nem sabiam o que eram as músicas. Eles ficavam olhando um para o outro, esperando pelo riff para tocar suas partes cinco ou seis vezes. Foi bem ridículo. Balancei a cabeça. Tinha visto o suficiente. Eu estava perdendo meu tempo. Mas ainda queria saber quando o Chuck Dukowski ia aparecer, porque eu sabia que se o Chuck aparecesse a coisa ia deslanchar. Na verdade, eu liguei para o Greg e disse: “Então, quando o Chuck vai aparecer para os ensaios?”.

E o Greg disse: “Não falei com o Chuck ainda...”.

Então, fui falar com o Chuck na Amoeba Records em Hollywood, durante o show beneficente para o West Memphis Three, e perguntei: “Então, você está sabendo da reunião do Black Flag no Hollywood Palladium?”.

E o Chuck disse: “Ninguém falou comigo sobre isso...”.

E eu disse: “Bom, você ficou sabendo agora...”.

Então, saí do ensaio aquela noite pensando em só voltar quando soubesse que o Robo e o Chuck Dukowski iam estar lá. Liguei para o Dez para saber se alguém tinha falado com ele, para saber quando ele ia vir. Mas ele não me ligou de volta, então, deixei uma mensagem na secretária eletrônica dele. Eu teria ligado pro Robo também, se eu soubesse como entrar em contato com ele.

Então, o Greg Ginn me ligou para falar merda: “Te ligo quando for hora do ensaio, pare de falar merda pelas costas de todo mundo, pare de tentar foder com tudo...”.

E eu disse: “Bom, você falou com o Robo? Quando o Robo vai aparecer?”.

O Greg disse: “Isso não é problema seu. Vou te ligar quando for sua vez...”.

Foi quando percebi que o Greg nunca teve a intenção de ter a banda original no palco.

O GRANDE SHOW

O promotor me ligou e quis saber: “Bom, você vai estar no palco? Os ingressos da primeira noite já estão esgotados e precisamos encher a segunda noite. Queremos fazer umas propagandas, quem vai estar tocando com a banda? Queremos anunciar todo mundo que estará tocando”.

Eu disse pra ele: “Não sei dizer, me deixaram no escuro...”.

E ele disse: “Bom, você devia saber dessas coisas!”. E a coisa foi só piorando. Lembrei por que tinha saído da banda. No começo, eu estava mais do que empolgado e muito a fim de tocar, mas aí, estando com essas pessoas, ouvindo a conversa delas e sendo esculachado por coisas que eu não estava fazendo, acabei pensando: “Vocês estão de brincadeira? Essas são todas as razões pelas quais eu saí da banda!”.

O organizador me ligou algumas semanas antes do show e disse: “O Greg me disse, em várias ocasiões, que você estava espalhando rumores maldosos e falando merda pelas costas de todo mundo, então, seus serviços não são mais necessários”. Primeiro eu quis ficar deprimido, mas depois dei um suspiro de alívio e agradeci o cara.

Dois dias antes do show, o promotor me ligou e disse: “Keith, reservamos algumas mesas no balcão, você pode convidar todos os seus amigos. Você pode ficar no balcão e se quiser colar no palco e cantar algumas músicas, fique à vontade”.

E eu disse: “Obrigado pela oferta, mas não estarei lá”.

Alguns dias depois, ele me ligou de novo e se desculpou pelo jeito que tinha falado comigo no telefone. E isso não tinha me incomodado muito, já estou acostumado com esse tipo de coisa, mas no final da conversa ele disse: “Bom, a gente ainda continua amigo?”.

E eu disse: “Rick, sempre seremos amigos. Não importa o que aconteça, todas essas merdas, vamos sempre ser amigos”.

O triste é que o Rick misturou uns remédios e morreu pouco tempo depois disso.

Então não, não fui a esse show. Mas ouvi todos os rumores, ouvi todas as críticas. Eles estavam jogando latas de lixo do palco. Gente que comprou ingressos pras duas noites estava tentando vender os ingressos para a segunda noite. Só ouvi histórias horríveis.

MÓ BANDEIRA!

Gary Tovar, o chefe da Golden Voice, convidou o Chuck Dukowski para o aniversário da empresa e pediu para ele fazer um discurso para umas quatro mil pessoas. O Chuck pensou a respeito e disse: “Bom, não. Sou um músico, me deixa tentar alguma outra coisa”.

Então, ele ligou pra mim e pro Billy Stevenson. E nós concordamos em tocar o EP Nervous Breakdown na festa de 30 anos da Golden Voice antes do Descendents, que seria a banda principal daquela noite. A gente tocou naquela festa de aniversário e todo mundo ficou louco. Estávamos nos bastidores, eu, Chuck, Billy, Stephen e o Dez Cadena. A gente tinha curtido muito. Então, entre nós quatro, decidimos que talvez devêssemos tocar por aí como uma banda.

A gente pensou no nome Flag e começamos a tocar, e todos os nossos shows foram incríveis. A gente realmente gosta de tocar um com o outro. Gostamos da companhia um do outro. Quer dizer, somos um bando de velhos, então, de vez em quando alguém fica meio mal-humorado ou rabugento, mas gente velha é assim mesmo.

CARMA

Há um tempo, eu e o Raymond Pettibon fomos comer uns sanduíches e ele olhou pra mim e disse que sabia que o irmão dele já tinha destratado todo mundo que ele já conheceu. Sabe, o Raymond me disse que sabia que o Greg não era legal com todo mundo. E eu disse: “E qual é a novidade?”. Aí o Raymond me disse que, se eu estivesse num aperto financeiro ou com algum problema de saúde, que eu podia ficar à vontade para ir até seu estúdio e pegar o que eu quisesse para vender.

E era isso, um dos grandes artistas do nosso tempo fazendo esse tipo de convite pra mim? Não só fiquei lisonjeado como também percebi que eu e ele fomos muito próximos numa certa época, sabe? Na banda que a gente montou naquela igreja — no Black Flag, e em toda aquela cena underground de South Bay — eu e o Raymond tínhamos muito em comum. Éramos fãs dos Dodgers e dos Angels, éramos fãs do Super-Homem e do Batman. A gente era muito próximo.

Mas nunca aceitei a oferta dele. Nunca precisei. Sempre estive numa situação financeira na qual consigo pagar minhas contas. Fico sempre apertado de grana, mas não preciso de um monte de dinheiro depois de descobrir a grandeza do mercado agrícola.

Em 1975, Legs McNeil cofundou a Punk Magazine, que é parte da razão pela qual você sabe o que essa palavra significa. Ele também escreveu Mate-me Por Favor, o que basicamente fez dele o Studs Terkel do punk rock. Além de trabalhar como colunista da VICE, ele continua escrevendo em seu blog pessoal, o pleasekillme.com.

Siga o cara no Twitter – @Legs__McNeil

Fonte: Vice

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